• Aécio alerta que negação dos partidos pode gerar insegurança no futuro do país e reforça que não há saída fora deles
Ivo Gonzalez – O Globo
Nas duas horas em que respondeu a perguntas de colunistas do GLOBO, o candidato do PSDB à Presidência, Aécio Neves, buscou apresentar a imagem de um político realista. Ele evitou imagens de efeito num discurso pragmático, mas, sobretudo, reivindicou a condição de um agente da política. O tucano abusou do gestual, como se tentasse convencer os colunistas e a plateia de que, mesmo com a desilusão dos brasileiros com os partidos, não vê saída fora deles. E, sempre nesse ponto, marcava o que considera sua diferença em relação a Marina Silva (PSB), objeto de suas argumentações tanto quanto a presidente Dilma Rousseff (PT).
Mesmo quando a sabatina acabou, Aécio seguiu sua defesa da política. Numa rápida entrevista, alertou que a "negação dos partidos" pode gerar insegurança no futuro do país. E foi taxativo sobre sua disposição de seguir a campanha até o fim, mesmo com terceiro lugar nas pesquisas.
- O PSDB tem duas alternativas: ganhar e virar governo ou perder e virar oposição - afirmou, deixando no ar dúvidas sobre como agirá no segundo turno, apesar de ter frisado na sabatina que líder político "tem que ter posição".
Na saída apressada para embarcar, no Aeroporto Santos Dumont, em um helicóptero que o levaria a um compromisso de campanha em Campo Grande, na Zona Oeste da cidade, Aécio disse ao GLOBO que tenta combater a tendência de voto útil que identifica por trás de sua queda nas pesquisas.
- Tem o voto da comoção (pela morte de Eduardo Campos) e o da derrota. Ela (Marina) aparece como quem pode derrotar a Dilma. O nosso voto que migrou para a Marina foi porque ela apareceu como quem pode derrotar o PT. Qual é o meu papel? Mostrar a consistência do nosso projeto.
Tão apressado como saiu, Aécio chegou ao Museu de Arte do Rio (MAR) em cima da hora marcada para o início do evento, que começou atrasado alguns minutos. O exército de profissionais de comunicação que o acompanha chegou mais cedo. Havia fotógrafo, cinegrafista, repórteres de texto e de rádio e até uma pessoa só para alimentar as redes sociais. Na companhia do candidato, ainda outros três jornalistas que o assessoram mais de perto. Eles contaram que Aécio engatara uma conversa em casa, em Ipanema, com o senador Francisco Dornelles (PP-RJ), que o acompanhava na sabatina, e acabou surpreendido por um engarrafamento no Centro. Mesmo atrasado, Aécio saiu do elevador sem acelerar o passo, acompanhando o ritmo mais lento do senador. Na sala reservada aos candidatos, passou direto pelo café e pela mesa de doces e frutas. Dornelles, não. Foi direito a uma bandeja de bolo, que elogiou para a copeira.
Apesar de presidir o diretório fluminense do PP, partido da coligação de Dilma Rousseff (PT) cujo presidente, senador Ciro Nogueira, é um dos citados no escândalo da Petrobras, Dornelles faz campanha no Rio para Aécio, de quem é primo. Durante a sabatina, o senador, vice na chapa de reeleição de Luiz Fernando Pezão (PMDB), parecia concordar com os ataques do tucano ao PT com leves movimentos afirmativos de cabeça. Aécio mencionou Dornelles pelo menos duas vezes, assim como o deputado federal Otávio Leite (PSDB-RJ), também na plateia. Várias vezes o tucano sustentou propostas citando projetos de aliados no Congresso, em mais um dos vários sinais que buscou emitir em favor da mediação política.
Herdeiro da tradição política
Não poderia ser diferente para o neto de Tancredo Neves. Aécio experimentou a política como secretário do avô, artífice da redemocratização negociada na década de 80. Aos 54 anos, sustenta um personagem político construído na arena do Congresso. Foi eleito deputado constituinte em 1986 e, em 2001, presidente da Câmara. Governador de Minas por duas vezes, voltou a Brasília como senador para, de lá, lançar seu projeto presidencial. No entanto, citou o "doutor Tancredo" apenas uma vez na sabatina, como um "retrato na parede" da família e da História.
Antes de entrar no auditório, Aécio demonstrou quase nenhuma vaidade. Vestido entre a descontração de uma calça de brim e sapato marrom e a formalidade de um blazer azul marinho sobre a camisa branca de punhos fechados por abotoaduras prateadas, ele só deu uma paradinha atrás da cortina para ajeitar o cabelo antes de entrar em cena. Instalado na cadeira principal do auditório, fazia pequenos acenos com as mãos ao reconhecer aliados na plateia no início da transmissão pela internet. No entanto, olhou pouco para o público no decorrer da sabatina. Também parecia evitar os interlocutores na hora de responder às perguntas. Em muitas vezes, procurou falar para as câmeras. Em outras, falava olhando para baixo, como se mirasse um ponto fixo imaginário no chão, o que seus assessores na plateia também notaram com alguma aflição.
Aécio passou todo o tempo alternando as pernas cruzadas, balançando a que estava suspensa quando parecia mais tenso. Muitas vezes, erguia a ponta do único pé no chão, equilibrando-se apenas no calcanhar. Recorrentemente, deslisava uma das mãos na perna e apertava o joelho. Nas respostas, fazia desenhos no ar para explicar propostas, muitas vezes com o dedo indicador em riste como se ensinasse, didático, algo que gostaria de marcar na memória de quem o ouve. Foi assim quando frisou que o acordo com o FMI no final do governo FH teve o aval de Lula e quando repetiu ver oposição entre boa e má política, não entre nova e velha. Antes de enumerar dados, olhava para cima, como se acessasse um disco rígido na cabeça, e começava sempre levantando o polegar.
Essa tentativa de explicar muito tudo o que quer dizer fez com que o tucano esticasse as respostas. Como um político clássico, Aécio gosta de falar. Quando dava voltas, avisava ao autor da pergunta que logo chegaria à essência ou então se desculpava pela "introdução". Ao perceber que seria interrompido, apressava a fala, já naturalmente acelerada, para tentar completar. Advertido de que deveria ser mais objetivo, não gostou muito, mas respirou fundo, abriu um sorriso e prometeu tentar.
A pergunta sobre seu desempenho em Minas, onde está em terceiro lugar nas pesquisas, pareceu ser a que mais mexeu emocionalmente com ele. Como se quisesse contagiar os presentes, repetiu várias vezes que estava "muito animado" para ir até o final da campanha.
- Respondi tudo. Houve indagações duras, mas feitas de forma respeitosa - avaliou, após a sabatina, comprometendo-se com a liberdade de imprensa. - Temos que conviver com a crítica.
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