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O Globo
A
biografia do capitão Jair Messias Bolsonaro feita do CEPEDOC da Fundação
Getúlio Vargas é uma exemplar sucessão de fatos que o levaram à presidência da
República devido à leniência com que foi tratado, tanto no Exército quanto no
Congresso, onde atuou como deputado federal por 27 anos. Coerente com suas
idéias corporativas, e politicamente radical, não teve quem o parasse. Que
sirva de lição para os dias de hoje.
Alguns exemplos: em 1986, capitão no 8º Grupo de Artilharia de
Campanha, foi preso por ter escrito na revista Veja artigo intitulado “O
salário está baixo”. Em 1987, uma reportagem da mesma Veja revelou um
plano para uma “Operação beco sem saída”, com o objetivo de
“explodir bombas em várias unidades da Vila Militar, da Academia Militar das
Agulhas Negras (...) e em vários quartéis”. A operação só sairia do papel se o
reajuste concedido aos militares ficasse abaixo de 60%.
Atribuído a Bolsonaro e ao capitão Fábio Passos da Silva, o plano irritou o
ministro do Exército, General Leônidas Pires Gonçalves, que convocou os
capitães para explicações. Os dois “negaram peremptoriamente, da maneira mais
veemente, por escrito, do próprio punho, qualquer veracidade daquela
informação”, segundo declaração do próprio general Leônidas.
Mais tarde, porém, testemunhas e provas documentais, como um croqui desenhado
pelo próprio Bolsonaro, levou o ministro a se convencer que errara ao inocentar
os dois capitães. O resultado de uma sindicância foi enviado ao Superior
Tribunal Militar (STM) com pedido de exclusão das Forças Armadas dos dois
capitães, o que não foi aceito. Os juízes, por maioria, acataram a defesa dos
militares que “se consideravam vítimas de um processo viciado”. Bolsonaro
foi para a reserva em 1988, mesmo tendo sido absolvido.
Não foi apenas o General Geisel que o considerou “um mau soldado”. O Coronel
Carlos Alfredo Pellegrino, em relatório, disse que Bolsonaro tentava liderar
oficiais subalternos, mas não conseguia pela “falta de lógica, racionalidade e
equilíbrio na apresentação de seus argumentos”. No julgamento do STM, foi
acusado de ter “grave desvio de personalidade”. Em 1991, no primeiro de seus
mandatos de deputado federal, defendeu o retorno do regime de exceção, e o
fechamento temporário do Congresso Nacional. Para ele, muitas leis atrapalhavam
o exercício do poder e que, “num regime de exceção, o chefe, que não precisa
ser um militar, pega uma caneta e risca a lei que está atrapalhando”.
O pronunciamento levou o corregedor do Congresso Nacional, deputado Vital
do Rego, a solicitar ao procurador-geral da República, Aristides
Junqueira, o início de uma ação penal contra Bolsonaro por crime contra a
segurança nacional, ofensa à Constituição e ao regimento interno da Câmara.
Em1994 afirmou preferir “sobreviver no regime militar a morrer nesta
democracia”.
Sustentando que Bolsonaro havia sido desrespeitoso com o ministro da
Administração, Luis Carlos Bresser Pereira, durante depoimento na Comissão de
Trabalho, o deputado gaúcho Osvaldo Biochi, do Partido Trabalhista Brasileiro
(PTB), solicitou sua cassação, mas o máximo que aconteceu foi uma advertência.
Assumiu seu novo mandato na Câmara em fevereiro de 1999 e, em junho, a Mesa
Diretora da Câmara propôs ao plenário sua suspensão por um mês, por ter defendido
o fechamento do Congresso e afirmado que “a situação do país seria melhor se a
ditadura tivesse matado mais gente”, incluindo o presidente da República,
Fernando Henrique Cardoso. A Mesa Diretora havia optado por apenas censurá-lo,
após ter recebido uma retratação, mas voltou atrás quando Bolsonaro não
reconheceu a retratação, afirmando que sua assinatura havia sido falsificada.
No entanto, a proposta nunca chegou a ser votada pelo plenário da Câmara.
Em dezembro, voltou a defender o fuzilamento do presidente Fernando Henrique
Cardoso. O líder do governo na Câmara, Artur Virgílio, do PSDB, chegou a pedir
sua cassação, mas a proposta nunca chegou ao plenário da Casa. Ao votar em
abril de 2016 a favor do impeachment da então presidente Dilma Rousseff, Bolsonaro
fez uma homenagem ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, identificado como
torturador. Foi denunciado ao Conselho de Ética da Câmara, por apologia à
tortura, mas nada aconteceu.
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