Os
dois deveriam ser presos por tentativa de golpe de Estado
A invasão
do Congresso americano por extremistas de direita inspirou uma
nova onda de entusiasmo golpista entre os bolsonaristas, que nunca deixaram de
ser inimigos da liberdade por terem se vendido ao centrão.
Jair
Bolsonaro foi o único chefe de Estado do mundo que apoiou a invasão liderada
por milícias racistas, neonazistas e/ou adeptas da teoria
da conspiração QAnon. Bolsonaro foi o único chefe de Estado do mundo
que apoiou uma manifestação de gente vestindo a camiseta “Camp Auschwitz”.
Enquanto a invasão acontecia, Bolsonaro disse
que houve fraude na eleição americana (é mentira) e declarou que
“se nós não tivermos o voto impresso em 2022, nós vamos ter problema pior que
os Estados Unidos”.
As instituições deles são mais fortes do que as nossas. Alguns dias antes da tentativa de golpe, os últimos dez secretários de Defesa americanos (tanto republicanos quanto democratas) assinaram um artigo dizendo que “Os militares americanos não têm nenhum papel na determinação do resultado das eleições americanas”. Nenhum foi ao Twitter reclamar do julgamento do Lula, nenhum virou assessor de Toffoli durante a campanha eleitoral. E sem apoio de militar ou policial, cachorrinho de Olavo não se cria.
Ainda
não sabemos se a invasão do Congresso americano foi o início de um novo
movimento golpista ou o fim do último. A invasão provou que a democracia
americana esteve sob ameaça durante o governo Trump e certamente estaria sob
grave ameaça se Trump tivesse sido reeleito. Mas ainda não sabemos se o
extremismo reacionário sobreviverá bem sem bons resultados eleitorais.
Por
um lado, o extremismo racista de Trump ajudou a energizar a base eleitoral
democrata e a fez comparecer em massa para eleger
os dois novos senadores do estado da Geórgia. Não foram quaisquer dois
senadores. Foram os dois que faltavam para que os democratas ganhassem a
maioria no Senado. Muita gente no Partido Republicano vai perder a tolerância
contra os extremistas de Trump agora que eles começaram a custar votos.
Por
outro lado, o momento trumpista deixou um legado de degeneração moral no
Partido Republicano. A invasão do Capitólio seria um episódio isolado de
violência, facilmente rechaçável por, digamos, a torcida organizada do Volta
Redonda, se não tivesse tido apoio de republicanos poderosos antes e depois da
ofensiva.
O
próprio presidente da República incentivou a radicalização para tentar fraudar
a eleição. E, o que é ainda mais incrível, depois da invasão, 139 deputados e 8
senadores republicanos votaram a favor de moções que contestavam a vitória de
Biden, sabendo que mentiam. Não há diferença importante entre Trump e os
invasores, ou entre esses 147 e os invasores. O que faz de 6 de janeiro uma
tentativa de golpe não foi a invasão do Capitólio, foi o fortíssimo
encorajamento institucional que os fascistas tiveram.
Se
Obama tentasse o que Trump tentou, dormiria em Guantánamo no mesmo dia. Se Lula
chamasse o golpe como Bolsonaro chamou, o Exército o enforcaria na Praça dos
Três Poderes. Tanto Trump quanto Bolsonaro precisam ser presos por tentativa de
golpe de Estado. As Forças Armadas brasileiras precisam denunciar o golpismo de
Jair Bolsonaro. Isso, sim, seriam instituições funcionando.
*Celso Rocha de Barros, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford (Inglaterra).
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