Clóvis Rossi
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
SÃO PAULO - Conheci Márcio Moreira Alves em Cuba, há 32 anos. Eu estava preparando uma série de reportagens sobre a ilha, embora brasileiros estivessem então proibidos de visitá-la. Não me lembro o que Marcito fazia por lá.
Estávamos no mesmo hotel, tomávamos café da manhã mais ou menos à mesma hora, mas não nos falávamos. Como ele me contaria depois, preferiu evitar o contato para não me comprometer como, digamos, amigo do "perigoso" homem cujo discurso fora o pretexto para o nefando AI-5.
Eu o evitava, primeiro, porque odeio me oferecer para conversar e, segundo, porque temia comprometê-los aos olhos dos cubanos, porque eu devia ser o único estrangeiro, diplomatas à parte, que não estava ali exilado nem convidado pelo regime.
Por fim, ele tomou a iniciativa de perguntar, via guia oficial (sim, governos como o cubano não deixam jornalistas soltos pelo país), se topava conversar. Não queria outra coisa. Marcito revelou-se uma doce criatura, que não tinha nada a ver com o incendiário que fora usado para endurecer o regime.
Uma noite, me levou a visitar uma família cubana, sobre cujo chefe, operário de uma fábrica de charutos, ele escrevera um livro. Fomos de ônibus ("guaguas", como os cubanos os chamam). Permitiu-me uma rara visão por dentro da vida do cubano normal.
O operário era revolucionário, sim, não não era cego. Cantava os méritos do regime, mas contava também suas penas. Assim como Marcito o fez nas muitas conversas ociosas que tivemos por lá É claro que Marcito simpatizava com o regime, mas, ao contrário de incontáveis intelectuais brasileiros que babam na "guayabera" diante de Cuba, também não era cego.
Respeitei-o mais a partir daí exatamente por isso: repetir slogans e propaganda oficial é fácil.
Pensar dá um baita trabalho.
DEU NA FOLHA DE S. PAULO
SÃO PAULO - Conheci Márcio Moreira Alves em Cuba, há 32 anos. Eu estava preparando uma série de reportagens sobre a ilha, embora brasileiros estivessem então proibidos de visitá-la. Não me lembro o que Marcito fazia por lá.
Estávamos no mesmo hotel, tomávamos café da manhã mais ou menos à mesma hora, mas não nos falávamos. Como ele me contaria depois, preferiu evitar o contato para não me comprometer como, digamos, amigo do "perigoso" homem cujo discurso fora o pretexto para o nefando AI-5.
Eu o evitava, primeiro, porque odeio me oferecer para conversar e, segundo, porque temia comprometê-los aos olhos dos cubanos, porque eu devia ser o único estrangeiro, diplomatas à parte, que não estava ali exilado nem convidado pelo regime.
Por fim, ele tomou a iniciativa de perguntar, via guia oficial (sim, governos como o cubano não deixam jornalistas soltos pelo país), se topava conversar. Não queria outra coisa. Marcito revelou-se uma doce criatura, que não tinha nada a ver com o incendiário que fora usado para endurecer o regime.
Uma noite, me levou a visitar uma família cubana, sobre cujo chefe, operário de uma fábrica de charutos, ele escrevera um livro. Fomos de ônibus ("guaguas", como os cubanos os chamam). Permitiu-me uma rara visão por dentro da vida do cubano normal.
O operário era revolucionário, sim, não não era cego. Cantava os méritos do regime, mas contava também suas penas. Assim como Marcito o fez nas muitas conversas ociosas que tivemos por lá É claro que Marcito simpatizava com o regime, mas, ao contrário de incontáveis intelectuais brasileiros que babam na "guayabera" diante de Cuba, também não era cego.
Respeitei-o mais a partir daí exatamente por isso: repetir slogans e propaganda oficial é fácil.
Pensar dá um baita trabalho.
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