Wilson Figueiredo
DEU NO JORNAL DO BRASIL
Por onde quer que passe, bafejado pelas pesquisas que o acompanham com fidelidade canina, o presidente Lula da Silva aproveita, como diria o Chacrinha, para se comunicar. Mas dispensa, intransitivamente, objeto seja direto ou indireto. Na Guatemala a segunda natureza presidencial prevaleceu ao se proclamar, aos jornalistas que cobriram a viagem , “muito feliz” com a lembrança de que os brasileiros favoráveis ao seu terceiro mandato já estão quase empatando com os que não concordam com a fórmula suspeita de levar a democracia ao que em bom Português se denomina beco sem saída. A palavra final se reservaria ao plebiscito, que não é flor da democracia.
O presidente rumina a questão do mandato que as pesquisas lhe oferecem de mão beijada, mas desconfia que a liberdade não sobreviveria sem alternância política. Pena que não tire proveito político das suas três derrotas (duas das quais Fernando Henrique lhe ficou devendo e uma para Fernando Collor), como investimento histórico, sem retorno imediato na próxima sucessão, ainda com jeito de que pode ser desviada das urnas.
Antes de chegar à metade, o segundo mandato de Lula já se mostrava incapaz de encher os olhos dos cidadãos com grandes projetos e, por tabela, as contas bancárias dos empreiteiros, sem contabilizar as sobras que abastecem por fora, cada vez mais, a atividade política. O efeito social ofusca a visão objetiva do eleitor e favorece a Lula a oportunidade de desembarcar do terceiro mandato, sem fechar a porta ao assunto. A massa de manobra sindical e a disponibilidade política estudantil estão de prontidão para socorrê-lo em caso de necessidade. Mas, como ele mesmo ressalva, só é candidato a ex-presidente. Por ora, nada mais. Se o terceiro fosse encaixado numa visão folgada de democracia, poderia reconsiderar. Não sendo legal, não lhe interessa. Se vier a ser, pensará de outro ponto de vista.
Lula sempre volta inspirado das viagens ao exterior. Os jornalistas que o seguem também o perseguem com as mesmas perguntas. É que o terceiro mandato está para Lula como o Terceiro Estado esteve para seu teórico, o abade Sieyès, que garantiu, na Revolução Francesa em 1789, um lugar no céu para a burguesia. Lula não é dado a teorias, voa baixo, de olho na terra, sem precisar de mapas. Desta vez devolveu a bola redondinha aos repórteres quando sustentou, em tom política e aparentemente correto, que a imprensa “fortalece a democracia quando se contenta em informar os fatos; não criá-los”. Era só o que faltava. Quando ela se faz “porta-voz de um pensamento político”, arrematou, “a liberdade de imprensa está arranhada”. Quem se considera arranhado é sempre o governo. O que está oculto e parece novo é o mais antigo preconceito contra a liberdade de imprensa numa questão inseparável da democracia. Trata-se de censura. Explicita-se a tentação compensatória de interditar ao jornalismo posições políticas. Deve ter ocorrido a Lula (entre outras) a perda do sentido da frase que burlou a vigilância presidencial adormecida sob os louros do sucesso, e se explicitou por descuido ou... falta de censura.
Arranhada sairá, isto sim, a liberdade de imprensa se a área de informação dos jornais não puder separar – tanto quanto possível _ o que é notícia e o que é opinião ao servir, com clareza, uma e outra aos leitores. De que maneira a opinião dos jornais violaria a liberdade de imprensa? Que fosse mais claro o presidente. Quando começa por ai, a censura não demora a tirar a máscara, e qualquer opinião emitida pelos cidadãos, ainda que oralmente, arranhará governantes e representantes. São comprovadamente inseparáveis a liberdade de imprensa e a democracia, que não se limitam ao papel impresso e à retórica. Fazer reparo à liberdade de informar e opinar sempre reforça a suspeita de acobertar intenções trogloditas.
O presidente Lula fica devendo o raciocínio completo em torno da nova dieta para negar à imprensa o direito de ter, externar e assumir pensamento político aplicado à realidade. O jornalismo não lida apenas com teorias, mas com fatos e homens que se apresentam, em nome de idéias, com propostas que dizem respeito não apenas à política. Está demorando a chegar o dia em que Lula perceberá que nenhuma outra atividade humana substitui a imprensa na função de esclarecer a mente humana como um painel eletrônico capaz de mantê-lo civicamente alerta.
DEU NO JORNAL DO BRASIL
Por onde quer que passe, bafejado pelas pesquisas que o acompanham com fidelidade canina, o presidente Lula da Silva aproveita, como diria o Chacrinha, para se comunicar. Mas dispensa, intransitivamente, objeto seja direto ou indireto. Na Guatemala a segunda natureza presidencial prevaleceu ao se proclamar, aos jornalistas que cobriram a viagem , “muito feliz” com a lembrança de que os brasileiros favoráveis ao seu terceiro mandato já estão quase empatando com os que não concordam com a fórmula suspeita de levar a democracia ao que em bom Português se denomina beco sem saída. A palavra final se reservaria ao plebiscito, que não é flor da democracia.
O presidente rumina a questão do mandato que as pesquisas lhe oferecem de mão beijada, mas desconfia que a liberdade não sobreviveria sem alternância política. Pena que não tire proveito político das suas três derrotas (duas das quais Fernando Henrique lhe ficou devendo e uma para Fernando Collor), como investimento histórico, sem retorno imediato na próxima sucessão, ainda com jeito de que pode ser desviada das urnas.
Antes de chegar à metade, o segundo mandato de Lula já se mostrava incapaz de encher os olhos dos cidadãos com grandes projetos e, por tabela, as contas bancárias dos empreiteiros, sem contabilizar as sobras que abastecem por fora, cada vez mais, a atividade política. O efeito social ofusca a visão objetiva do eleitor e favorece a Lula a oportunidade de desembarcar do terceiro mandato, sem fechar a porta ao assunto. A massa de manobra sindical e a disponibilidade política estudantil estão de prontidão para socorrê-lo em caso de necessidade. Mas, como ele mesmo ressalva, só é candidato a ex-presidente. Por ora, nada mais. Se o terceiro fosse encaixado numa visão folgada de democracia, poderia reconsiderar. Não sendo legal, não lhe interessa. Se vier a ser, pensará de outro ponto de vista.
Lula sempre volta inspirado das viagens ao exterior. Os jornalistas que o seguem também o perseguem com as mesmas perguntas. É que o terceiro mandato está para Lula como o Terceiro Estado esteve para seu teórico, o abade Sieyès, que garantiu, na Revolução Francesa em 1789, um lugar no céu para a burguesia. Lula não é dado a teorias, voa baixo, de olho na terra, sem precisar de mapas. Desta vez devolveu a bola redondinha aos repórteres quando sustentou, em tom política e aparentemente correto, que a imprensa “fortalece a democracia quando se contenta em informar os fatos; não criá-los”. Era só o que faltava. Quando ela se faz “porta-voz de um pensamento político”, arrematou, “a liberdade de imprensa está arranhada”. Quem se considera arranhado é sempre o governo. O que está oculto e parece novo é o mais antigo preconceito contra a liberdade de imprensa numa questão inseparável da democracia. Trata-se de censura. Explicita-se a tentação compensatória de interditar ao jornalismo posições políticas. Deve ter ocorrido a Lula (entre outras) a perda do sentido da frase que burlou a vigilância presidencial adormecida sob os louros do sucesso, e se explicitou por descuido ou... falta de censura.
Arranhada sairá, isto sim, a liberdade de imprensa se a área de informação dos jornais não puder separar – tanto quanto possível _ o que é notícia e o que é opinião ao servir, com clareza, uma e outra aos leitores. De que maneira a opinião dos jornais violaria a liberdade de imprensa? Que fosse mais claro o presidente. Quando começa por ai, a censura não demora a tirar a máscara, e qualquer opinião emitida pelos cidadãos, ainda que oralmente, arranhará governantes e representantes. São comprovadamente inseparáveis a liberdade de imprensa e a democracia, que não se limitam ao papel impresso e à retórica. Fazer reparo à liberdade de informar e opinar sempre reforça a suspeita de acobertar intenções trogloditas.
O presidente Lula fica devendo o raciocínio completo em torno da nova dieta para negar à imprensa o direito de ter, externar e assumir pensamento político aplicado à realidade. O jornalismo não lida apenas com teorias, mas com fatos e homens que se apresentam, em nome de idéias, com propostas que dizem respeito não apenas à política. Está demorando a chegar o dia em que Lula perceberá que nenhuma outra atividade humana substitui a imprensa na função de esclarecer a mente humana como um painel eletrônico capaz de mantê-lo civicamente alerta.
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