- O Estado de S. Paulo
Propostas para Previdência e trabalhista andam, mas debate ainda é estridente
Em baixa nas pesquisas de popularidade mas, até segunda ordem, com uma base ampla no Congresso, o governo Temer se mexe para pôr em andamento as reformas constitucionais já formatadas – previdenciária e trabalhista. E começa a trabalhar em algum tipo de mudança tributária, em alternativa a um projeto mais ambicioso apresentado pelo Conselhão. Aparentemente contraditória, já que as reformas são vistas, pelo senso comum, como uma questão de “manter ou tirar direitos sociais”, a estratégia faz todo o sentido para um presidente que chegou ao poder sustentado pelos setores empresariais e pelos mercados – e tem sido empurrado exatamente por eles para acelerar as reformas constitucionais.
A tramitação programada para as duas primeiras reformas faz prever um primeiro semestre no mínimo movimentado dentro do Congresso. E, quem sabe, nas ruas. Nos dois casos, já foram instaladas as comissões especiais na Câmara, os relatores já foram escolhidos e, na semana passada, iniciaram-se as audiências em torno das propostas. Quase um “esquenta” para os debates acalorados que certamente virão. O relator da Previdência, o deputado Arthur Maia, do PPS baiano, promete apresentar seu parecer em meados de março. O relator da trabalhista, o tucano Rogério Marinho (RN), fala num prazo mais estendido, até começo de maio. E a turma do Planalto insiste que será viável encerrar as votações ainda nesta primeira metade do ano – o que vale menos como previsão e mais como indicador da determinação do governo de cumprir a agenda de reformas. Há quem veja, porém, nessa urgência, uma intenção dissimulada do governo de escapar das limitações impostas pelo calendário eleitoral.
É de se esperar, portanto, que agora comece para valer a negociação em torno dos pontos a serem derrubados, alterados e enxertados nas duas propostas. Apesar dos estudos e simulações procurando esclarecer o impacto das duas reformas, o que se vê até agora, principalmente nos debates estridentes das redes sociais, tem sido ainda um cansativo e nada efetivo inferno X paraíso. No caso da Previdência, os críticos mais aguerridos preferem começar a discussão atacando o “mito” do déficit previdenciário, com base no argumento de que os cálculos bombásticos feitos pelo governo levam em conta o regime do INSS e não o da seguridade social, que inclui a Saúde e a Assistência Social, e abrange a arrecadação de outras fontes, como Cofins, PIS-Pasep e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – por esse critério, o rombo se transformaria em superávit.
Na reforma trabalhista, se apegam ao veredicto do Ministério Público do Trabalho, que tachou o conjunto das mudanças – baseado na flexibilização dos contratos de trabalho e na prioridade à negociação entre as partes – de inconstitucional e contra as convenções internacionais. Os defensores mais apaixonados das reformas, no outro extremo, ameaçam com a quebra do País logo ali à frente caso as propostas não passem com o vigor desejado. Sem a reforma trabalhista, por exemplo, alerta o presidente do TST, Ives Gandra Martins Filho, o Brasil pode virar a Venezuela. Com a reforma, os empregos sumidos na recessão voltariam no dia seguinte.
Como se pode imaginar, se essas posições vingassem do jeito que estão sendo apresentadas, simplesmente não haveria conversa. O mais provável, contudo, é que elas sejam superadas por um debate mais maduro e mais pragmático que se concentre fundamentalmente na seguinte questão: O que é possível fazer com as propostas que estão na mesa? Aparentemente, os próprios sindicatos, que por dever de ofício pelo menos de saída têm de contestar qualquer alteração que possa afetar direitos já conquistados, sabem, no fundo, que serão obrigados a entrar no jogo. E o governo também sabe que terá de ceder, apesar de toda a retórica de que não dá para desfigurar as propostas.
Na própria base parlamentar já aparecem articulações para mudanças concretas pelo menos nos textos da reforma da Previdência. Estão nesse balaio a idade mínima de 65 anos, o tempo de contribuição, incluindo os 49 anos para dar direito à aposentadoria pelo teto, o regime de transição e a redução do benefício de prestação continuada, que é pago a idosos e a pessoas com deficiência e renda abaixo de um quarto do salário mínimo. É só o começo.
* È jornalista
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