Após nutrir expectativas de que iria acelerar o ritmo da normalização monetária nos Estados Unidos, o Federal Reserve aumentou ontem a taxa de juros em, 0,25 ponto percentual (para a faixa de 0,75 a 1%) sem indicar qualquer mudança no rumo que já havia traçado em dezembro. Nele, estão previstas três altas para 2017, aposta que Janet Yellen, presidente do banco, reforçou ontem, com um argumento pouco convincente que não houve alterações no cenário com o qual o banco trabalha.
Após orquestrada indicação de Yellen, do vice-presidente Stanley Fisher e mais três membros do Fed, ficou clara a sinalização de que a situação econômica já permitia ao Fed deixar de lado a extrema parcimônia com que atuou até então - uma alta em 2015 e outra em 2016 - e cumprir a promessa dos três aumentos, a começar em março. Por que março, não ficou claro. As projeções dos membros do Fed para o comportamento das principais variáveis (núcleo da inflação, PIB, emprego e taxa de juros) foram praticamente idênticas à anterior, elaborada em dezembro.
Yellen repetiu que o Fed não fez uma "reavaliação" dos cenários com os quais trabalha, deixando no ar a dúvida sobre as razões pelas quais o banco encaminhou os mercados rapidamente à aposta de quase 100% de probabilidade de que elevaria as taxas agora. De qualquer forma, as explicações foram suficientes para demolir as expectativas de quatro elevações das taxas dos fed funds no ano, ao mesmo tempo em que derrubou o dólar e rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA.
A mudança no comunicado divulgado após a reunião mostra que a razão foi a inflação, que deixou de se situar abaixo de 2% para "se mover perto do objetivo de 2%". Além disso, voltou a apontar que esse objetivo é "simétrico", o que não havia feito no comunicado anterior, isto é, que assim como a taxa de inflação havia ficado muito tempo abaixo da meta do banco, ela poderia ultrapassá-la algumas vezes sem que isso ensejasse uma resposta imediata de política monetária.
Ontem, antes da reunião do Fed, foi divulgado o indice de inflação ao consumidor (CPI) de fevereiro. Nos últimos 12 meses, a taxa foi de 2,7%, enquanto que a medida do núcleo, que exclui energia e alimentos, atingiu 2,2%. A taxa de desemprego está em 4,5%, abaixo de sua tendência de longo prazo e, segundo Yellen, gradualmente os salários estão se elevando e só não subiram mais recentemente porque a produtividade americana caiu.
O objetivo do Fed, segundo Yellen, é levar os juros para perto de sua taxa neutra de longo prazo, isto é, 3%, ou uma taxa real de 1% - pelas projeções dos membros do Fed, ela seria atingida em 2019. Mesmo com o aumento dos juros ontem, a política monetária ainda é "acomodatícia", pois a taxa real neutra ainda é negativa.
Tanto quanto apressar o ritmo da alta dos juros, havia alguma expectativa de um esboço de definição sobre como o Fed utilizará seu balanço de US$ 4,5 trilhões como arma adicional ou coadjuvante da política monetária. Isso ainda vai levar um bom tempo, afirmou Yellen, e só ocorrerá quando a taxa dos fed funds já estiver bem perto de seu alvo. Ela disse que o instrumento principal e ativo será a alta dos juros, cujos efeitos e resultados são conhecidos e seguros, o que não é verdadeiro a respeito do desmobilização da montanha de títulos públicos e privados que o Fed têm em carteira.
O Fed deixou de lado em suas projeções a consideração dos efeitos da possível política fiscal e de estímulos aos investimentos sugeridas por Donald Trump. Yellen disse que houve considerações a respeito por alguns membros do Fed, mas que incertezas sobre a natureza e a magnitude do pacote de Trump não permitiam qualquer avaliação segura.
Yellen negou, sem mencionar diretamente, que o banco estivesse atrás da curva diante da inflação, e mencionou que o indicador que melhor reflete as tendências dos preços é o núcleo do índice de gastos de consumo pessoal, que tem se movido pouco e está em 1,7%. Voltou a dizer que o aperto monetário será "gradual" e que isso é compatível com três reajustes nas taxas, embora a manutenção desse cenário continue dependente dos indicadores econômicos.
O Fed afastou a curto prazo o risco de elevar mais vezes, e mais rápido, os juros, o que poderia provocar turbulências em países como o Brasil. Afinal, Yellen garantiu que nada mudou.
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