• Presidente do Senado falta a jantar com Dilma e explicita ainda mais crise do governo com PMDB
Cristiane Jungblut,Eduardo Bresciani, Júnia Gama e Simone Iglesias – O Globo
Ausência inesperada
Depois de fazer várias críticas à condução do ajuste fiscal nos últimos dias, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), outrora visto como principal fiador da governabilidade no Congresso, desistiu de participar do jantar da noite de ontem no Palácio da Alvorada com a presidente Dilma Rousseff.
Dilma convidara o vice-presidente Michel Temer e a cúpula do PMDB, incluindo os presidentes da Câmara e do Senado, os líderes do partido e os ministros, para um jantar de reaproximação. A decisão de Renan de não ir foi mais simbólica da crise entre o partido e o governo do que o próprio encontro.
Durante o primeiro mandato de Dilma, o presidente do Senado era visto como o principal aliado do governo no PMDB. Em 2013, em meio à crise provocada pelas manifestações de rua, Renan participou de seis audiências com Dilma e liderou uma força-tarefa pela aprovação de projetos para arrefecer os protestos. Há apenas um mês, quando foi reconduzido para mais dois anos no comando da Casa, o Planalto comemorou a vitória dele como uma garantia de segurança, diante das incertezas provocadas pela eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), um histórico desafeto de Dilma, na Câmara.
Renan não tem escondido sua insatisfação com o governo nos últimos dias. O senador chamou a coalização do governo Dilma de "capenga" e depois afirmou que houve um "escorregadão" na política econômica e fiscal. Renan dito que o ajuste fiscal anunciado é insuficiente e atinge o trabalhador e não o governo. Ontem, ele optou por uma curta nota divulgada no site do Senado para informar que não compareceria ao jantar.
"Decidi abster-me do jantar entre o PMDB, a Presidente da República e ministros, em que se discutirá a coalizão. O Presidente do Congresso Nacional deve colocar a instituição acima da condição partidária".
Apesar do discurso de que não participaria de evento partidário, Renan recebeu o ex-presidente Lula na residência oficial do Senado para discutir a relação do partido com o governo. A desistência de comparecer ao jantar pegou os peemedebistas de surpresa e deixou lideranças do partido perplexas. Foi preciso uma operação para evitar o esvaziamento do evento, o que aprofundaria a crise entre o governo e o PMDB.
Pouco antes de divulgar a nota, Renan telefonou a Michel Temer para comunicar sua decisão. Temer pediu para Renan reconsiderar, argumentando que o jantar seria no Alvorada, um evento mais social, ao invés de encontro formal no Planalto e, por isso, não interferiria na relação entre os dois Poderes. Mas Renan estava irredutível e não cedeu. O vice-presidente então ligou para a presidente para avisá-la do imprevisto.
O líder do PMDB, senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), um dos mais insatisfeitos com o governo e com o PT, também cogitava faltar ao jantar. Quando Temer soube da intenção do senador cearense, telefonou para pedir que ele estivesse presente e ajudasse a evitar o fiasco de um encontro esvaziado. Segundo assessores palacianos, a própria presidente Dilma pediu que Eunício fosse procurado para garantir sua presença.
Peemedebistas acharam estranho o gesto de Renan, já que ele mesmo havia pautado a necessidade de uma recomposição com o governo. Políticos do partido lembram que na reunião, na semana passada, com ministros da equipe econômica e a cúpula do PMDB no Palácio do Jaburu, Renan foi uma das vozes mais enfáticas na queixa da má relação e da escassa participação na formulação das políticas do governo. Posteriormente, Renan levou o mesmo assunto ao ex-presidente Lula.
Ao deixar seu gabinete no início da noite, o vice-presidente da República minimizou a ausência de Renan no evento.
- O presidente Renan não se opõe à coalizão. Ele tem sido um colaborador extraordinário em relação ao governo. Basta lembrar muito recentemente a questão do superávit primário, em que ele enfrentou uma dificuldade extraordinária dentro do Congresso e o governo venceu. Esse gesto dele não atrapalha em nada - disse Temer.
As especulações de peemedebistas são de que Renan desistiu de ir ao jantar porque queria uma agenda mais restrita com a presidente para tratar assuntos de seu interesse, como a permanência de Vinícius Lage no Ministério do Turismo e o comando da Transpetro. Com a presença de ministros e de Eduardo Cunha, que defende a ida de Henrique Alves para o Turismo, Renan não poderia acertar suas demandas.
Apesar do contratempo, Temer defendeu a realização do jantar:
- Acho que vamos tratar da relação do PMDB com o governo e ela vai se solidificar muito com esse encontro.
Eduardo Cunha afirmou que caberia à presidente definir o que seria abordado:
- Nós fomos convidados para jantar, não cabe a nós dar o tom. Quem dá o tom é quem convida.
(Colaborou Isabel Braga)
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