Indigne-se: apesar de não faltar trabalho, Congresso fica às moscas pelo terceiro dia consecutivo
Plenários vazios e ameaças ao Planalto
O "recesso branco" de duas semanas era para acabar ontem, mas deputados e senadores emendaram a folga. Os parlamentares pretendem votar, a partir da próxima segunda-feira, propostas consideradas problemáticas para o governo
Juliana Braga, Adriana Caitano
Depois de duas semanas de recesso branco, sem votação de projetos importantes, o Congresso Nacional reabriu ontem as portas para os parlamentares, mas o cenário era semelhante ao dos dias anteriores: vazio. Não houve sessão nas comissões nem votações nos plenários. Só 37 deputados e 33 senadores decidiram aparecer — ou seja, apenas 11,7% dos 594 congressistas. Ainda assim, os poucos que compareceram já sinalizaram que os R$ 6 bilhões de emendas liberadas não arrefeceram o descontentamento com o Planalto e ameaçam o governo com votação de propostas que podem criar rombos no orçamento federal. Figuram na lista o passe livre para estudantes e a análise do veto que revogou a extinção da multa de 10% do FGTS (veja quadro). Somado, o aumento de gastos públicos pode chegar a R$ 45 bilhões.
O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), anunciou ontem que parte desses temas já deve entrar em pauta na semana que vem. No entanto, admite que a possibilidade de rombo preocupa. “Mas o Congresso tem demonstrado muito compromisso com a responsabilidade fiscal”, ponderou. Uma das preocupações é com a regulamentação da Emenda 29, que determina um percentual mínimo de investimentos em saúde. Tramita no Congresso um projeto de lei que vincula 10% das receitas correntes brutas para gastos com a área, obrigação da qual o governo se livrou no ano passado quando a emenda foi aprovada. “Não há nem como vincular receita corrente bruta. Bruta considera o que é da União e o que não é”, sustentou o líder do PT no Senado, Wellington Dias (PI).
Outra forma de pressão ao Planalto é o novo rito instituído para a análise de vetos presidenciais. O primeiro a ser apreciado é o da multa de 10% do FGTS cobrada dos empregadores em demissões sem justa causa. No veto, a presidente justifica que o impacto seria de R$ 3 bilhões, mas parlamentares trabalham para derrubá-lo.
O Senado só baterá o martelo sobre a pauta na próxima terça-feira. A oposição já avisou, no entanto, que cobrará o que ficou pendente da agenda positiva e outros temas, independentemente dos impactos orçamentários. “Poder Legislativo é Poder Legislativo, Poder Executivo é Poder Executivo. Um tem que respeitar o outro”, alertou o líder do DEM no Senado, Agripino Maia (RN).
Na Câmara também já há um trabalho para pressionar o governo por meio das contas públicas, liderado pela bancada do PMDB. Integrantes do partido já coletaram assinaturas para uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que pretende obrigar o Executivo a ter, no máximo, 25 ministérios. E já na terça deve ser aprovado, em comissão especial, o conjunto de projetos para obrigar a União a pagar integralmente as emendas apresentadas pelos parlamentares à lei orçamentária. Ambos os assuntos são encampados pelo presidente Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN).
Enquanto os parlamentares descansavam, o Planalto já se preparava para a “pauta bomba” do segundo semestre. A ministra de Relações Institucionais, Ideli Salvatti, teve conversas com todos os partidos da base, além de PV e PSD. Também fez questão de reunir-se com relatores de algumas das propostas que estão tirando o sono do governo. Um deles foi o senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), relator da proposta do passe livre, que pode deixar um rombo de até R$ 5,5 bilhões.
Viagem
Mesmo com uma pauta recheada de propostas com potenciais de causar problemas ao Planalto, senadores e deputados decidiram enforcar ontem e hoje. Só retornarão mesmo ao batente na semana que vem. A folga institucionalizada por um requerimento — já que, como não votaram a Lei de Diretrizes Orçamentárias, deveriam ter continuado trabalhando — era para ter acabado ontem.
Os corredores estavam tão vazios quanto nos dias de recesso. Dos 513 parlamentares, apenas 37 pisaram na Câmara, em sessão de debates que durou duas horas. Nem mesmo os líderes partidários ou o presidente da Casa apareceram. De acordo com sua assessoria, Henrique Eduardo Alves ainda está em viagem para o exterior. A justificativa é de que ele passou parte do recesso envolvido em atividades institucionais, como a visita do papa Francisco ao Brasil. No Senado, Renan apareceu, mas não convocou a sessão deliberativa. Somente 33 senadores o acompanharam no plenário.
Em exercício no comando da Câmara, o vice-presidente, André Vargas (PT-PR), minimizou o esvaziamento dos corredores. “O Congresso Nacional tem cumprido a sua função. Não basta voltar por voltar também, nós queremos voltar já votando, com reunião de líderes, e essa é a orientação do presidente Henrique”, justificou. Para a deputada e ex-vice-presidente da Câmara Rose de Freitas (PMDB-ES), as votações já deveriam ter começado ontem. “Temos matérias urgentes, uma pauta pesada, então não tem justificativa para não termos sessão deliberativa”, comentou.
As pendências
Apesar de ainda não terem retornado às atividades, parlamentares já estudam colocar em votação pauta para pressionar a presidente Dilma Rousseff
Passe livre estudantil
A promessa de votação foi uma das primeiras respostas do Senado às ruas. O relator do projeto, Vital do Rêgo (PMDB-PB) pediu mais tempo para analisar fontes de custeio do benefício. O impacto financeiro pode ser de R$ 5,5 bilhões. Vai depender dos critérios de quem vai ter direito e se vai ser tarifa zero mesmo ou só descontos.
Plano Nacional da Educação (PNE)
O governo pressiona para que o tema só seja apreciado em plenário quando a questão dos royalties para a área for definida. O passe livre também depende dessa votação.
Royalties para educação e saúde
A Câmara votou a proposta que destina 75% dos royalties do petróleo para a educação e 25% para a saúde. O texto seguiu para o Senado, onde foi modificado, e voltou para análise dos deputados. Eles começaram a revisão antes do recesso, mas, sem acordo, deixaram para concluí-la em agosto.
Vetos
O Congresso aprovou no apagar das luzes do último semestre o novo rito de apreciação de vetos, que prevê a análise em, no máximo, 30 dias. O projeto que extingue a multa dos 10% do FGTS, vetado por Dilma, já entra nessa lista. O impacto seria de R$ 3 bilhões.
Orçamento impositivo
A Câmara discute um conjunto de propostas que obrigam a União a executar por inteiro o Orçamento anual aprovado no Congresso, além de garantir que as emendas apresentadas pelos parlamentares sejam integralmente pagas. Os textos já passaram pela CCJ e devem ser aprovados no início de agosto na comissão especial que trata do tema.
Emenda 29
A oposição já fala em colocar na pauta a emenda que estipula um percentual mínimo do PIB para a saúde. A proposta mais forte no Senado é a de 10%.
LDO
O relatório preliminar do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2014 precisa ser votado na Comissão Mista de Orçamento, mas não houve acordo. Haverá sessão na próxima terça-feira. Depois, ainda haverá prazo para emendas. Só então, seguirá para o plenário do Congresso.
Minirreforma eleitoral
O relatório do deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), que pretende afrouxar, entre outras coisas, regras de doação e financiamento para campanha com validade já para 2014, está pronto, mas não pôde ser votado, porque a proposta dos royalties tranca a pauta da Câmara.
Fonte: Correio Braziliense
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