No rastro da turbulência provocada pelos protestos, a chefe da Secretaria de Relações Institucionais foi parar na geladeira, o que realça a falta de articulação do governo
Falta de negociação deixa Ideli na berlinda
Ministra de Relações Institucionais tem sido preterida por colegas no momento em que Planalto tenta viabilizar a reforma política via plebiscito
Juliana Braga
A reação do governo à onda de protestos que tomou as ruas nas últimas semanas evidenciou os problemas de articulação com o Congresso Nacional que se arrastam desde o início da gestão da presidente Dilma Rousseff. Em reunião ontem com deputados petistas (leia mais na página 3), Dilma utilizou diversas vezes a palavra “chacoalhar” para ressaltar a necessidade de dar novo rumo ao governo, e ressaltou a importância de reavivar o diálogo com deputados e senadores. A crise coloca na berlinda a ministra da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), Ideli Salvatti. Recordista de tempo na função — na próxima semana, completa dois anos no cargo —, a situação de Ideli está cada vez mais insustentável no Planalto. Em diversas situações, ela tem sido substituída, de maneira explícita, por outros ministros da Esplanada.
Agora, que a permanência na SRI é questionada até por correligionários, Ideli não tem conseguido esconder o nervosismo. Pessoas próximas afirmam que, nos últimos dias, com frequência, a ministra embarga a voz quando fala sobre os problemas do governo e, principalmente, sobre a desunião dentro do PT. Relatam também que existe uma irritação com Aloizio Mercadante, ministro da Educação, não apenas pelo fato de ele estar exercendo a função que caberia a ela mas também pelo gênio do colega, descrito como “difícil”.
No Congresso, parlamentares reforçam a cada dia o descontentamento com a falta de articulação com o governo. Na tentativa de contornar as insatisfações, Dilma tem promovido reuniões com a base e também destacou ministros para estreitar as relações com o parlamento — função que deveria ser exercida por Ideli. Além de Mercadante, Fernando Pimentel (Indústria, Desenvolvimento e Comércio Exterior) e José Eduardo Cardozo (Justiça) têm protagonizado as conversas com deputados e senadores.
O trio de ministros tenta tirar o atraso de dois anos e meio de falta de diálogo do Planalto para conduzir a saída da crise proposta pela presidente — a realização de um plebiscito para a reforma política. O cerne da questão é que Dilma nunca dependeu tanto do Congresso, pois só poderá dar prosseguimento à ideia de consulta popular caso o parlamento aprove a iniciativa. Cabe à tropa de choque ministerial se aproximar dos congressistas sem aumentar o desgaste de Dilma perante o Legislativo. Mercadante, porém, encontra ampla rejeição entre os parlamentares. “Ele até pode ter eficiência administrativa, mas tem uma arrogância desproporcional no tratamento com as pessoas”, reclama um cacique da base governista. “O que a Dilma precisa é de alguém ‘macio’”, complementa um dos ministros da Esplanada.
Quem também tem trabalhado na articulação é o vice-presidente da República, Michel Temer. Mas a atuação do peemedebista está desgastada, especialmente depois de ele ter causado constrangimentos ao Planalto na quinta-feira, quando anunciou que seria inviável realizar o plebiscito no prazo desejado por Dilma e, cinco horas depois, recuou.
Interesses
Muitos parlamentares ressaltam que não adianta trocar o interlocutor se não houver mudança na política de articulação imposta pela presidente. “O problema é de modelo. O critério de interlocução não passa por identidade, por projetos, e sim por interesses específicos”, afirma o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES).
O entendimento de integrantes do próprio governo é de que o estilo de administração de Dilma afasta os aliados dela. Ao longo dos últimos anos, a presidente acabou isolada, e agora não tem nomes para indicar ao posto de intermediador dos conflitos com o Congresso. O entendimento é o de que, depois da saída de Antonio Palocci da Casa Civil, a coordenação política do governo nunca mais foi benfeita, e os parlamentares se sentiram abandonados.
De acordo com um integrante do alto escalão da Esplanada, o atual ministro da Saúde, Alexandre Padilha, poderia assumir a articulação, mas foi colocado em uma pasta técnica para ganhar visibilidade perante os eleitores, uma vez que ele é um dos petistas cotados para disputar o governo de São Paulo no ano que vem.
Colaborou Adriana Caitano
Fonte: Correio Braziliense
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