- Folha de S. Paulo
Decisão do Supremo reduz de modo desequilibrado a conta de impostos de certas empresas
A maioria dos ministros do Supremo decidiu que o governo vai deixar de arrecadar uns muitos bilhões de reais em impostos, em benefício de grandes empresas. Pelo menos R$ 10 bilhões por ano, talvez até R$ 16 bilhões.
Foi nesta quinta-feira (25), em decisão que beneficiou firmas que fazem (ou farão ainda mais) negócios com a Zona Franca de Manaus, um processo que rolava desde 2008.
De onde vai sair o dinheiro? Ninguém sabe ainda, mas o governo federal terá de fazer mágicas e milagres sinistros.
A alternativa é mudar parte da lei de impostos sobre produtos da Zona Franca, o que é sempre uma guerra que mobiliza de políticos do Amazonas e do Norte a empresas do Sudeste e do Sul.
Não vai rolar, pois o governo terá de mendigar votos pela reforma previdenciária, não deve arrumar mais briga. Logo, vai haver corte.
Onde, repita-se?
Por exemplo, no ano passado, todo o investimento federal em obras viárias (estradas etc.) foi de pouco mais de R$ 10 bilhões. Neste ano, deve ser ainda menos.
Ou seja, a fim de pagar de uma talagada a graça ofertada pelo Supremo, seria necessário na prática fechar o Ministério dos Transportes ou enormidade equivalente, como cortar o dinheiro do Bolsa Família pela metade.
Noutro exemplo, a graça tributária decretada pelo Supremo levaria um pedação do esforço de contenção de gastos da Previdência.
Caso a reforma seja aprovada sem modificações, o governo estima que deixaria de gastar R$ 174 bilhões com aposentadorias “do INSS” nos primeiros cinco anos de vigência da mudança (para ser preciso, com despesas do Regime Geral de Previdência Social, o que não inclui servidores). A decisão do Supremo, pois, no limite vai custar o equivalente a 46% dessa economia suada em meia década.
A decisão do STF é um caso enrolado, não cabe aqui e agora nestas colunas. Mas, em suma, empresas que compram insumos na Zona Franca de Manaus terão direito a um desconto de imposto que apenas faz sentido no mundo do malabarismo jurídico.
Além de fazer mais um buraco no cofre furado e vazio do governo, a medida tende a causar outras distorções e consequências impremeditadas.
Empresas que conseguirão grandes descontos de impostos, por assim dizer, com a decisão do Supremo, podem passar a comprar apenas insumos básicos na Zona Franca, deixando a produção mais complexa em uma fábrica de outra região do país. Manaus ficaria com a produção rudimentar.
Há mais. Em tese, as empresas que mais se beneficiam da medida são aquelas com cadeias de produção mais complexa e têm a capacidade e a organização de manter fornecedores distantes. Parece a descrição de uma empresa grande ou já bem estabelecida na praça, certo?
Essas reduções de impostos, de resto, criam distorções menos visíveis, mas daninhas. Uma empresa mais eficiente (que faz por menos e/ou com mais qualidade) é prejudicada pela concorrência da firma que paga menos impostos.
O monte de tributações especiais do Brasil causa várias outras distorções, que também não cabem aqui e agora nestas colunas, mas são motivos sérios de ineficiência econômica e transferências injustificáveis de renda.
O Supremo acaba de criar um novo capítulo no imenso compêndio nacional de demências e iniquidades tributárias. De quebra, arruinou ainda mais um governo que em breve não terá como pagar contas básicas, embora os salários do Judiciário estejam garantidos. Né.
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