As reuniões do G-20 se tornaram reféns da errática e desconcertante política do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Na reunião do que é o G-19 mais 1, em Osaka, não será diferente. De novo, evento paralelo ofuscará em boa parte seus resultados, pois o assunto principal e o risco maior para a economia global é a guerra comercial de Washington contra a China.
Se o grupo dos países mais ricos do mundo é incapaz de interferir decisivamente no conflito que está reduzindo o comércio global e acelerando um desaquecimento já em curso, os EUA têm poder suficiente para vetar que temas vitais, como ambiente e protecionismo, que lhe sejam desagradáveis constem do comunicado final do encontro. Com isso, os termos em que são vazados o texto ao fim das reuniões são cada vez mais protocolares.
O que se prefigura no encontro do G-20 é um aumento da dissonância de propósitos. Antes de embarcar para Osaka, Trump apresentou seu cartão de visitas aos líderes com os quais se encontrara. Criticou a União Europeia pelas medidas antitruste que tem tomado contra os gigantes da tecnologia americanos, como Google, um par de dias depois de acusar o Banco Central Europeu de manipulação do câmbio em prejuízo dos EUA. Criticou as tarifas retaliatórias às sobretaxas ao aço e alumínio, determinadas agora pelo governo de Narandra Modi (Índia), considerando-as "inaceitáveis". Por fim, deixou no ar dúvidas sobre a aliança militar americano-japonesa, colocando o anfitrião, o primeiro ministro Shinzo Abe, em situação embaraçosa.
Trump não é o único a fazer declarações inconvenientes a ensombrecer o clima da reunião. O presidente russo Vladimir Putin, em entrevista ao Financial Times, disse que o "liberalismo tornou-se obsoleto" e que o "unilateralismo" de Trump tornou a situação "definitivamente mais dramática e explosiva".
A ofensiva geral de Trump contra a China, que rege as atenções em Osaka, pode culminar com alguma trégua com Pequim. É do interesse dos chineses impedir que todo seu comércio bilateral com os americanos seja taxado, e também, ganhar tempo. Donald Trump enfrentará de novo as urnas, não tem grande popularidade e pode deixar a Casa Branca em 2020, possibilidades que não recomendariam concessões importantes e definitivas da China.
Além disso, a China está na defensiva no G-20. Reunião entre os ministros do Comércio do grupo indicou que a maioria dos países voltou-se contra os subsídios industriais que o país concede e pediu mais uma vez uma solução chinesa para seus enormes estoques de aço. Há ojeriza pelos métodos de Trump entre os europeus, mas não por suas demandas de maior abertura dos mercados da China, de reforço aos direitos de propriedade intelectual e de fim da transferência forçada de tecnologia das empresas estrangeiras que operam no país.
Como a guerra de Trump volta-se também contra objetivos estratégicos chineses e tem fins geopolíticos, Xi Jinping prepara-se para um longo contorno dos obstáculos ao acesso à tecnologia de ponta, que pretende dominar e liderar em 2025. Com a Huawei e outras empresas na lista negra dos negócios com os EUA, as metas do "Made in China 2025" estão seriamente ameaçadas. Domesticamente, o governo voltou a soltar as rédeas do crédito e estimular a infraestrutura para impedir que os efeitos da guerra comercial culminem em uma desaceleração chinesa maior do que a planejada. À margem do G-20, a China dará continuidade à aproximação com a Rússia, e com a Índia, atacada por Trump, após voltar a afagar Kim Jong-un, ditador da Coreia do Norte.
Trump deixou, porém, pouco espaço para uma negociação equilibrada. Como aponta Robert Zoellick, ex-chefe da USTR, falta a contrapartida americana - até agora, quando muito, fala-se em retirar tarifas unilaterais que não existiam antes (Financial Times, 26 de junho).
O Brasil pode chegar ao G-20 com um acordo comercial fechado com a União Europeia. Entre os Brics, com a aproximação anti-Trump de Rússia, China e Índia, Jair Bolsonaro é voz discordante. Ao chegar a Osaka, o presidente respondeu rudemente às palavras da premiê Angela Merkel, em resposta ao parlamento, de que o desmatamento brasileiro a preocupa e que discutiria o assunto com Bolsonaro. Bolsonaro disse que não foi ao G-20 para ser advertido por ninguém e que na questão do ambiente a Alemanha tinha muito a aprender com o Brasil. A Alemanha é um dos países mais favoráveis ao acordo da UE com o Mercosul, ao contrário da protecionista França. A política ambiental já cria embaraços internacionais para o país e sinaliza problemas mais à frente.
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