quarta-feira, 17 de setembro de 2025

A melhor situação de emprego e salário em décadas e o destino da inflação. Por Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

Situação do mercado de trabalho afeta preços, mas menos do que se pensava faz dois anos

Estimativas de desemprego natural e PIB potencial ainda estão descalibradas ou erradas

Uma taxa de desemprego muito baixa pode acabar por aumentar custos de empresas e preços ("tudo mais constante"). Daí, pode contribuir para o aumento persistente de preços, para a inflação. Qual seria a taxa que não faz a inflação acelerar é um debate interminável e depende de contextos.

No Brasil de 2023, muita gente acreditava que essa taxa seria de algo perto de 8% —há quem acredite nisso até agora.

A taxa de desemprego em julho foi de 5,6%, muito menor. O rendimento médio do trabalho ("salário") está crescendo a 3,8% ao ano, em termos reais —além da inflação. A proporção da população em idade de trabalhar que está ocupada é a maior desde que há dados oficiais comparáveis (2012). A situação deve ser a melhor desde sempre.

Mas a taxa de inflação cai, embora lentamente. É verdade que o IPCA é empurrado para baixo pela valorização do real, pois o dólar cai no mundo inteiro, agora em ritmo um tanto maior aqui no Brasil por causa da taxa de juros muito alta, para não mencionar outras mãozinhas da economia mundial.

A variação de preços mais associada ao ritmo de atividade econômica (emprego, PIB) continua teimosa, bem acima de 6% no caso de serviços, é verdade também.

Porém, se a taxa de desemprego que não dá gás à inflação estivesse por volta de 8%, o IPCA estaria andando mais rápido ou cada vez mais rápido, mais descabelado. Não está. Pode bem ser que a economia possa caminhar normalmente com uma taxa de desemprego bem menor.

Não é de hoje que não se entende muito bem como se encaixam certas engrenagens da economia brasileira, pelo menos quanto ao curto prazo. Basta lembrar os erros enormes e seguidos de previsão de variação do PIB desde 2022, erros ainda mal diagnosticados.

Há outras estatísticas que podem ter interesse, como o crescimento resistente do setor de serviços e o bom desempenho de subsetores como TI e telecom.

Medidas de produtividade da economia indicam o desastre antigo e já sabido —mas são precisas? Haveria alguma novidade setorial que não enxergamos? Atualizações tecnológicas, diretas e indiretas? Melhoras de "ambiente de negócios" ainda em forma de ectoplasma, de medida difícil?

Houve melhora recente e significativa dos salários, é verdade, mas é preciso considerar os dados com mais perspectiva. Repita-se que a média do rendimento do trabalho cresceu 3,8% em relação a julho de 2024; cresceu 8,74% nos últimos 24 meses.

Mas, em relação a julho de 2019, faz seis anos, antes da epidemia, o crescimento foi de 9,7%. Não é lá extraordinário. Nesse tempo, seis anos, a renda (PIB) per capita cresceu pouco mais de 9%; o PIB, uns 14%.

A inflação é caso sério e está dura de matar. O desarranjo fiscal, déficits e dívida do governo, piorou muito o problema. Desemprego muito baixo tende a não ajudar. Ainda assim, a inflação não está descabelada.
Tudo isto posto, trata-se aqui de curto prazo e de escassez de dados e ideias para pensar a economia por agora.

O crescimento possível é maior do que se imaginava faz meros dois anos, mas o PIB ainda cresce pouco.

Não dá para esperar décadas por mudanças como a reforma tributária, tolerar distorções imensas causadas por subsídios de crédito e outros, a falta de investimento em infraestrutura causada pelo sufoco fiscal, a baderna do setor elétrico, a educação ruim e ainda pior para crianças pobres, o sistema de ciência largado. Etc.

Mas há mais caroço nesse angu.

 

Nenhum comentário: