Em 1968, em plena ditadura militar, ele liderou uma greve de metalúrgicos que fechou fábricas em São Paulo. Após entrar para a luta armada, foi preso, torturado e libertado em troca do embaixador dos EUA
SÃO PAULO - Ele aparece na histórica fotografia, de 6 de setembro de 1969, dos 13 presos políticos trocados pela liberdade do então embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Charles Burke Elbrick, que havia sido sequestrado. Na imagem, com os militantes em frente ao avião Hércules 130 que os levaria para o exílio no exterior, José Ibrahim está ao lado do ex-ministro José Dirceu. Um dos principais sindicalistas brasileiros, Ibrahim ficou internacionalmente conhecido por ter liderado, em 1968, uma das maiores greves de metalúrgicos durante o regime militar, antes mesmo do surgimento de Luiz Inácio Lula da Silva, que só começou a comandar paralisações da categoria no fim da década de 70.
Em 1968, Ibrahim, então com 21 anos, era diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de Osasco, que lutava por melhores salários. Desde 1967, Osasco já despontava como o polo central do movimento sindical em oposição ao regime militar. Mas foi no dia 16 de julho do ano seguinte que o movimento fez história: Ibrahim e sua turma resolveram parar todas as metalúrgicas da cidade e ocuparam as instalações da Cobrasma, uma das mais importantes fábricas de São Paulo. Depois dela, paralisaram também as atividades de grandes metalúrgicas como Barreto Keller, Braseixos, Granada, Lonaflex e Brown Boveri.
Preocupados com a crescente onda grevista no país, os militares resolveram intervir no sindicato dirigido por Ibrahim: ocuparam todas as fábricas e cercaram entradas e saídas da cidade. Além disso, o Ministério do Trabalho decretou a ilegalidade do movimento. Sessenta líderes da greve foram levados para o Dops paulista, onde a tortura de presos era rotina. Ibrahim foi demitido sem receber qualquer direito trabalhista.
Começou aí sua vida na clandestinidade. Ibrahim entrou para a luta armada, na Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), foi preso e torturado. Em setembro de 1969, trocado pelo embaixador americano, rumou para o exílio no México com outros presos: além de José Dirceu, estavam no avião Vladimir Palmeira, Ricardo Zaratini, Flávio Tavares, Ivens Marchetti, Ricardo Villas e Gregório Bezerra, entre outros. Antes de embarcarem, porém, fizeram a foto no Aeroporto do Galeão.
- Foi uma lista ecumênica - disse o jornalista Franklin Martins, um dos articuladores do sequestro do embaixador americano, algum tempo depois, ao se lembrar de como foi montada a relação com os nomes dos presos políticos, que eram do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), da Ação Libertadora Nacional (ALN), da VPR e da dissidência de Niterói do Partido Comunista Brasileiro (PCB).
Volta do exílio com a anistia
Exilado, Ibrahim morou dez anos no exterior, em países como Chile, Panamá, México e França. O sindicalista voltou ao Brasil em 1979, com a Lei da Anistia. Em 1980, ajudou a fundar o Partido dos Trabalhadores (PT), ao lado de Lula, mas em 1986 rompeu com o partido e se filiou ao Partido Verde (PV). Também contribuiu para a fundação, mais recentemente, da União Geral dos Trabalhadores (UGT). Como dirigente sindical, vinha participando da Comissão Nacional da Verdade, com depoimentos sobre a ditadura militar.
José Ibrahim morreu ontem, aos 66 anos, enquanto dormia em casa no bairro de Pinheiros, em São Paulo. Nos últimos anos, vinha morando com a família num apartamento da Rua Teodoro Sampaio. Como bom corintiano, anteontem assistiu ao jogo do Corinthians contra o Boca Juniors, ao lado do filho Gabriel, de 16 anos. Ao final da partida, foi dormir. Ontem de manhã, sua mulher, Helena, saiu para trabalhar e Gabriel foi para a escola. Quando o jovem voltou para casa, por volta das 13h, viu que o pai estava morto na cama do quarto do casal. O resultado da autópsia ainda não havia saído ontem. Amigos acreditam, no entanto, que a causa da morte foi infarto. O corpo, velado no Cemitério Bela Vista, em Osasco, deverá ser sepultado hoje.
Fonte: O Globo
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