Renato Duque diz que Lula tinha 'pleno conhecimento' de esquema
José Marques, Felipe Bächtold | Folha de S. Paulo
CURITIBA. SÃO PAULO - O ex-diretor da Petrobras Renato Duque falou nesta sexta-feira (5) pela primeira vez na Justiça Federal e fez acusações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Em depoimento ao juiz Sergio Moro, Duque disse que se encontrou com Lula em 2014, já com a Operação Lava Jato em andamento, e que ouviu que não poderia haver contas no exterior em nome do ex-diretor.
O ex-diretor, que já foi condenado em quatro ações penais da Lava Jato, disse que Lula tinha "pleno conhecimento" e o "comando" sobre um esquema de pagamento de propinas em contrato da Sete Brasil, que fornecia sondas para a Petrobras, e que chegou a ser questionado sobre a demora na assinatura de um acordo, quando já tinha se desligado da estatal. Foram três encontros com o petista, afirmou no depoimento, de 2012 a 2014.
"Ele [Lula] me pergunta se eu tinha uma conta na Suíça com recebimentos da empresa SBM, dizendo que a então presidente Dilma tinha recebido a informação de que um ex-diretor da Petrobras tinha recebido dinheiro em uma conta na Suíça, da SBM. Eu falei: 'não, não tenho dinheiro nenhum, nunca recebi dinheiro da SBM'."
Duque diz que o encontro aconteceu no aeroporto de Congonhas, em São Paulo. E continuou: "Ele vira para mim e diz: 'E das sondas, tem alguma coisa?'. E tinha. Falei: não, não tem. E ele falou: 'Olha, presta a atenção: se tiver alguma coisa, não pode ter, entendeu? Não pode ter nada no teu nome."
A seguir, disse o ex-diretor, Lula falou que iria "tranquilizar" Dilma.
"Nessas três vezes, ficou muito claro para mim que ele tinha pleno conhecimento de tudo e tinha o comando."
Duque afirmou que era "responsável pela área do PT" na companhia e que, nos contratos da diretoria, o tesoureiro do partido procurava as empresas para pedir dinheiro. "Inicialmente o Delúbio [Soares], depois o Paulo Ferreira e posteriormente o [João] Vaccari. Tratei com os três", afirmou.
O ex-diretor afirma que, por indicação de Lula, Vaccari já fazia arrecadação para o partido com as empresas que atuavam na Petrobras mesmo antes de assumir o cargo de tesoureiro do PT.
Falou ainda que foi chamado em Brasília pelo ex-ministro Paulo Bernando, que disse: 'Olha, você vai conhecer uma pessoa indicada pelo... [alisa a barba]'. Ele fazia esse movimento, não citava o nome. O presidente Lula era chamado como 'chefe', 'nine' ou esse movimento com a mão [alisar a barba]", afirmou Renato Duque.
O ex-diretor afirma que Bernardo disse a ele que Vaccari iria o responsável pelas "empresas que atuam na Petrobras".
Segundo Duque, no PT, "todos sabiam" da existência do esquema. "Desde o presidente do partido, tesoureiro, secretário, deputados, senadores, todos sabiam", repetiu.
O ex-diretor da estatal disse que, apesar de não ser delator, tinha "intenção de atuar como colaborador". Ele confessou que recebia propinas das empreiteiras em contas no exterior, mas afirmou que aceitará abrir mão de todo o dinheiro e repatriá-lo. A defesa de Duque é comandada pelo advogado Antonio Figueiredo Basto, especialista em delações na Lava Jato.
"Recebi valores. Nunca solicitei. Nunca pedi nenhum benefício em proveito próprio", afirmou. "Quando atingiu US$ 10 milhões, eu pensei: isso é muito mais necessário do que eu necessito para viver e até a minha terceira geração".
O ex-diretor prestou depoimento em uma ação penal em que o principal alvo é o ex-ministro Antonio Palocci e na qual Lula não é réu.
OUTRO LADO
Lula divulgou nota afirmando que o depoimento de Duque é "mais uma tentativa de fabricar acusações" em troca da redução de pena na Lava Jato.
"Como não conseguiram produzir nenhuma prova das denúncias levianas contra o ex-presidente, depois de dois anos de investigações, quebra de sigilos e violação de telefonemas, restou aos acusadores de Lula apelar para a fabricação de depoimentos mentirosos", diz a nota.
O ex-presidente afirma que há uma "desesperada gincana, nos tribunais e na mídia, em busca de uma prova que não existe na realidade e muito menos nos autos".
A defesa de Lula diz que Duque busca pôr em pé a "falaciosa tese do procurador Deltan Dallagnol explorada no seu famoso power-point e que foi negada por 73 testemunhas já ouvidas sob o compromisso de dizer a verdade".
O advogado de Vaccari, Luiz Flávio Borges D'Urso, afirmou que as declarações de Duque sobre o ex-tesoureiro petista "não são verdadeiras". "Trata-se de manifestação de alguém que está, há muito tempo, negociando delação premiada. Dessa forma, este depoimento deve ser recebido com total desconfiança e reservas."
O advogado de Antônio Palocci, José Roberto Batochio, disse que o teor do depoimento de Duque é o de um "delator que quer se beneficiar de algum modo".
O advogado de Delúbio Soares, Pedro Paulo Guerra de Medeiros, disse que Duque não se referiu a "nenhuma situação concreta" em relação a seu cliente.
A defesa de Paulo Bernardo negou com veemência a menção no depoimento e afirmou que ele nunca conversou com o ex-diretor da Petrobras.
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