terça-feira, 12 de outubro de 2021

Luiz Carlos Azedo - Terrivelmente boicotado

Correio Braziliense

Um grupo de senadores tem defendido que Bolsonaro desista da indicação de Mendonça e escolha outro nome para a vaga de Marco Aurélio Mello no Supremo 

O pastor Silas Malafaia, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo (igreja evangélica pentecostal), acusou os ministros da Casa Civil, Ciro Nogueira, da Secretaria de Governo, Flávia Arruda, e das Comunicações, Fábio Faria, de boicotarem a indicação do ex-ministro da Justiça e ex-chefe da Advocacia-Geral da União (AGU) André Mendonça ao Supremo Tribunal Federal (STF). Aliado de Jair Bolsonaro, desde o fim de semana Malafaia vinha ameaçando denunciar os ministros. Mendonça é pastor da igreja presbiteriana Esperança, em Brasília. Indicar um ministro “terrivelmente evangélico” para o STF é uma promessa de campanha do presidente da República.

Para aumentar o desconforto de Mendonça, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski, ontem, arquivou o mandado de segurança requerido pelos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Jorge Kajuru (Podemos-GO), para impor ao presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que pautasse a sabatina de Mendonça. Nunca um candidato ao STF passou por tanto desconforto no Senado. Alcolumbre recebeu a indicação em julho e a mantém na gaveta, apesar de todas as pressões, por razões que ainda não são de todo conhecidas.

Sabe-se que o ex-presidente do Senado está insatisfeito com Bolsonaro desde as eleições passadas, quando seu irmão, Josiel Alcolumbre, seu primeiro suplente no Senado, perdeu a disputa para a Prefeitura de Macapá. Mesmo com o apoio do então prefeito Clécio Luís (sem partido) e do governador do Amapá, Waldez Góes (PDT), foi derrotado pelo médico Dr. Furlan (Cidadania), ex-deputado apoiado pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede). Alcolumbre atribuiu a derrota à demora do governo federal em restabelecer a energia no Amapá, que sofreu um “apagão” às vésperas das eleições.

Plano B

Há mais coisas entre o paraíso e o Senado, porém. Um grupo de senadores tem defendido a tese de que Bolsonaro deveria desistir da indicação e escolher outro nome para a vaga de Marco Aurélio Mello, que se aposentou. Preferiam o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Humberto Martins, que teria amplo apoio, inclusive na oposição. Alagoano e adventista, Martins foi um dos nomes que chegou a ser considerado por Bolsonaro, porque contaria com a simpatia do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), aliado do Palácio do Planalto, e também de parlamentares do MDB, partido com a maior bancada no Senado — principalmente o senador Renan Calheiros (AL), seu conterrâneo, relator da CPI da Covid. Entretanto, completou 65 anos no último dia 7 de outubro; não pode mais ser indicado.

Uma das críticas de Malafaia a Ciro Nogueira deve-se ao fato de ter se aproximado de Calheiros, “o cara que quer destruir Bolsonaro por interesses políticos”, segundo o líder religioso. No domingo, no Guarujá (SP), Bolsonaro perdeu a paciência com Alcolumbre: “Quem não está permitindo a sabatina é o Davi Alcolumbre (…) Teve tudo o que foi possível durante os dois anos comigo e, de repente, ele não quer o André Mendonça. Quem pode não querer é o plenário do Senado, não é ele. Ele pode votar contra. Agora, o que ele está fazendo não se faz. A indicação é minha”, disse.

“Se ele quer indicar alguém para o Supremo, pode indicar dois. Ele se candidata a presidente no ano que vem e, no primeiro semestre de 2023, tem duas vagas para o Supremo”, desafiou Bolsonaro. É muita ironia: a indicação de um ministro para o STF por ser evangélico é fruto de uma mentalidade teocrática, isto é, de uma concepção religiosa de Estado, porém, a não realização da sabatina monstra claramente que as regras do jogo laico estão prevalecendo no Congresso. Os ministros citados por Malafaia — Ciro Nogueira, Flávia Arruda e Fábio Faria — são os principais operadores políticos do governo. Bolsonaro não tem força para demitir esses três sem desarticular completamente sua base parlamentar.

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