Valor Econômico
Levantamento recentes indicam que uma divisão do eleitorado em três faixas praticamente iguais
Um conjunto de pesquisas divulgadas nos
últimos dias indicou que a sociedade brasileira está menos polarizada do que
dizem as aparências e que há um senso comum a favor da democracia. Existe
ceticismo, contudo, em relação ao inquérito no Supremo Tribunal Federal que
apura uma tentativa de golpe de Estado em 2022.
Esses dois achados, para o bem ou o mal, dialogam entre si. O extremismo ideológico patrocinado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro está confinado a uma parcela minoritária do eleitorado, mas não há, ainda, convicção de que o ex-presidente estaria envolvido no golpismo, mesmo diante do intenso noticiário nesse sentido.
É sintomático que o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva tenha tido a iniciativa de tocar no assunto do golpismo em suas
declarações públicas assim que recebeu alta do Hospital Sírio Libanês, em São
Paulo, onde foi operado. Abordou o tema sem ser indagado. “É muito triste saber
que pessoas que chegaram ao cargo de general de quatro estrelas montaram uma
máquina de fazer maldade nesse País e queriam dar um golpe”, disse Lula em
entrevista ao “Fantástico”, da Rede Globo. A prisão do general Walter Braga Netto
por tentar interferir nas investigações é fato do dia 14 e as pesquisas foram
anteriores a isso. Mas já demonstravam que o impacto do indiciamento pela
Polícia Federal tanto de Bolsonaro quanto de Braga Netto foi relativo.
De acordo com pesquisa feita na primeira
semana de dezembro pelo Ipespe para o Observatório da Democracia criado pela
Advocacia Geral da União (AGU), a população se posiciona sobre o tema conforme
o posicionamento político.
No geral, 42% dos pesquisados acreditam que o
país passou por um risco real de golpe de Estado. Mas no eleitorado de
esquerda, esse percentual sobe para 80%. No da direita, ocorre o oposto.
Somente 20% viram risco real de golpe e 53% disseram que não houve risco algum.
Na faixa de centro, as opiniões se dividem: 40% viram grande risco, 34% pequeno
risco e 27% não viu risco ou não sabe responder.
O senso comum a favor da democracia ficou
claro pela pesquisa do Ipespe, em que uma maioria de dois para um prefere a
democracia com todas suas mazelas a um regime autoritário.
É preciso ressalvar, contudo, que neste caso
há o risco de uma espiral de silêncio. Espiral de silêncio, segundo conceito da
cientista poítica Elizabeth Noelle Norman, é quando o entrevistador opta pela
resposta que acredita ter mais aceitação social, e não pela que de fato traduz
seu pensamento.
Uma outra pesquisa, do Ipec, feita entre 5 e
10 de dezembro, constatou que 65% dos pesquisados estavam pouco (41%) ou nada
(24%) informados sobre o intento golpista. Para 43% Bolsonaro está metido na
conspiração e para outros 42% ele é alvo de perseguição política. A divisão
quase idêntica não existe nos cruzamentos. As faixas usualmente mais lulistas
vêem culpa de Bolsonaro e as mais oposicionistas vêem um processo injusto.
Um desdobramento da enorme pesquisa
Genial/Quaest divulgada na semana passada inidica que a faixa de centro no
Brasil pode ser a maior, em que pese a polarização nacional. Somente 19% se
declarou lulista/petista e 12% bolsonarista. Outros 14% se disseram “de
esquerda, mas não lulista/petista e 20% “de direita, mas não bolsonarista”. Os
que se dissem “sem posicionamento” são 30% e 4% não sabe ou não respondeu.
Agregando as categorias, no campo vermelho
estão 33%, no campo azul 32% e na coluna do meio estão 34%. Três fatias
praticamente iguais, mas com uma ligeiro pendor para os que não se identificam
com os polos.
Na divisão por cruzamentos um dado que chama
a atenção é que o campo centrista é transversal: não há grande oscilação por
gênero, religião, renda e instrução, o que não acontece com os campos
direitista e esquerdista.
Apenas nas faixas de maior renda e de maior
instrução o campo centrista não predomina: é ultrapassado ou alcançado, nos
dois segmentos, pelo eleitor “de direita, mas não bolsonarista”. É um resultado
condizente com o que se viu nos grandes centros urbanos na eleição municipal de
outubro. Partidos conservadores, não necessariamente o PL, somados receberam a
maior parte dos votos nas cidades com renda maior e nivel de instrução da
população maior.
Um resultado significativo pode ser visto no
campo vermelho nestas duas faixas e na de eleitores entre 16 e 34 anos, o
eleitorado jovem . Nessas três categorias há mais gente se declarando “de
esquerda, mas não lulista/petista ” , do que adeptos do presidente ou do PT. Em
todas as demais o lulismo-petismo é significativamente mais alta do que a
esquerda alternativa.
Isso demonstra com números a premissa de que
Lula é maior que a esquerda no Brasil, mas Bolsonaro é menor que a direita. Daí
a reconhecida dificuldade do campo esquerdista fornecer alternativas ao nome do
atual presidente na disputa eleitoral de 2026, ao passo que na direita,
possibilidades se colocam sem pedir licença ao ex-presidente, que está
inelegível e sonha ser o único condutor do processo em seu campo.
Demonstra ainda que há lógica no que disseram
recentemente o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), o
presidente nacional do PP, Ciro Nogueira; e o próprio presidente nacional do
PL, Valdemar Costa Neto: a direita pode ganhar no Brasil caso se alie ao
centro. E aliar-se ao centro, importante frisar, não significa fechar alianças
com partidos de centro. Significa evitar o extremismo. O centro no Brasil é
forte, mas , por ora, não tem candidato.
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