O Estado de S. Paulo
O ex-presidente aposta na impopularidade do Supremo Tribunal Federal
Foi sempre difícil estabelecer o que era
estratégia ou fantasia na cabeça do personagem político Jair Bolsonaro. Sempre
pareceu mais “sentir” do que “pensar” em como agir.
Juntou delírios (como o negacionismo da
ciência) a uma por vezes precisa avaliação da realidade política e social, como
foi a descrição que fez, no já famoso vídeo da reunião ministerial de julho de
2022, da própria vitória em 2018. “Foi uma cagada”, disse.
De fato, é uma boa definição da excepcionalidade da conjunção de fatores que o permitiu derrotar as engrenagens políticas, o “sistema”, as previsões. De lá para cá Bolsonaro parece ter acreditado que a excepcionalidade sempre se repetiria a seu favor.
Na leitura que faz hoje da realidade política
há um componente de cálculo a partir de fatos, e menos esperanças de que
eventuais “milhões” na Paulista no dia 25 o livrem da cadeia. O ex-presidente
conta com uma considerável corrente dentro do Congresso disposta a peitar o
STF.
Por sua vez, os parlamentares ecoam, em
parte, uma disseminada visão crítica do Judiciário em geral e do STF em
particular em amplos setores da sociedade. Que se alastra por confissões
religiosas (discussão sobre aborto), categorias profissionais, segmentos da
economia (especialmente o agro) e, talvez, configure o principal elo de
“conexão” das narrativas radicais bolsonaristas com espectros mais amplos da
opinião pública.
Talvez o que Bolsonaro espere do chamado às ruas seja dar ao Congresso um tipo de “impulso popular” para seguir adiante na tramitação de medidas voltadas a “cercar” a atividade do STF. Além, claro, de solidificar sua imagem de “vítima”, algo que seu principal adversário soube tão bem explorar a vida política inteira.
Figuras influentes dentro do Supremo
perceberam há tempos o tipo de armadilha política na qual a Corte acabou
caindo. E têm reiterado a necessidade de retorno à “normalidade” jurídica
(qual? quando?) e evitar a qualquer custo a ideia de “fazer história” e
conduzir a sociedade para onde ela mesma não sabe que deveria ir.
O problema é que fazer o gênio voltar para a
garrafa não depende mais da postura individual de um ministro como Alexandre de
Moraes e seus inquéritos e investigações. O dinamismo político disso tudo é
próprio e dificilmente se controla.
O alvo é o bolsonarismo, sua principal figura política e o que tentaram armar. Bolsonaro insiste na linha de defesa de afirmar que tudo não passa de uma grande armação política, com o STF aliado ao atual governo de esquerda. O problema é que milhões pensam e sentem como ele.
Nenhum comentário:
Postar um comentário