Favorito nas urnas em novembro, o candidato democrata pretende ser o oposto de Trump em tudo
Em pouco mais de dois meses, quando os americanos forem às urnas, o mundo poderá ser outro. É essa a promessa de Joe Biden, sagrado candidato pelo Partido Democrata à Presidência dos Estados Unidos. Seu recado ao eleitorado na convenção partidária foi cristalino: “Se vocês me confiarem a presidência, tirarei o melhor de nós, não o pior. Serei um aliado da luz, não das trevas”. No plano das palavras e das ideias, ele não poderia ter sido mais eloquente. No plano da realidade, para desfazer o retrocesso da gestão Donald Trump, Biden precisa primeiro vencer — e isso não está garantido. Mas é favorito, sobretudo porque reuniu uma coalizão eclética em torno de um objetivo comum: tirar Trump da Casa Branca.
Nas primárias, Biden chegou a ser dado como derrotado, mas, depois de demonstrar força com o eleitorado negro na Carolina do Sul, ressurgiu como candidato de consenso. Obteve apoio de todas as correntes no partido — do socialista Bernie Sanders ao capitalista Michael Bloomberg. Na convenção, o sentimento anti-Trump trouxe para baixo de sua tenda uma legião de republicanos insatisfeitos. Tal sentimento só cresceu com a pandemia e o movimento antirracista. Para todos aqueles que se reuniram em torno dele, Biden promete, na essência, ser o oposto de Trump em tudo.
Ou quase. Difícil acreditar que, num eventual governo Biden, diminuam as tensões com a China na disputa pela tecnologia 5G. Mesmo assim, é concreta a perspectiva de distensão na guerra comercial (notícia que pode decepcionar o agronegócio brasileiro). Mais que isso, Biden traria ímpeto renovado à aliança atlântica, entre Estados Unidos e União Europeia, em detrimento da aproximação de Trump com autocratas da estirpe do russo Vladimir Putin. O impacto disso na geopolítica internacional seria gigantesco.
Iniciativas do governo Obama abandonadas, como o acordo nuclear com o Irã ou o tratado climático de Paris, ganhariam novo impulso. Até o novo coronavírus, que encontrou nos Estados Unidos seu habitat mais hospitaleiro, passaria a ter na Casa Branca um inimigo feroz, em vez de um aliado. Uma gestão Biden ameaçaria ainda o ideário nacional-populista no mundo todo, em particular no Brasil de Jair Bolsonaro — admirador e imitador de Trump.
O aparelhamento ideológico do Itamaraty no governo Bolsonaro deixou nossa diplomacia manca para enfrentar uma eventual vitória democrata. De um lado, o Brasil procura alinhar quase todas as suas decisões aos interesses dos Estados Unidos. De outro, tornou-se crítico de tudo o que preconizam democratas como Biden. Como o país resolveria tal contradição ainda é uma incógnita.
Seja como for, não parece haver adjetivo para qualificar o significado, para o planeta, de uma mudança na Casa Branca. Num ano que já trouxe uma pandemia global, incêndios na Amazônia, enchentes e deslizamentos no litoral, explosão no Líbano, nuvem de gafanhotos na Argentina, tornados e até neve no Sul do país, é natural desejar um outro mundo em 2021.
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