- Folha de S. Paulo
Para uma gestão cuja missão histórica é começar a resolver um intricado gargalo fiscal, pega mal o governo Temer ter capitaneado a aprovação de um pacote de reajustes para o funcionalismo público cujo custo é estimado em R$ 58 bilhões em quatro anos.
Nos cálculos do presidente interino, não vale a pena se indispor com os servidores e, por extensão, com parte do Congresso para evitar um aumento cujo impacto mais imediato consta do Orçamento e, portanto, já foi empurrado para o megadéficit de R$ 170 bilhões atribuído à gestão de Dilma Rousseff.
Pode ser. Mas receio que haja uma certa miopia nessa visão. É verdade que um governo tampão como o de Temer deve ser essencialmente pragmático. Também é verdade que o Congresso, apesar de ter pelo menos 30% de seus membros metidos em encrencas judiciais diversas, precisa ser cortejado. Dilma caiu porque perdeu o apoio dessa gente. Infelizmente, ninguém inventou ainda um jeito de fazer democracia sem Parlamento e, goste-se ou não, nossos parlamentares foram legitimamente eleitos pela população.
O problema aqui é que Temer está pensando apenas nos próximos dois ou três passos, quando deveria estar considerando seis ou sete. Num horizonte que vá além do depois de amanhã, o sucesso de um programa de ajuste depende ser aceito como justo (ou, pelo menos, como não muito injusto) pela população.
Para que isso ocorra, é preciso que pareça que a maioria dos segmentos sociais deu a sua cota de sacrifício. Aí fica complicado gastar R$ 58 bilhões com servidores, que já ganham mais do que a média do mercado, quando se cortam verbas da saúde e da educação. De modo análogo, é temerário dificultar o acesso à aposentadoria sem nem acenar com um aumento de impostos para os mais ricos.
É bom que o governo Temer seja pragmático, mas precisaria adotar um pragmatismo menos míope.
Nenhum comentário:
Postar um comentário