O presidente do Senado, José Sarney, venceu o primeiro round da luta que trava com a oposição para manter o mandato e o cargo. A vitória deu algum alento para Sarney, nos rounds seguintes. Mas a oposição, também é certo, não se quedou nocauteada. Ela também ganhou fôlego para se manter na competição, sobretudo quando a base aliada ameaça desagregar-se, na medida em que se aproximam as eleições presidenciais de 2010.
Antes das dificuldades que a candidatura Dilma Rousseff (Casa Civil) passou a exibir, nos últimos dias, o que importa no momento é fazer a exumação das vitórias obtidas por José Sarney, semana passada. A bem da verdade, um fato está relacionado ao outro.
O presidente do Senado esteve com um pé fora do Congresso para o qual foi eleito, pela primeira vez, no final dos anos 50, na condição de um político com ideias modernizantes. Dias atrás, estava prestes a sair pela porta dos fundos identificado com o que de mais atrasado sobrevive na política brasileira. Coisas como o nepotismo e patrimonialismo.
A boia em que Sarney está com as mãos chama-se Lula. O presidente e o PT conseguiram transformar descalabros de gestões do Senado em "enfrentamento político com a direita". Não era mais a edição de atos secretos ou a nomeação do namorado da neta o que estava em jogo.
O argumento que conta, nas tropas do governo, é que a oposição não estaria interessada em saber se Sarney empregara a neta ou decretara atos secretos. Mas apenas empenhada em dividir a aliança que o governo tenta construir para as eleições presidenciais de 2010. É a eleição que vai decidir se o povo quer mudar ou se quer mais oito anos de PT no comando de uma política que, pelo menos da ótica petista, é diametralmente oposta à do partido na oposição. Por exemplo, na extensão da intervenção estatal na exploração do Pré-Sal.
Impulsiva, boa parte da bancada do PT no Senado deu mostras de que ficaria contra Sarney. Lula achava e acha que isso é um erro monumental. Desde o início o presidente enxergou na disputa do Senado um round da sucessão presidencial, uma tentativa de rachar a base de sustentação que ele quer transformar em coligação eleitoral do PMDB ao PCdoB - em 2010.
O fato é que o PT parou de flertar com a oposição. Salvo uma ou outra exceção, a maioria dos petistas do Senado que pedia o afastamento de Sarney, em público, reservadamente sucumbiu aos argumentos lulistas. O partido passou a se reunir mais e aos poucos foi saindo, a seu jeito, da posição original. Só o movimento do PT no Senado pareceu permanecer parado (para usar uma expressão grata ao senador Marco Maciel, DEM-PE). Mas na realidade já estava literalmente rachada - 6 a 6 ou 7 a 5, dependendo do humor de Paulo Paim (RS). Como "único senador a viver do salário mínimo", segundo reza a lenda do Senado, o gaúcho seria o menos ameaçado pelo escândalo na campanha. Mesmo a contragosto, Lula até perdoou o líder Mercadante, por entender que ele procurava se preservar para disputar a reeleição.
Na eleição para a presidência do Senado, em fevereiro passado, Lula já desempenhara um papel fundamental para a vitória do senador José Sarney, contra um candidato do PT, o senador Tião Viana (AC). "O sr é um ex-presidente da República e terá o meu apoio e garanto que terá o apoio do PT", comprometeu-se.
Enquadrado o PT, se estabeleceu a lógica do enfrentamento político-partidário. Sarney, que poderia sair, sentiu-se revigorado. Prevalecera a tese de que a oposição, especificamente o PSDB, pedia seu afastamento por motivos políticos-eleitorais e não por causas éticas e de procedimentos legais. Mais uma vez venceu o argumento segundo o qual todos os senadores, algum dia, também cometeram um ou outro pecadilho.
Sarney e parte de sua família pensaram no afastamento do patriarca, porque ele estava perdendo sustentação política. Foram os abraços de Lula e do PT que o levaram à tona. São eles os responsáveis pela situação que se estabelecer no Senado da República. O risco é que todos afundem juntos.
Tocaia grande
Sarney tem em mãos um ofício, feito durante uma de suas passagens pela presidência do Senado, subscrito pelos partidos políticos, pedindo a nomeação de Agaciel Maia para a diretor-geral do Senado.
Financiamento público
Tem um nome a disputa entre as empresas exportadoras e o governo em torno do crédito-prêmio do IPI: chama-se financiamento de campanha. Quem esteve envolvido na pendenga, em 2002, lembra-se muito bem dos embates nos bastidores para os empresários recuperarem o que julgavam ser um direito estabelecido na constituição de 1988, mas que já perdera a eficácia, por decisão do STJ, desde os anos 1990.
Integrantes do antigo governo tucano acham simplesmente um absurdo a proposta agora aprovada no Congresso por meio de uma emenda pendurada na MP que criou o programa "Minha Casa, Minha Vida".
O contrabando, como é chamado esse tipo de emenda às medidas provisórias, ganhou até um apelido entre parlamentares e nas áreas próximas à Receita Federal: "Resolva Minha Vida".
A pressão foi forte. A Receita Federal baixou dois atos dizendo que esse tipo de atitude deveria ser considerada um "evidente intuito de fraude". As instruções diziam: à exceção da execução de medidas judiciais, a Receita Federal deveria encaminhar representação por crime ou indício de crime contra a atividade tributária suspeita. O problema, segundo tributaristas, é que o país constitucionalizou em demasia a matéria tributária, o que abriu grande brecha para que ela se tornasse tema judicatório.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras
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