• Dilma vai precisar abandonar a letargia e resolver se privatiza alguns dos negócios da Petrobras ou se anuncia que a sociedade pagará o preço de reformatar a estatal
- O Globo
Dentro de 46 meses, Dilma Rousseff vai para casa. Sem perspectiva de poder ao final desse calendário, é uma presidente que não dispõe de muito mais tempo para resolver como deseja atravessar os próximos 1.300 dias.
Nas circunstâncias políticas de hoje, suas alternativas são muito restritas: faz um governo com um olho na História e outro na biografia, ou se conforma em passar os próximos quatro anos arrastando correntes pelos quatro quilômetros que separam a harmonia desértica da Praça dos Três Poderes dos belos jardins Palácio da Alvorada, onde as banhistas do escultor mineiro Alfredo Ceschiatti parecem flutuar sobre o espelho d'água.
Há meses Dilma insiste em transmitir uma única mensagem, a da imobilidade no atoleiro. Sua catedral de dogmas ruiu com o Muro de Berlim, mas ela permanece estática, talvez em secreto desejo de reescrever a própria história.
No inverno de 2005, a então chefe da Casa Civil de Lula detonou uma proposta de ajuste fiscal de longo prazo abençoada pelos ministros da Fazenda, Antonio Palocci, e do Planejamento, Paulo Bernardo. A ideia central era controlar a expansão dos gastos e avançar na direção do “déficit zero” nas contas públicas (em termos nominais) ao longo de uma década. Dilma sepultou a ideia, classificando-a de “rudimentar”.
Uma década depois, governa em desespero para controlar a inflação, aumentar a arrecadação e garantir substancial superávit nas contas públicas. O preço agora é recessão, desemprego e cortes na rede de amparo social, como a saúde e o sistema estatal de pensões.
A presidente entra em negação quando a vida real demonstra que, nem sempre, suas ideias correspondem aos fatos. Abre as comportas do ressentimento quando vê uma decisão ser decodificada nos seus rudimentos — por exemplo, uma “brincadeira” governamental de alto custo (R$ 25 bilhões anuais) aos cofres públicos, como foram as desonerações fiscais, segundo o coloquialismo fazendário.
A sucessão de críticas que Dilma emula ou faz em público ao Ministério tem efeito arseníaco. Sugere uma equipe sem afinação, competência e seriedade — requisitos primordiais para encontrar o fundo do poço, que em política é apenas uma etapa.
Nos próximos dias estará diante de inédito desafio, com a “lista Janot” de suspeitos de corrupção na Petrobras, o balanço da petroleira estatal e as sentenças ao condomínio político-empresarial beneficiário.
A Presidência tem flertado com a imagem de protetora de empreiteiras. É uma opção, não importam os motivos. O problema central permanece: o que vai fazer com a Petrobras, cujo programa de investimentos não se sustenta sem financiamento externo.
Agentes financeiros e empresas associadas à estatal começaram a avaliar consórcios para eventual compra de participações no pré-sal, assim como uma fatia da BR Distribuidora, com sua rede de seis mil postos de serviço.
Dilma vai precisar sair da letargia para decidir, por exemplo, se privatiza alguns dos negócios da Petrobras ou se anuncia à sociedade que ela vai pagar um alto preço, via Tesouro, para reformatar a empresa e concentrá-la na exploração e produção de petróleo.
É muito para realizar na biografia, e pouco tempo disponível para fazer diferença na História.
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