O Estado de S. Paulo
Bolsonaro, vacinas e simbiose com Centrão tragam militares para o olho do furacão
Há muitas suspeitas sobre a entrada em cena
e a dubiedade do policial militar Luiz Paulo Dominghetti, que, de santo, não
tem nada, mas uma coisa fica absolutamente clara: a simbiose entre militares e
Centrão, particularmente no Ministério da Saúde, em meio a uma pandemia
devastadora, joga o Exército e as próprias Forças Armadas, desnecessariamente,
no meio do furacão.
Em meio a tantos picaretas, ou nomes
duvidosos, como Roberto Dias, Francisco Maximiano, Luiz Miranda, o próprio
Dominghetti e seu mentor “Cristiano”, lá estão, ora na CPI, ora na mídia,
oficiais como Marcelo Blanco, Alexandre Martinelli e Roberto Criscioli, além de
Eduardo Pazuello (da ativa) e Elcio Franco. Tenham ou não o que esconder, seria
muito melhor para as Forças Armadas e o País que eles estivessem a léguas de
distância de tudo isso.
Dominghetti conseguiu uma verdadeira
façanha, ontem, na CPI: ser pressionado por todos os lados. Pelos governistas,
por ter reafirmado o pedido de propina de US$ 1 por dose de vacina, que lhe
teria sido feito por Roberto Dias. Pela oposição e pelos independentes, por ter
usado o depoimento para plantar um áudio e tentar desqualificar o deputado Luis
Miranda, que detonou o esquema da Covaxin e jogou a bomba no colo do próprio
Bolsonaro.
Num enredo de filme de espionagem, Dominghetti foi apenas usado contra Miranda, ou é parte de uma sofisticada ação de contrainformação de uma espécie de “Abin paralela”? A dúvida é justa, até pelas origens dele: policial militar, bolsonarista, com coleção de processos e contatos na capital da República. Pau para toda obra. E ele não parece idiota e se expressa bem.
Para o senador e ex-delegado Alessandro
Vieira (Cidadania-SE), Dominghetti foi apenas usado para detonar Luis Miranda.
Não foi uma ação de inteligência, mas de “quem se acha muito esperto”, e
resumiu: “uma operação Uruguai, ou Tabajara”, numa referência à patetada para
livrar Fernando Collor do impeachment.
O marco dessa nova fase da CPI foi a
Covaxin, pois é muito suspeito o governo atacar a Coronavac, desprezar a Pfizer
e acertar o lote mínimo da Covax Facility, mas sair em desabalada carreira para
fechar negócio com a Covaxin com nota fiscal para uma offshore em paraíso
fiscal. E jogou luzes sobre o Departamento de Logística do Ministério da Saúde,
dirigido por Roberto Dias.
A Covaxin foi o fio do novelo, puxando as
histórias da Davati, da Sputnik e da Convidecia, da China, com o mesmo enredo:
vacinas não reconhecidas pela Anvisa, com preços exorbitantes e representantes
esquisitões no Brasil. Dias é acusado de pressionar subordinados para fechar
rapidinho, e a qualquer custo, com a Covaxin e de pedir bilhões de reais em
propina a Dominghetti e à Davati.
Com tantas vacinas, empresas, nomes, a CPI
inverteu a pauta para ouvir o tal Dominghetti, policial militar da ativa em
Minas que arranja tempo para sair oferecendo vacinas por aí, ser representante
“informal” de uma empresa americana e ser alvo de dezenas de processos, por dar
canos em aluguéis e compras de carros ou por indisciplina.
E a Davati também tem muito a explicar.
Quer vender 400 milhões de doses, mas seu portfólio nem sequer cita vacinas e
oferecia a AstraZeneca, que só negocia diretamente com governos e entidades
oficiais e já tinha, inclusive, acordo com o Brasil, via Fiocruz.
O Planalto comemorou cedo demais o “desmanche” duplo, de Miranda e do próprio Dominghetti. Se a “Operação Uruguai” foi um fracasso para salvar o pescoço de Collor em 1992, imaginem hoje, com internet, tempo real, quebra de sigilo telemático... Se o governo estava frito antes do depoimento de Dominghetti, continua frito depois. E tragando militares para a frigideira.
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