DEU NA FOLHA DE S. PAULO
Uma alternativa é financiar o aumento dos gastos do Estado nos países ricos com impostos adicionais e progressivos
Nos países ricos -nos EUA, na União Europeia, no Japão-, a recuperação depois da crise financeira global de 2008 é lenta e insuficiente. O desemprego continua crescendo e já está em torno de 10% da população economicamente ativa. Apenas as Bolsas se recuperaram; mas isso não decorreu da melhoria da economia real, e sim do fato que os bancos centrais baixaram os juros e inundaram seus países de liquidez.
Dessa forma, essa recuperação é antes causa de preocupação do que de alegria, porque indica novas bolhas especulativas.
A causa desse mau desempenho está no lado da demanda. As empresas desempregam porque não têm para quem vender. Internamente não há fonte de demanda porque as famílias e as empresas estão pagando suas dívidas para recuperar sua solvência. No plano externo, também não há demanda entre os países ricos, porque aqueles que se endividaram (EUA, Espanha e Irlanda, principalmente) precisam pôr em ordem suas contas.
Diante da crise, a solução adotada por todos os países foi uma política fiscal expansionista que evitou o caos econômico. Mas os gastos fiscais não lograram promover uma recuperação sustentada das economias por duas razões: primeiro porque uma parte desse gasto se traduziu em isenção de impostos para os ricos -um tipo de política com baixo efeito multiplicador; segundo porque mesmo os gastos em investimentos não sinalizaram para os investidores privados perspectiva de crescimento sustentado da demanda, mas apenas aumento "once and for all" da demanda.
Que fazer alternativamente? Economistas como Martin Wolf pedem que os países de renda média aumentem suas importações, mas isso já está acontecendo. Como esses países foram menos atingidos pela crise exatamente porque estavam menos endividados, eles já voltaram a crescer de maneira satisfatória e, em consequência, voltaram a aumentar suas importações. O desempenho relativamente bom do Japão no último trimestre, por exemplo, deveu-se principalmente às importações da China.
Não resta, portanto, alternativa para os países ricos senão manter provisoriamente a política fiscal expansionista, até porque ela está sob seu controle. Mas essa política que envolveu deficit públicos perto de 10% do PIB não pode ser simplesmente continuada. A dívida pública dos países ricos tornou-se altíssima: a do Japão já alcança 226% do PIB, a dos EUA, 99,8%, a da França, 92,5%.
Que fazer então? Uma alternativa é financiar o aumento dos gastos do Estado que tenham efeitos multiplicadores criando demanda e emprego e financiá-los com impostos adicionais e progressivos sobre os ricos -sobre aqueles cuja propensão marginal a consumir é relativamente baixa. Dessa forma, o aumento da poupança privada não neutralizará a expansão do gasto público.
Quando escrevi a primeira versão deste artigo, na semana passada, pensei que estava propondo algo arrojado. Mas descobri em seguida que estava "descobrindo a América" pela segunda vez... Não obstante estar em campanha eleitoral, o governo britânico de Gordon Brown já promoveu o aumento do Imposto de Renda progressivo marginal de 40% para 50%. Mais cedo ou mais tarde essa política terá que ser considerada pelos demais países ricos. Nos 30 Anos Gloriosos do Capitalismo (1949-1978), o Imposto de Renda marginal chegou a alcançar 90%. Foi reduzido nos 30 Anos Neoliberais do Capitalismo. Voltará, agora, a ser elevado não apenas por uma questão de justiça mas também de lógica econômica.
Luiz Carlos Bresser-Pereira, 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Globalização e Competição".
Uma alternativa é financiar o aumento dos gastos do Estado nos países ricos com impostos adicionais e progressivos
Nos países ricos -nos EUA, na União Europeia, no Japão-, a recuperação depois da crise financeira global de 2008 é lenta e insuficiente. O desemprego continua crescendo e já está em torno de 10% da população economicamente ativa. Apenas as Bolsas se recuperaram; mas isso não decorreu da melhoria da economia real, e sim do fato que os bancos centrais baixaram os juros e inundaram seus países de liquidez.
Dessa forma, essa recuperação é antes causa de preocupação do que de alegria, porque indica novas bolhas especulativas.
A causa desse mau desempenho está no lado da demanda. As empresas desempregam porque não têm para quem vender. Internamente não há fonte de demanda porque as famílias e as empresas estão pagando suas dívidas para recuperar sua solvência. No plano externo, também não há demanda entre os países ricos, porque aqueles que se endividaram (EUA, Espanha e Irlanda, principalmente) precisam pôr em ordem suas contas.
Diante da crise, a solução adotada por todos os países foi uma política fiscal expansionista que evitou o caos econômico. Mas os gastos fiscais não lograram promover uma recuperação sustentada das economias por duas razões: primeiro porque uma parte desse gasto se traduziu em isenção de impostos para os ricos -um tipo de política com baixo efeito multiplicador; segundo porque mesmo os gastos em investimentos não sinalizaram para os investidores privados perspectiva de crescimento sustentado da demanda, mas apenas aumento "once and for all" da demanda.
Que fazer alternativamente? Economistas como Martin Wolf pedem que os países de renda média aumentem suas importações, mas isso já está acontecendo. Como esses países foram menos atingidos pela crise exatamente porque estavam menos endividados, eles já voltaram a crescer de maneira satisfatória e, em consequência, voltaram a aumentar suas importações. O desempenho relativamente bom do Japão no último trimestre, por exemplo, deveu-se principalmente às importações da China.
Não resta, portanto, alternativa para os países ricos senão manter provisoriamente a política fiscal expansionista, até porque ela está sob seu controle. Mas essa política que envolveu deficit públicos perto de 10% do PIB não pode ser simplesmente continuada. A dívida pública dos países ricos tornou-se altíssima: a do Japão já alcança 226% do PIB, a dos EUA, 99,8%, a da França, 92,5%.
Que fazer então? Uma alternativa é financiar o aumento dos gastos do Estado que tenham efeitos multiplicadores criando demanda e emprego e financiá-los com impostos adicionais e progressivos sobre os ricos -sobre aqueles cuja propensão marginal a consumir é relativamente baixa. Dessa forma, o aumento da poupança privada não neutralizará a expansão do gasto público.
Quando escrevi a primeira versão deste artigo, na semana passada, pensei que estava propondo algo arrojado. Mas descobri em seguida que estava "descobrindo a América" pela segunda vez... Não obstante estar em campanha eleitoral, o governo britânico de Gordon Brown já promoveu o aumento do Imposto de Renda progressivo marginal de 40% para 50%. Mais cedo ou mais tarde essa política terá que ser considerada pelos demais países ricos. Nos 30 Anos Gloriosos do Capitalismo (1949-1978), o Imposto de Renda marginal chegou a alcançar 90%. Foi reduzido nos 30 Anos Neoliberais do Capitalismo. Voltará, agora, a ser elevado não apenas por uma questão de justiça mas também de lógica econômica.
Luiz Carlos Bresser-Pereira, 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Globalização e Competição".
Nenhum comentário:
Postar um comentário