- Valor Econômico
Possibilidade de Palocci optar pela delação preocupa
Uma congestionada agenda parlamentar focada nas reformas de caráter fiscal é o instrumento que o presidente Michel Temer tem à mão para resgatar dois Poderes da República - Executivo e Legislativo - da hecatombe provocada por delações de seis dúzias de executivos da Odebrecht ao Ministério Público Federal (MPF) no processo da Lava-Jato. Essa mesma agenda servirá de escudo ao presidente, caso tome fôlego nos próximos dias a turbulência avistada no mercado financeiro na quinta-feira - última sessão de negócios antes do feriado. Juro e dólar tiveram alta comedida. A desvalorização do Ibovespa e das ações dos maiores bancos do país foi destacada. Banco do Brasil e Bradesco foram as maiores quedas do setor. Na tendência acompanharam Petrobras e Eletrobras.
O comportamento das ações dos bancos soa secundário diante do avassalador noticiário político, mas não é bem assim. A atenção dedicada por investidores aos papéis dos bancos na véspera de um fim de semana prolongado por feriado e após a abertura de inquéritos sobre parlamentares e ministros de Estado - sem livrar da roda presidente e ex-presidentes da República - foi creditada à elevada liquidez dessas ações que autoriza venda rápida para fazer caixa e reduzir exposição ao setor.
A quebra do sigilo de áudios e vídeos com depoimentos de executivos e do presidente do conselho de administração do Grupo Odebrecht, Emílio Odebrecht, à Procuradoria Geral da República (PGR) escancarou o uso intensivo de caixa dois para financiamento de campanhas eleitorais e pagamento de propinas - que para uma ponta da operação era garantia de participação em bons e grandes negócios, rendendo benefícios para a outra ponta.
A cautela com os bancos demonstrada por participantes do mercado foi inspirada, também, por novas delações que podem estar sendo negociadas. A "delação do fim do mundo", como ficou conhecido o acordo feito pela Odebrecht, que agora vem a público, impõe pressa a outros investigados que desejam usufruir desse recurso para diminuir pena em processos da Lava-Jato. É razoável supor, que após tão diversificadas revelações feitas por executivos da empreiteira, apresentar algo novo à Justiça tornou-se uma tarefa ingrata.
A semana mais curta pelo feriado foi encerrada com Antonio Palocci sendo visto como operador do esquema gigantesco de propina que justificou, na Odebrecht, a criação do departamento de operações estruturadas. A quebra de sigilo de outra ação penal, também da Lava-Jato, em que Marcelo Odebrecht e Antonio Palocci são réus, ampliou a inquietação por revelar que o empreiteiro fez doações eleitorais de R$ 14 milhões ao ex-ministro, que, nos últimos anos, teve intensa atuação como consultor político, especialmente na área bancária.
Neste início de semana, a temperatura pode subir porque não se descarta o disparo de um gatilho capaz de empurrar o ex-ministro para a delação. Amanhã, o Superior Tribunal de Justiça vai votar um pedido de liberdade encaminhado pela defesa de Palocci. Pedido semelhante foi rejeitado pelo tribunal em novembro do ano passado. Mais uma negativa poderá afetar duramente o ex-ministro, que está preso na carceragem da Polícia Federal, em Curitiba, desde setembro por suposto recebimento de propina no valor de R$ 128 milhões da Odebrecht para repassar ao PT, entre os anos de 2008 e 2013.
O eventual relacionamento dos bancos com empresas envolvidas nas investigações da Lava-Jato é mais um ponto de preocupação. Na edição de domingo, o jornal "Folha de S. Paulo" confirmou que a intuição do mercado funciona. A Folha revelou que ex-executivos da Odebrecht apresentaram documentos para corroborar acusações feitas nas delações. Extratos bancários, comprovantes de transferência de dinheiro e contratos fictícios fornecidos pelos delatores deverão ser usados para provar crimes relatados nos depoimentos.
Independentemente da posição de executivos na hierarquia dos bancos e desses no sistema, a possibilidade de delação de Antonio Palocci no processo da Lava-Jato amplifica a ansiedade. Neste início de semana, a temperatura pode subir no mercado porque há o risco de disparar um gatilho que empurrará o ex-ministro para a delação.
As expectativas do mercado neste início de semana - também a ser abreviada pelo feriado do dia de Tiradentes na sexta - serão calibradas pelo avanço de discussões sobre as reformas no Congresso Nacional e por mais informações ou especulações em torno das perspectivas de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva atrair partidos políticos de centro para cultivar sua candidatura em 2018 e, neste momento, fazer um contraponto às revelações feitas pela Lava-Jato como noticiado na imprensa. Levando-se em conta que o depoimento de Lula ao juiz federal Sérgio Moro ocorrerá em duas semanas - 3 de maio - não causará estranheza se o ex-presidente tiver seu futuro pautado por aliados políticos.
Política segue em destaque nos próximos dias. Ontem, o presidente Michel Temer reuniu líderes de partidos aliados na Câmara e ministros do chamado núcleo duro do governo e o ministro da Fazenda. Reforma da Previdência era o principal tema em pauta. A expectativa é de leitura do parecer pelo relator Arthur Maia na terça. O ministro da Fazenda também começa a semana tratando desse assunto como convidado do seminário "Os caminhos para a reforma da Previdência", promovido pelo Valor, em Brasília.
A agenda econômica não é trivial. Amanhã o Banco Central divulga a Ata do Copom.
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