Por Letícia Casado, Bruno Peres e Vandson Lima – Valor Econômico
BRASÍLIA - O vice-presidente Michel Temer reagiu ontem às declarações da fundadora do Rede Sustentabilidade e ex-candidata à Presidência da República, Marina Silva, para quem, em eventual impeachment da presidente Dilma Rousseff, a Operação Lava-Jato, que atinge o PMDB, pode ficar inviabilizada por causa da chegada de Temer ao poder. No domingo, o Rede posicionou-se a favor da investigação em curso no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que apura suposto abuso de poder a eleição de 2014 e pode cassar a chapa Dilma/Temer e contra o processo de impeachment que corre na Câmara.
Temer disse estar preocupado com o que chamou de "manifestação de desconhecimento institucional" por parte de Marina, que, conforme enfatizou, concorreu à Presidência duas vezes: "Fico preocupado com essa manifestação de desconhecimento institucional por uma pessoa que foi candidata a presidente da República por duas vezes", disse Temer em nota à imprensa. "É gravíssimo que uma figura pública tente desprestigiar os poderes soberanos do Estado."
Ele afirmou que nenhum presidente tem poder de ingerência nos assuntos de outro Poder e destacou que o Judiciário é independente por determinação da Constituição de 1988, tendo, em sua avaliação, exercido soberanamente esse papel, assim como, todos os demais órgãos judiciários do país.
O Palácio do Planalto informou que não vai comentar o assunto.
No domingo, Marina disse que quem dá respaldo à Lava-Jato é a sociedade brasileira e uma eventual troca no Planalto pode sinalizar que todos os problemas foram resolvidos: "Há um temor sim de que isso enfraqueça a Operação Lava-Jato". Ela disse ainda que a prioridade do partido é o processo que corre no TSE sobre o financiamento da chapa presidencial "porque está suportada com investigação, e não apenas por vontade política de quem é oposição e situação". Para ela o TSE poderá mostrar "se de fato houve dreno do Petrolão para as eleições".
A posição do Rede independe do resultado do processo que corre no TSE, disse aoValor o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). O partido, portanto, não estaria discutindo concorrer em 2016, caso a chapa Dilma/Temer seja invalidada pelo TSE e novas eleições sejam convocadas. Segundo Randolfe, o plano do Rede é lançar a candidatura de Marina à Presidência em 2018: "O Rede tem na Marina a nossa candidata à Presidência da República. Mas o nosso calendário é 2018, não 2016".
Para líderes da oposição, Marina e o Rede deflagraram uma ação pensada ao apontar posição contrária ao impeachment de Dilma, mas de apoio à ação de cassação da chapa com Temer. A ideia, avaliam, seria posicionar Marina em uma eventual disputa presidencial antecipada, encampando estratégia para manter equidistância da oposição - a favor do impeachment - e do governo, ao apoiar a cassação. O posicionamento contemplaria as diferentes vertentes políticas que compõem o Rede.
"Marina participou das eleições e só descobriu agora, um ano depois, a gravidade da ação no TSE? É óbvio que está sinalizando o nome dela como pré-candidata, a depender do que acontecer", disse o líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado - ele próprio um possível candidato em caso de eleições antecipadas. Para ele, "não é coincidência" Marina defender um processo em que, ao fim, possa concorrer ao Planalto, mas ser contrária a outro, em que Temer assumiria o posto.
Próximo a Marina, o deputado Roberto Freire (PPS-SP) disse que a ofensiva tira o Rede de uma "posição incômoda de ambiguidade que havia em relação ao governo Dilma", mas não coloca a sigla no grupo francamente opositor. "Pedir a cassação por crime eleitoral é até mais contundente, mas, estranhamente, ela passa por cima dos fatos que justificam o impeachment". Para Freire, é "natural" que Marina e seu grupo estejam fazendo um cálculo político-eleitoral sobre a questão.
Para o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), o Rede era até então "um partido envolto em brumas" e agora assumiu posição clara, contra o impeachment e em favor da ação no TSE.
Investigadores da Lava-Jato se dividem sobre se uma troca no Planalto poderia atrapalhar a operação. Um grupo diz apostar na independência da PF e do Ministério Público Federal para seguir a investigação. Outro se alinha com o posicionamento do Rede e diz temer a possibilidade de mudanças no Ministério da Justiça, que poderiam desencadear trocas na PF e atrapalhar a condução das investigações. Um investigador da Lava-Jato afirma: "Uma coisa é certa, não interferência do governo, sequer pelo Ministério da Justiça, na Lava-Jato. Então, se mudar [a Presidência], esperamos continuar investigando livremente."
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