O Globo
A oposição vai dividida para a eleição presidencial daqui a dois anos, e essa é uma grande notícia para Lula
Existe um axioma na política segundo o qual
as eleições municipais não influenciam a disputa presidencial de dois anos
depois. Isso era verdade até este domingo, quando os eleitores de São Paulo
colocaram no segundo turno os candidatos apoiados pelo governador Tarcísio de
Freitas e pelo presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, o prefeito Ricardo Nunes e
o deputado Guilherme
Boulos, respectivamente. A eleição presidencial de 2026 começa hoje.
Mesmo em terceiro lugar, o guru de autoajuda Pablo Marçal é o terceiro eixo da antecipação do calendário eleitoral. Ao rachar o antipetismo, o eleitor paulistano exibiu a demanda por uma direita radicalizada e antissistema, que não se vê representada nem por Tarcísio de Freitas, nem pelos governadores Romeu Zema, Ratinho Junior e Ronaldo Caiado.
Tratando oponentes como se fossem inimigos a
ser dizimados, e não meros adversários políticos, Marçal representa uma segunda
geração do bolsonarismo, mais parecida com o histrionismo do argentino Javier Milei e
do salvadorenho Nayib Bukele do
que com o Bolsonaro de mãos dadas com o Centrão dos últimos anos. Marçal sai da
disputa como potencial candidato a presidente.
Em termos ideológicos, as eleições municipais
revelaram uma oposição fortalecida e rachada. Bolsonaro e Marçal dividem os
louros pelo sprint que levou ao segundo turno Cristina Graeml, em Curitiba, e
Fred Rodrigues, em Goiânia. Em Belo Horizonte, o candidato da direita, Bruno Engler,
imitou Marçal no debate da TV Globo insinuando, sem nenhuma prova, que seu
adversário Rogério Correia, do PT,
era usuário de cocaína. A marçalização da política está em marcha, passando por
cima de Bolsonaro. A oposição vai dividida para 2026, e essa é uma grande
notícia para Lula.
O racha torna mais dura a pré-candidatura de
Tarcísio de Freitas. Até agora, o governador de São Paulo podia jogar com um
coringa nas mãos. Defendia publicamente a reabilitação política de Bolsonaro
enquanto acompanhava os indicadores de aprovação do governo federal. Se
concluísse em 2026 que o presidente seria favorito, Tarcísio optaria pela
própria reeleição em São Paulo. Com a rebelião no antipetismo, não terá mais o
tempo a seu favor.
O governador precisa que seu afilhado Ricardo
Nunes vença em São Paulo para ganhar musculatura própria e não depender
completamente do apoio do ex-presidente. Depois, Tarcísio terá de pacificar as
relações do bolsonarismo com seu secretário de Governo, Gilberto
Kassab, presidente do PSD. Trazer o partido de Kassab para o barco
da oposição muda o patamar da pré-candidatura de Tarcísio.
Lula fez o possível para ficar longe das
disputas municipais. Sua assessoria marcou e cancelou viagens para participar
das campanhas em Cuiabá, Porto Alegre e Belo Horizonte. Desesperado com a
ausência do presidente, o candidato do PT a prefeito de Campinas, Pedro
Tourinho, reaproveitou uma gravação de vídeo de 2020 para anunciar que tinha o
apoio dele. Mesmo assim, Tourinho perdeu.
Em entrevista a uma rádio da Paraíba, Lula
justificou a ausência:
— Como presidente, levo em conta a
diversidade ideológica do meu campo de apoio e eu não quero brigar. Campanha
não serve para criar inimigos, mas para construir amigos.
Nas próximas três semanas, no entanto, Lula
não terá opção. Na urna paulistana de 27 de outubro aparecerão os rostos de
Guilherme Boulos e Ricardo Nunes. Mas, para o mundo da política, a disputa é
apenas a prévia para Lula e Tarcísio. Em 2022, a vitória na cidade de São Paulo
foi essencial para Lula, mas desde então muitos dos que o apoiaram almejando um
governo de frente ampla se decepcionaram. A tentativa de Lula de reconquistar
São Paulo para reeleger passa pelo segundo turno da campanha a prefeito — 2026
só está começando.
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