Valor Econômico
Eleição na Casa mostra que o bolsonarismo
continua bem articulado
Seis mil quilômetros separam Brasília e
Kissimmee, cidade localizada na Flórida, Estados Unidos, onde o ex-presidente
Jair Bolsonaro (PL) expatriou-se após ser derrotado no pleito de outubro. Mas a
distância eleitoral entre a frente ampla liderada pelo presidente Luiz Inácio
Lula da Silva (PT) e o bolsonarismo permanece muito menor.
A eleição para a presidência ao Senado
demonstrou ao governo que, embora o chefe do Poder Executivo e as instituições
republicanas tenham saído fortalecidos da tentativa de golpe do dia 8 de
janeiro, o bolsonarismo continua bem articulado. E não dará vida fácil ao
Executivo na Casa.
Lula venceu Bolsonaro em outubro, no segundo turno, com 50,9% dos votos válidos contra 49,1%. Foi diplomado e tomou posse, mas uma espécie de terceiro turno ocorreu nesta quarta-feira no Senado. Após ver a candidatura bolsonarista ganhar corpo, o Palácio do Planalto precisou entrar em campo para, junto com os demais partidos aliados, assegurar a vitória de Rodrigo Pacheco (PSD-MG) contra Rogério Marinho (PL-RN).
Antes da disputa, aliados de Pacheco diziam
acreditar que o atual presidente do Senado obteria pelo menos entre 50 e 55
votos. Conseguiu 49 contra 32, mais do que os 41 necessários. Mas o resultado
deve soar como alerta ao governo: 49 é justamente a quantidade de votos
necessários para a aprovação de uma proposta de emenda constitucional (PEC) na
Casa. Ou seja, há pouca margem de segurança.
Em outra frente, a oposição somou mais dos
que os 27 votos necessários para requerer a instalação de comissões
parlamentares de inquérito (CPIs).
A eleição para a presidência do Senado
também escancarou que a liderança do bolsonarismo não será conduzida mais
apenas pelo próprio ex-presidente, seus filhos e ex-ministros: a ex-primeira
dama Michelle Bolsonaro foi pessoalmente ao Parlamento para fazer campanha em
favor de Marinho. No PL, fala-se na possibilidade de ela ser candidata em 2026,
caso o marido se torne inelegível.
Na Câmara, a base aliada inicia a atual
legislatura ainda mais longe de atingir o quórum constitucional, ou seja, um
piso de 308 deputados. Mas foi determinante para a folgada reeleição de Arthur
Lira (PP-AL). A adesão dos governistas à candidatura de Lira facilitará o
diálogo do Planalto com a cúpula da Câmara, onde a oposição será liderada por
Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente.
Na Câmara, aliás, a bancada bolsonarista
mostrou disposição de fazer barulho, ao vaiar o discurso do deputado Chico
Alencar (Psol-RJ), candidato derrotado na disputa, que condenava os atos
antidemocráticos do dia 8 de janeiro. Era, felizmente, uma minoria. E que na
sequência logo sofreu um revés ao ouvir forte discurso de Lira em defesa da
democracia.
Após ser reeleito, o presidente da Câmara
disse que era hora de “desinflamar o Brasil” e afirmou que nenhum regime irá
prosperar fora da democracia. Em seguida, destacou que quem atentar contra o
estado democrático de direito sofrerá o rigor da lei. “Para aqueles que
depredaram, vandalizaram e envergonharam o povo brasileiro haverá o rigor da
lei”, afirmou.
Pacheco já vinha na mesma linha.
“Acontecimentos como em 8 de janeiro de 2023 não podem, e não vão, se repetir.
O discurso de ódio, o discurso mentiroso, o discurso golpista deve ser
desestimulado, desmentido e combatido. O recado que o Senado Federal dá ao
Brasil agora é que manteremos a defesa intransigente da democracia”, sublinhou
o senador, após a vitória.
Foi uma importante sinalização a Lula, que
horas antes já havia feito um aceno estratégico ao Congresso. Ao discursar
durante a abertura do ano judiciário, no Supremo Tribunal Federal (STF), o
chefe do Executivo fez uma defesa do exercício da política e, em tom de
desabafo, pediu que nunca mais se duvidasse da política. Neste ponto, na
valorização da política e na condenação de atos antidemocráticos, a frente
ampla e o bolsonarismo estão, sim, a léguas de distância.
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