quarta-feira, 17 de setembro de 2025

A belicosa defesa da paz. Por Dora Kramer

Folha de S. Paulo

Os porta-vozes da anistia se contradizem ao adotar retórica agressiva em prol de uma conciliação

Os defensores de anistia aos golpistas condenados pelo Supremo Tribunal Federal falam genericamente em página virada e pacificação.

No entanto, não se ouve deles palavra sobre compromissos reais com a aludida paz. Pedem perdão, mas não fornecessem contrapartida alguma. Ao contrário: seus porta-vozes recorrem a discursos radicalizados e belicosos, produzindo uma inequívoca contradição nos próprios termos.

Em todas as manifestações pró-anistia, o que se ouve é o apelo à clemência por atos que teriam sido de mera cogitação, com adoção de retórica agressiva e acusações fantasiosas sobre a existência de uma ditadura no Brasil. Tese encampada pelos Estados Unidos, que prometem retaliação.

Ademais, há admissão do crime no pedido de perdão. Não se contesta o pretendido. Apenas argumenta-se que, não tendo sido alcançado o intento, seus autores estão aptos a pedir ao país que esqueça o ocorrido.

Isso, note-se de novo, sem alusão a arrependimentos. Donde se depreende que se acham autorizados a repetir aquelas elucubrações quando se sentirem contrariados e quantas vezes forem necessárias até obterem o êxito que os levaria ao poder e, com ele, à impunidade garantida pela imposição da nova ordem fundada na ilegalidade.

Tal contexto já tornaria inaceitável que a normalidade institucional abraçasse a ideia da anistia, mas há também a enganação sobre o apaziguamento de ânimos.

A falsidade do argumento está descrita na violência política que toma conta dos EUA a despeito da anistia dada por Donald Trump aos invasores do Capitólio de 6 de janeiro de 2021. Evidência de que, no caso de atritos em aberto, a indulgência não resulta necessariamente em conciliação. Há risco do inverso.

Na ausência de consenso no Legislativo, da reprovação no Executivo, do repúdio na maioria das pesquisas e da imposição de obstáculo no Judiciário, a anistia só aprofundaria divisões na sociedade e criaria mais atritos entre os Poderes desafiados pela conspirata agora condenada.

 

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