Andrea Jubé e Raphael Di Cunto | Valor Econômico
BRASÍLIA - Numa estratégia para tentar restaurar a imagem do partido a um ano das eleições, a cúpula do PMDB realiza amanhã convenção extraordinária com uma agenda prioritária: o resgate do nome Movimento Democrático Brasileiro (MDB), meio século depois que a sigla do ex-presidente da Assembleia Constituinte Ulysses Guimarães fez história na transição democrática.
Além da missão de imprimir nova identidade ao partido, combalido por denúncias, o presidente nacional, senador Romero Jucá (RR), tem o desafio de conter as fissuras internas em torno da distribuição do novo fundo eleitoral para financiamento das campanhas em 2018.
Há quase dois anos na presidência do partido - após a licença do presidente Michel Temer, em abril de 2016-, Jucá tenta implantar mudanças ousadas na agremiação, como uma política de compliance e a adoção de posturas firmes sobre temas sensíveis, como o fechamento de questão em torno da reforma da Previdência Social.
Temer deve comparecer ao evento e discursar, lembrando a memória de Ulysses Guimarães, a fundação do MDB, os marcos de seu governo e reiterando o apelo aos correligionários para aprovar a reforma previdenciária. O tema é polêmico mesmo no PMDB.
Apesar do fechamento de questão, lideranças da sigla declaram posição contrária ao texto, inclusive dois presidentes de diretórios estaduais: os deputados federais Mauro Mariani, de Santa Catarina, e Daniel Vilela, de Goiás. O vice-presidente da Câmara, Fábio Ramalho (MG), líder da bancada mineira, também se opõe abertamente à proposta.
Em outra frente, Jucá prepara uma reação aos efeitos da Lava-Jato, que atingiu quadros históricos do PMDB: abrirá licitação no início de 2018 para contratar uma empresa de compliance, que será responsável pela fiscalização e para garantir a transparência das contas do partido.
O objetivo é tentar recuperar a confiança do partido junto ao eleitorado, num momento em que lideranças pemedebistas respondem a investigações e alguns estão até presos: como a cúpula do PMDB do Rio de Janeiro, encabeçada pelo ex-governador Sérgio Cabral e pelo deputado estadual Jorge Picciani, além de ex-ministros como Geddel Vieira Lima e Henrique Eduardo Alves - ex-presidentes dos diretórios do PMDB na Bahia e no Rio Grande do Norte, respectivamente.
Mas o pano de fundo da convenção é a definição dos critérios de distribuição do fundo eleitoral de financiamento de campanha, que ficará a cargo dos integrantes da Executiva Nacional. Não por imposição do PMDB, mas por determinação das novas regras derivadas da minirreforma eleitoral aprovada em setembro pelo Congresso.
A minirreforma destinou R$ 1,7 bilhão para financiar as campanhas dos 35 partidos inscritos no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e caberá aos órgãos executivos de cada legenda definir a regra de distribuição dos recursos entre os respectivos candidatos até o final de março de 2018.
Presidentes de diretórios estaduais estão descontentes por se verem à deriva da decisão sobre o repasse dos recursos. Um grupo de dirigentes partidários e parlamentares insatisfeitos com a nova condução do PMDB cogitou "boicotar" a convenção, mas acabou recuando. "Tivemos que rever [o movimento] porque talvez fosse o que eles queriam", diz o presidente do PMDB de Santa Catarina, Mauro Mariani. "Vamos lá para não deixar aprovar nada de forma açodada", completou.
Mariani verbaliza a insatisfação de um grupo que reúne até dez diretórios estaduais: Paraná, Rio Grande do Sul, Alagoas, Paraíba, Pernambuco, Ceará, Pará, Sergipe, Goiás e Santa Catarina.
Caciques históricos do PMDB - alguns remanescentes do grupo dos "autênticos" da fundação do MDB - devem faltar à reunião. Entre eles o ex-governador de Pernambuco e deputado Jarbas Vasconcelos, o presidente do Senado, Eunício Oliveira, do Ceará, e os ex-presidentes do Senado Renan Calheiros, de Alagoas, e Jáder Barbalho, do Pará.
Além do embate pela divisão dos recursos do fundo eleitoral, há insatisfação com a adoção de uma postura rígida da Executiva, relativa ao fechamento de questão em projetos relevantes do governo e com a punição de dissidentes, como a expulsão da senadora Kátia Abreu, do Tocantins.
A Executiva Nacional também tenta afastar Jarbas, um dos "autênticos", do controle do diretório estadual de Pernambuco. Processos disciplinares foram abertos contra parlamentares que votaram contra os interesses do governo Temer.
Este grupo de insatisfeitos pondera que, historicamente, o PMDB é um partido de lideranças regionais, que se posicionam livremente, em seus Estados e nacionalmente, conforme suas crenças. É isso que teria, na opinião deles, feito o partido forte.
Mas o líder reeleito da bancada na Câmara, deputado Baleia Rossi, contemporiza. Ele afirma que a convenção terá uma pauta "tranquila", em que a adequação às novas regras eleitorais será protocolar. "O principal é tirar o P, vai ficar MDB", resume. Baleia diz que o debate sobre a divisão do fundo eleitoral ocorrerá mais adiante, e decidido pela Executiva da legenda.
Um líder histórico, que faltará à convenção, disse ao Valor que a atual conjuntura política recomenda cautela. Sugere a Jucá inspiração no "velho marinheiro" do samba de Paulinho da Viola, "que durante o nevoeiro, leva o barco devagar".
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