O congelamento e confisco das contas bancárias, o julgamento pelo Tribunal Penal Internacional e a aplicação do dever da comunidade mundial de proteger os povos contra crimes dos seus próprios governos são três armas poderosas que poderiam converter as ditaduras numa espécie em gradual extinção.
Na primeira das rebeliões árabes, a da Tunísia, a surpresa geral fez com que se demorasse semanas antes de adotar o congelamento da fortuna no exterior do ditador. No caso seguinte, o do Egito, agiu-se mais rápido, anunciando-se a medida horas depois do afastamento de Mubarak.
Na Líbia, a brutalidade da repressão e o ritmo de câmera lenta em que se desenrola o drama facilitaram a adoção quase imediata de sanções financeiras contra o tirano e seus parentes, de início pela Suíça, seguida por outros países.
Ao mesmo tempo e em resposta à resolução votada pelo Conselho de Segurança da ONU, o Tribunal Penal Internacional abriu investigação para apurar atentados contra a humanidade cometidos em relação à população.
Tudo isso é novo e digno de destaque. No passado recente, esse tipo de medida era raramente aplicado, embora fosse previsto pelas leis internacionais. Existia enorme relutância em apreender as fortunas saqueadas por ditadores mesmo quando eles haviam há muito tempo deixado o lugar do crime.
Os paraísos fiscais não cooperavam. Arrastavam-se por décadas processos como o movido contra o herdeiro de Duvalier, do Haiti, que continuou a viver na Riviera francesa chafurdado na riqueza que roubou de um dos povos mais miseráveis do mundo.
Outra novidade promissora é o fim da impunidade dos culpados de crimes contra seus povos. Cercada de ceticismo no princípio, a Corte Penal conquistou credibilidade ao processar e condenar perpetradores de crimes hediondos na ex-Iugoslávia e na África.
Julgamentos públicos exemplares como o do genocida Milosevic, da Sérvia, e do monstro de crueldade Taylor, da Libéria, começam a mostrar aos déspotas que não haverá mais exílio confortável e garantido para eles.
Falta agora não só apertar o cerco às fortunas ilícitas de ditadores ainda no poder e negar quartel e proteção aos foragidos. É preciso cumprir o compromisso assumido pelos chefes de Estado de todo o mundo na Cúpula das Nações Unidas de 2005. No parágrafo 139, eles se obrigaram a proteger as populações contra genocídio, crimes de guerra, limpeza étnica e crimes contra a humanidade por meio de "ação coletiva decisiva e em tempo, caso os meios pacíficos se provem inadequados e as autoridades nacionais falhem em proporcionar a proteção".
A declaração deixa claro que, nos casos de crimes de governos contra seus povos, a comunidade internacional tem a responsabilidade e o dever de intervir.
Cumprir esse dever depende de um sistema internacional em que as decisões podem ser vetadas por um governo chinês que não se dissociou do massacre de Tiananmen, pelo russo, que mantém a repressão no Cáucaso, por EUA e aliados, que fecham os olhos a violações de protegidos. Não será fácil, mas o avanço da consciência moral da humanidade exige o fim das tiranias e não se contentará com nada menos.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
Na primeira das rebeliões árabes, a da Tunísia, a surpresa geral fez com que se demorasse semanas antes de adotar o congelamento da fortuna no exterior do ditador. No caso seguinte, o do Egito, agiu-se mais rápido, anunciando-se a medida horas depois do afastamento de Mubarak.
Na Líbia, a brutalidade da repressão e o ritmo de câmera lenta em que se desenrola o drama facilitaram a adoção quase imediata de sanções financeiras contra o tirano e seus parentes, de início pela Suíça, seguida por outros países.
Ao mesmo tempo e em resposta à resolução votada pelo Conselho de Segurança da ONU, o Tribunal Penal Internacional abriu investigação para apurar atentados contra a humanidade cometidos em relação à população.
Tudo isso é novo e digno de destaque. No passado recente, esse tipo de medida era raramente aplicado, embora fosse previsto pelas leis internacionais. Existia enorme relutância em apreender as fortunas saqueadas por ditadores mesmo quando eles haviam há muito tempo deixado o lugar do crime.
Os paraísos fiscais não cooperavam. Arrastavam-se por décadas processos como o movido contra o herdeiro de Duvalier, do Haiti, que continuou a viver na Riviera francesa chafurdado na riqueza que roubou de um dos povos mais miseráveis do mundo.
Outra novidade promissora é o fim da impunidade dos culpados de crimes contra seus povos. Cercada de ceticismo no princípio, a Corte Penal conquistou credibilidade ao processar e condenar perpetradores de crimes hediondos na ex-Iugoslávia e na África.
Julgamentos públicos exemplares como o do genocida Milosevic, da Sérvia, e do monstro de crueldade Taylor, da Libéria, começam a mostrar aos déspotas que não haverá mais exílio confortável e garantido para eles.
Falta agora não só apertar o cerco às fortunas ilícitas de ditadores ainda no poder e negar quartel e proteção aos foragidos. É preciso cumprir o compromisso assumido pelos chefes de Estado de todo o mundo na Cúpula das Nações Unidas de 2005. No parágrafo 139, eles se obrigaram a proteger as populações contra genocídio, crimes de guerra, limpeza étnica e crimes contra a humanidade por meio de "ação coletiva decisiva e em tempo, caso os meios pacíficos se provem inadequados e as autoridades nacionais falhem em proporcionar a proteção".
A declaração deixa claro que, nos casos de crimes de governos contra seus povos, a comunidade internacional tem a responsabilidade e o dever de intervir.
Cumprir esse dever depende de um sistema internacional em que as decisões podem ser vetadas por um governo chinês que não se dissociou do massacre de Tiananmen, pelo russo, que mantém a repressão no Cáucaso, por EUA e aliados, que fecham os olhos a violações de protegidos. Não será fácil, mas o avanço da consciência moral da humanidade exige o fim das tiranias e não se contentará com nada menos.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
Nenhum comentário:
Postar um comentário