• Mais de 200 manifestantes são presos em violentos confrontos em Washington
Num discurso de posse de 16 minutos, com ênfase no populismo e no nacionalismo, o presidente dos EUA, Donald Trump, atacou a classe política americana e reforçou a retórica da campanha, mantendo a promessa de blindar fronteiras. Trump pintou um quadro sombrio do país, focou nos desiludidos, prometeu erradicar o extremismo islâmico e colocou os EUA como prioridade total: “Esta carnificina americana para aqui e para agora”, disse, em alusão à criminalidade. Numa das primeiras ações, assinou uma ordem executiva para aliviar o volume de regulações do Obamacare, o programa de saúde de seu antecessor. A chegada do 45º presidente à Casa Branca foi marcada por violentos confrontos e mais de 200 prisões. O público foi apenas um terço do registrado na posse de Obama.
Trump toma posse e põe EUA na rota do nacionalismo
• Com duro discurso de tom populista, presidente faz forte ataque à classe política
Henrique Gomes Batista | O Globo
Washington - O que era tratado como uma excentricidade há 18 meses virou realidade: Donald Trump é o novo presidente dos Estados Unidos. O público da posse — aproximadamente um terço do que o da chegada de Barack Obama ao poder, há oito anos — mostrava a divisão do país: protestos, alguns violentos, ofuscaram a festa do 45º presidente americano. E o magnata assumiu o governo mantendo o estilo que o levou à vitória nas eleições de novembro: um discurso nacionalista, populista, contra o sistema político cujo posto máximo passa a ocupar e cheio de agressividade. As incertezas e os temores que sempre cercaram sua campanha agora estão na Casa Branca.
— Esta carnificina americana para aqui e agora — afirmou o novo presidente americano, referindo-se à onda de criminalidade, num discurso em que ressaltou mais problemas do que pontos positivos.
Uma prova da guinada política ficou clara nas primeiras horas de seu governo: entre suas primeiras ações, divulgadas ontem, anunciou que vai desfazer projetos ambientais de Barack Obama, e assinou uma ordem executiva com a intenção de aliviar o volume de regulações do Obamacare — o programa de saúde publica criado na gestão anterior — cujos detalhes não foram divulgados. Criticado por não ter, até agora, adotado uma postura mais presidencial e por polarizar ainda mais os Estados Unidos no período de transição, Trump voltou à carga no discurso que o colocou no cargo — considerado mais poderoso do mundo. Focando nos desiludidos do interior que concretizaram sua vitória, o novo presidente manteve a temática da campanha, quando se apresentava como o grande messias que iria mudar o país:
— Não estamos meramente transferindo o poder de uma gestão a outra ou de um partido a outro. Estamos transferindo o poder de Washington e dando de volta a vocês, o povo.
Reafirmando o nacionalismo, afirmou em seu discurso de 16 minutos que fará tudo pelos americanos, em primeiro lugar. Prometeu a volta de empregos de empresas que deixaram os EUA, mais segurança com o fortalecimento das fronteiras. Sem muitas referências históricas e com uma linguagem simples, Trump atacou fortemente os políticos do país:
— Washington floresceu, mas o povo não compartilhou desta riqueza. E enquanto eles celebravam na capital da nação, não havia muito o que comemorar para famílias enfrentando dificuldades — atacou o presidente, que muitas vezes repetiu o tom de campanha, embora um pouco menos agressivo, num nacionalismo fazia a reação do público crescer.
Citando Deus várias vezes, Trump pouco falou de relações externas, dizendo vagamente que “buscará a amizade e a boa vontade” dos demais países e que não irá impor o modelo americano a ninguém — mas quer influenciar o planeta com seu “bom exemplo”. E a reação pelo mundo ao seu discurso não foi das mais positivas, refletindo as polêmicas que já alimentou no passado. Sem economizar na retórica agressiva, Trump disse ainda que vai “exterminar o radicalismo islâmico da face da Terra”.
— Não devemos temer. Sempre estaremos protegidos pelos nossos homens e mulheres militares e pela execução da lei. E, sobretudo, por Deus.
Se o discurso agradou a parte de seus eleitores, que viajaram de todo o país para participar da posse, gerou desconforto em muitos americanos. Em diversos momentos foram ouvidas vaias, mesmo diante do Capitólio, em locais onde se concentravam, principalmente, os apoiadores do magnata. Até mesmo nas áreas VIP, manifestações contra o presidente ocorriam: um dos participantes levantou um cartaz numa área reservada.
Sites especializados destacaram ao menos quatro grandes imprecisões, erros ou mentiras no discurso. A mais notória foi quando ele disse que o país está mais pobre — todos os dados mostram uma economia mais forte. Depois quando afirmou que os EUA não conseguem novas parcerias internacionais — Obama fez um dos governos mais multilaterais da História. Disse ainda que as Forças Armadas estão obsoletas, enquanto especialistas indicam que elas são as mais avançadas do planeta.
O público presente no Capitólio para a cerimônia, que ocorreu a uma temperatura de 5 graus e, em diversos momentos — como na hora do discurso de Trump — sob chuva fina, foi comedido quando foram anunciados os nome dos ex-presidentes democratas presentes, Bill Clinton, Jimmy Carter e o que passava o bastão para Trump, Barack Obama. Mas foi inclemente contra o líder do partido no Seo nado, Chuck Schumer, bastante vaiado.
Trump, por sua vez, surpreendeu e, no almoço no Capitólio, pediu uma salva de palmas a Hillary Clinton, sua oponente na eleição — presente no evento por causa de seu marido, o ex-presidente Bill Clinton. Meios de comunicação americanos, contudo, notaram um semblante extremante fechado de Michelle Obama, após o discurso agressivo de Trump. O presidente cumpriu todo o formalismo da posse, inclusive o desfile até a Casa Branca, fazendo parte do trecho a pé.
E ele já começou a governar. Assinou algumas de suas primeiras medidas. Além de criar o “Dia do Patriotismo”, preencher alguns cargos vagos e autorizar posses de secretários, o novo presidente indicou que que irá desenvolver um sistema de mísseis contra ameaças da Coreia do Norte e do Irã.
As medidas foram publicadas ontem mesmo na página da Casa Branca. O plano ambiental será substituído por um energético, para explorar todas as potencialidades dos EUA — Obama era contra o uso de combustíveis fósseis, e Trump deve rever suas proibições no setor, além de ter ameaçado tirar os EUA do acordo climático de Paris. Em outra medida prática, o Senado confirmou os nomes de James Mattis como secretário de Defesa e de John Kelly como secretário de Segurança Interna.
O presidente deve assinar mais medidas hoje, mas seu primeiro dia sem festas oficiais — haverá apenas um ato ecumênico na Catedral de Washington pela manhã — tende a ser novamente ofuscado por protestos: a marcha das Mulheres espera levar 200 mil pessoas para a capital. Se Trump assumiu com uma mensagem agressiva, seus detratores não devem deixar seu governo passar em branco.
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