- O Globo
O presidente da Câmara está tratando a votação da reforma da Previdência como oportunidade de os deputados se pacificarem com a opinião pública
O presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, parece estar numa cruzada pessoal para resgatar a credibilidade da Câmara dos Deputados, ao transformar a aprovação da reforma da Previdência em um assunto de Estado, e não do governo Bolsonaro.
Lembrou que desde o governo do ex-presidente Fernando Henrique se tenta reformar a Previdência, uma pauta que deixou de ter coloração política. Foi o que fez questão de revelar na entrevista na noite de quarta-feira à Central GloboNews, onde manteve tom firme e fluência de pensamento que demonstram estar convencido do que defende.
Com isso, ele mantém também uma saudável distância de um governo do qual discorda em vários aspectos, mas reafirma seu apoio ao ministro da Economia, Paulo Guedes, com quem dialoga muito bem em termos econômicos e pessoais.
De Bolsonaro, diz que não tem relação pessoal, e nem está interessado em ter, pois isto não é relevante para seu trabalho à frente da Câmara. É uma maneira cautelosa de agir, pois mostra-se incomodado com a insistência do governo em passar a ideia de que Bolsonaro está lutando contra os parlamentares para não aceitar um sistema fisiológico de trocas de favores por votos, coisa que Maia garante que não está havendo.
O presidente da Comissão Especial anunciado ontem, deputado Marcelo Ramos, do PR, já deu o tom, afirmando que os deputados têm que ter responsabilidade com o país, mas que o Parlamento tem que ser respeitado. E já reclamou de Bolsonaro, que ontem disse que a reforma mínima tem de cortar pelo menos R$ 800 bilhões. “Cada vez que o presidente fala, reduz o corte”, disse ele, ressaltando que a proposta de Guedes prevê uma economia de R$ 1,2 bilhão.
O aumento dos componentes da Comissão, de 34 para 49 membros, está dentro dessa estratégia de Rodrigo Maia de dar representatividade à comissão, mesmo que isso torne os trabalhos mais lentos, aumentando o prazo para a discussão, já que haverá mais deputados envolvidos.
Mas ele queria que todos os partidos estivessem representados, para que a decisão que sair da Comissão seja uma direção para o plenário, que votará em seguida. Dar mais pluralidade à Comissão significa maior credibilidade à decisão final, que representará a diversidade da Câmara.
Na entrevista à GloboNews, Maia insistiu em que não é errado que os deputados e senadores possam indicar técnicos para cargos do governo, desde que tenham capacitação para eles, e não sejam pretexto para atuações não republicanas.
Lembrou os vários militares que ocupam cargos no governo Bolsonaro, muitos deles generais e almirantes, sem que se diga que há interesses indevidos da corporação.
Maia insistiu que o governo não pode criminalizar todo tipo de indicação política. “Não se pode transformar a participação de um partido no governo em um crime, que não é.” Maia acha, no entanto, que o mais correto seria que o governo apresentasse aos partidos um programa para que aderissem, formando uma base partidária forjada em projetos comuns.
Mas questiona a agenda do governo Bolsonaro. Também na entrevista à GloboNews, Rodrigo Maia destacou que o DEM, embora tenha três ministros, não faz parte do governo. Ele explicou: “Por quê? Porque a gente não sabe ainda qual é essa agenda do governo para que a gente possa ter clareza de dizer ‘quero fazer parte’. Qual é a agenda do governo? Eu pergunto qual é a agenda do governo para a educação? Eu não sei qual é até o momento. Ninguém sabe. Qual é a agenda do governo nas relações internacionais? É um desastre.”
Rodrigo Maia, como presidente da Câmara dos Deputados, está correto em se empenhar pessoalmente na tramitação da reforma da Previdência, pois depende dele o encaminhamento dos estudos e das comissões, e se ele estiver convencido de que é um programa de Estado e não de governo, tem toda razão de assumir o protagonismo para tentar convencer seus companheiros a votar a favor.
O presidente da Câmara está tratando a votação da reforma da Previdência como uma oportunidade de os deputados se pacificarem com a opinião pública. É contraditório, porque o assunto não é popular, mas os deputados que votarem a favor estarão sinalizando que votam sem interesses imediatistas. Ele tenta dar uma dimensão institucional à Câmara, que no final vai melhorar a imagem da Casa.
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