Valor Econômico
Ex-líderes em atividade afundam sigla de
Covas, Montoro e FHC
A campanha de integrantes PSDB contra João
Doria, candidato do partido à Presidência, já é o episódio mais deplorável da
eleição de 2022. Doria foi escolhido em eleição prévia, realizada em novembro
do ano passado, portanto, a maioria dos militantes da sigla optaram pelo
ex-governador de São Paulo por considerá-lo seu melhor representante na disputa
política mais importante deste ano, ponto.
Se, agora, o PSDB cassa a candidatura
definida de forma legítima, pelo voto direto de seus filiados, o sinal
transmitido à sociedade e, principalmente, aos eleitores que votaram e votam em
seus candidatos, mesmo não sendo tucanos, é um só: o partido, o único do país a
promover prévias, não acredita em democracia. Em que acredita, então, o
“fundador” da social-democracia no Brasil?
Na terça-feira, o presidente da legenda,
Bruno Araújo (PE), um dos principais artífices da “cristianização” do
ex-governador de São Paulo, disse que as prévias ocorreram num momento político
distinto do atual. Seria de utilidade capital para o debate político nacional
se o deputado pernambucano dissesse o que mudou de novembro para cá no cenário
de polarização política que caracteriza a atual disputa pelo poder central no
país.
João Doria “perdeu” na véspera a eleição
prévia de novembro. Ganhou no voto, mas já sabia que sua vitória contrariava os
interesses de ex-líderes tucanos em atividade _ esta imagem o titular da coluna
toma emprestada de colegas do jornalismo esportivo, que a criaram para
caracterizar jogadores brasileiros que, depois de viverem o ápice da carreira
no exterior e dispensados por causa do peso da idade, são contratados a peso de
ouro para “jogar” em clubes nacionais.
Doria nunca teve vida fácil no PSDB. Sua
ligação com o partido se deu por causa da relação de seu pai com o ex-governador
Franco Montoro (1916-1999), um dos fundadores, ao lado de Mário Covas
(1930-2001) e Fernando Henrique Cardoso). O pai de João Doria, publicitário
como o filho, entrou para a política por insistência de Montoro. Este gostaria
que ele se candidatasse a deputado federal por São Paulo, mas, nascido em
Salvador, João Agripino da Costa Doria Neto preferiu disputar a vaga pela
Bahia.
Eleito no início da década de 1960 pelo então Partido Democrata Cristão (PDC), onde Montoro pontuava como um dos principais líderes, o pai de João Doria Jr. Teve o mandato cassado na primeira leva de cassações do golpe militar de 1964. Exilado em Paris, o ex-deputado não teve sequer condições financeiras de levar a família _ a mulher e dois filhos _, o que só veio a ocorrer dois anos depois. Porém, em 1968, eles tiveram que retornar ao Brasil pela mesma razão que os impediram de ir com o pai no primeiro momento.
De volta ao país, Doria, seu irmão e a mãe,
Maria Sylvia, não tiveram melhor sorte. De família abastada do interior de São
Paulo, Maria Sylvia Vieira de Moraes Dias Doria enfrentou um dos piores dos
desgostos: a discriminação. Sua família lhe negou ajuda no momento em que ela
mais precisou porque ela cometeu a “ousadia” de se casar com um nordestino. Por
essa razão, João Doria e o irmão tiveram uma adolescência, que obrigou o
ex-governador a começar a trabalhar aos 13 anos de idade. Sua mãe faleceu
poucos após o retorno de Paris.
Graças à antiga ligação do pai com Montoro,
Doria foi, primeiro, secretário estadual de Turismo de São Paulo. Presidiu,
ainda, na gestão de Mário Covas na prefeitura de São Paulo, a Paulistur.
Depois, entre 1986 e 1988, presidente da Embratur no governo Sarney. A decisão
de ingressar na carreira política, todavia, só foi tomada em 2016. Antes, em
2001, filiou-se ao PSDB. Para seu espanto, desde o início, teve como principal
adversário o seu próprio partido.
Para ser o candidato da legenda, foi
obrigado a disputar três eleições prévias. Na primeira, causou incômodo porque
a sigla já havia escolhido o candidato à prefeitura de São Paulo _ Andrea
Matarazzo. No fundo, a ideia de promover prévias naquele momento foi uma forma
de desmoralizar Doria no nascedouro de suas ambições políticas. A turma só não
contava com a obstinação do novo tucano.
Quando começou a amealhar apoios nas
regiões mais carentes da capital, depois de visitar todos os presidentes dos
diretórios municipais, Doria foi surpreendido pelo lançamento de mais três
candidatos nas prévias, dois meses depois de encerrado o prazo limite para
apresentação de candidaturas.
O objetivo, diz Doria, era diluir os votos,
de maneira que ele não somasse o suficiente para vencer a disputa. Ele acabou
ganhando com 62% dos votos. Em seguida, entrou na eleição com 1% das intenções
de votos, em 4º lugar, e com o PSDB em frangalhos. Fez a diferença no horário
eleitoral gratuito e venceu o pleito de 2016, contra o incumbente, o prefeito
Fernando Haddad (PT), no 1º turno.
Em 2018, foi incentivado a renunciar ao
cargo de prefeito para ser o candidato da legenda ao governo paulista, sem
disputa de prévias. Dois dias depois, foi informado pelo presidente do PSDB em
São Paulo, Pedro Tobias, que o então governador Geraldo Alckmin exigiu a
realização de prévias. Mais uma vez, Doria saiu vencedor e, na sequência,
ganhou a eleição, novamente, sem o apoio das lideranças dos tucanos.
A história se repete agora. O ex-governador
venceu as prévias para ser o candidato do PSDB à Presidência da República, mas
não tem um dia de sossego. Ontem, conforme apuraram os repórteres Raphael di
Cunto e Marcelo Ribeiro, os presidentes do PSDB, Bruno Araújo, do MDB, Baleia
Rossi, e do Cidadania, Roberto Freire, decidiram indicar para seus partidos o
nome da senadora Simone Tebet (MDB-MS) como candidata única do grupo à
Presidência. As executivas dos três partidos vão se reunir separadamente na
terça-feira para baterem o martelo.
No mesmo dia, pesquisa Genial/Quaest
(registro TSE nº BR-01603/2022) mostra que Doria tem as intenções de voto de
51% dos entrevistados, face a 44% de Simone Tebet (MDB), para uma candidatura
da Terceira Via.
Os intrépidos repórteres do Valor apuraram
que um defendido por aqueles que acreditam que não haja chance de Doria
renunciar à candidatura é derrotá-lo _ ilegalmente, diga-se de passagem _ na
convenção de julho e deixá-lo recorrer à Justiça para insistir na candidatura.
A judicialização faria com que o PSDB não tivesse candidato à Presidência e
cada diretório regional ficasse livre para compor com quem achasse melhor, o
que favoreceria aqueles que desejam receber Bolsonaro em seu palanque.
Alguém tem dúvida do porquê da campanha de
ex-líderes do PSDB contra João Doria?
Nenhum comentário:
Postar um comentário