quarta-feira, 24 de dezembro de 2025

O ministro do ‘novo clero’. Por Bernardo Mello Franco

O Globo

Novo titular do Turismo nunca disputou eleições, mas é herdeiro de uma oligarquia regional

Em Brasília, como no romance de Lampedusa, às vezes tudo deve mudar para continuar como está.

Em setembro, o União Brasil anunciou o rompimento com o governo e a saída de Celso Sabino do Ministério do Turismo. O paraense se segurou na cadeira por três meses, até ser expulso do partido. Ontem o presidente Lula deu posse ao novo titular da pasta, o paraibano Gustavo Feliciano. Para surpresa de ninguém, ele foi indicado pelo União Brasil.

O novo ministro nunca disputou eleições, mas é herdeiro de uma oligarquia regional. O pai, dublê de médico e radialista, é deputado de sete mandatos. A mãe foi duas vezes vice-governadora. Hoje está pendurada no terceiro escalão no Ministério de Desenvolvimento Social.

Feliciano, o patriarca, chegou à Câmara no governo Fernando Henrique. Sempre integrou o baixo clero, massa de parlamentares que habita o fundo do plenário e se dedica a assuntos paroquiais. Neste ano, o veterano se empenhou na defesa da casta política. Apoiou a PEC da Blindagem e relatou o projeto que previa aumentar o número de deputados.

Em 2011, o congressista apostou no corporativismo para tentar se eleger ministro do Tribunal de Contas da União. Vendeu-se como “líder anônimo” e representante do “novo clero”, que seria “diferente do baixo clero de antigamente”. “Nós, o novo clero, temos a maioria aqui”, proclamou. Terminou em quarto lugar, com apenas 33 votos.

Ontem o pai se debulhou em lágrimas ao ouvir o filho descrevê-lo como seu “maior orgulho”. O pranto foi exibido em close na transmissão oficial.

O novo ministro não deve o cargo só ao progenitor. Ele foi apadrinhado pelo deputado Hugo Motta, a quem chamou de “maior líder” da Paraíba. “O Ministério do Turismo é a sua casa”, derramou-se. Ele ainda caprichou nos elogios ao novo chefe. “O senhor é muito mais que um presidente. É um marco na história do Brasil e do mundo”, empolgou-se. Apesar do clima de bajulação, Lula preferiu não discursar.

O petista sempre usou a pasta do Turismo como instrumento de barganha. Agora nomeia o terceiro ministro em menos de três anos. Após definir sua escolha como um “sonho”, Feliciano encerrou a cerimônia de posse com um grito: “O Brasil é lindo!”. Para políticos como ele, mais ainda.


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