DEU EM O GLOBO
De um ano para o outro, foram US$20 bilhões de diferença nas posições dos bancos. No fim de 2009, eles estavam comprados em US$3 bilhões. No fim de 2010, vendidos em US$17 bi. Isso significa que eles pegam recursos no exterior, onde há fartura de dólar, e trazem para cá. Imagine se o câmbio sobe de repente, os bancos teriam que correr atrás da moeda americana e ela poderia disparar.
Nada parece que vai inverter a tendência fraca do dólar, que é meio universal, mas a boa prudência manda que o mercado não fique assim tão exposto a esse risco. Em 2007, até setembro de 2008, o Brasil estava na mesma situação: nadando em dólar e a moeda americana só enfraquecendo. Os bancos aumentaram esse movimento de trazer dinheiro de fora, emprestar para empresas aqui. No mercado futuro, derivativos em moeda estrangeira, apostando que o dólar permaneceria baixo, viraram grandes fontes de lucro fácil. Até que, de repente, tudo mudou. O Lehman Brothers quebrou, o dólar disparou, o mercado secou e algumas empresas brasileiras entraram em dificuldade.
Não há sinal de uma reversão assim, mas por que não ser prudente? É nesta linha que o Banco Central trabalhou. Claro, que como efeito indireto ele pode colher uma redução da valorização excessiva da moeda brasileira. Ontem, o economista Ilan Goldfajn, do Itaú Unibanco, me disse que acha que o real já está caro demais e que não há muito espaço para continuar se apreciando. Mas o que o real já subiu foi o suficiente para alguns setores das empresas, principalmente manufaturas, estarem em dificuldades.
O dilema do Banco Central é que ele sabe que não tem poderes para determinar o preço da moeda. Nem quer. Ontem, em sua primeira entrevista coletiva, o novo presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, repetiu a crença de que o câmbio flutuante é o melhor dos sistemas, e que ele flutua em qualquer direção. Se o BC dissesse que a medida era para tentar segurar uma cotação, ela seria menos efetiva. Por isso, ele mira na redução dos riscos aos quais o mercado está exposto e cria uma punição na língua que os bancos entendem: dinheiro. Qualquer banco pode ter mais do que US$3 bilhões ou o valor estabelecido pela norma do Patrimônio de Referência, o que for menor, de posição em moeda americana. Poder, pode, mas custa caro. A decisão anunciada ontem é que a instituição terá que recolher o equivalente a 60% dessa posição ao Banco Central e sem remuneração nem correção monetária. Ou seja, dinheiro sem remuneração banco só gosta quando a grana é dos outros, como sabemos todos nós, os clientes.
Assim o BC, com um tiro, atinge dois alvos: reduz o risco da economia e pode afetar a tendência contínua de valorização do real. Nesse segundo ponto, a regulação não tem tanto poder de fogo assim. Mas é como disse Ilan: ele está passando um recado de que fez uma medida, outra, e poderá fazer outra. O BC, primeiro, tomou medidas para enxugar o excesso de dinheiro em circulação no fim do ano passado e disse que era uma ação prudencial também. Agora, está evitando o excesso de posição vendida de dólar também por razões de prudência. Nada impede que ele estabeleça uma nova norma no futuro. Isso se chama impactar as expectativas. Fontes do BC me informam que sim, no futuro, outros anúncios podem ser feitos. Mas o recado que a autoridade monetária está passando é que prefere agir dentro de regras clássicas de proteção contra risco e de política monetária. Um Banco Central ativo, mas não intervencionista. Que tenta direcionar tendência, mas não fixar preços.
Nathan Blanche, da Tendências consultoria, acha que a medida pode encarecer o crédito ao exportador, mas admite que o Banco Central agiu dentro das regras do jogo de mercado. Ele acha que é positivo principalmente diante das alternativas, como quarentena ou outras regras mais intervencionistas. Segundo Blanche, o mercado estava tenso diante das declarações do ministro Guido Mantega, que avisou que algo seria feito, mas não disse o quê. O BC, como se sabe, convocou uma coletiva para as oito da manhã, antes de o mercado abrir, e aí deu tempo para todos entenderem. Inclusive deu tempo também para que os bancos se adaptem: eles terão três meses. É por isso que a alta de ontem do dólar foi bem pequena. O BC quer dar a direção, mas não quer movimentos bruscos.
Mas a medida adianta? Um jornalista quis saber ontem de Tombini se ele não estava enxugando gelo. Há tantas razões para os dólares virem para o Brasil e uma delas é, sem dúvida, o nível dos juros muito acima dos de outros países. Tombini lembrou que mesmo em países emergentes que estão com juros baixos as moedas locais estão subindo em relação ao dólar.
No Brasil, os outros motivos que atraem dólares também estão presentes: o país está crescendo, há boas perspectivas de crescimento futuro, as empresas parecem lucrativas, o comércio é superavitário. Por isso, é difícil imaginar que - a não ser num contexto de crise externa - o dólar suba muito.
E há fatores que ninguém controla: a fragilidade da economia americana, que emite o dólar, ou o fato de que o grande exportador do mundo, a China, segue outra política cambial em vez do flutuante. Esse é um problema mundial, e recentemente Cingapura, Tailândia e Coreia do Sul adotaram medidas para conter o excesso de entrada de dólar. O Chile aumentou o volume das compras da moeda. Todo mundo tenta conter a queda. No Brasil, o BC do novo governo fez um movimento e mostrou seu estilo: prudência e dentro das regras do câmbio flutuante.
De um ano para o outro, foram US$20 bilhões de diferença nas posições dos bancos. No fim de 2009, eles estavam comprados em US$3 bilhões. No fim de 2010, vendidos em US$17 bi. Isso significa que eles pegam recursos no exterior, onde há fartura de dólar, e trazem para cá. Imagine se o câmbio sobe de repente, os bancos teriam que correr atrás da moeda americana e ela poderia disparar.
Nada parece que vai inverter a tendência fraca do dólar, que é meio universal, mas a boa prudência manda que o mercado não fique assim tão exposto a esse risco. Em 2007, até setembro de 2008, o Brasil estava na mesma situação: nadando em dólar e a moeda americana só enfraquecendo. Os bancos aumentaram esse movimento de trazer dinheiro de fora, emprestar para empresas aqui. No mercado futuro, derivativos em moeda estrangeira, apostando que o dólar permaneceria baixo, viraram grandes fontes de lucro fácil. Até que, de repente, tudo mudou. O Lehman Brothers quebrou, o dólar disparou, o mercado secou e algumas empresas brasileiras entraram em dificuldade.
Não há sinal de uma reversão assim, mas por que não ser prudente? É nesta linha que o Banco Central trabalhou. Claro, que como efeito indireto ele pode colher uma redução da valorização excessiva da moeda brasileira. Ontem, o economista Ilan Goldfajn, do Itaú Unibanco, me disse que acha que o real já está caro demais e que não há muito espaço para continuar se apreciando. Mas o que o real já subiu foi o suficiente para alguns setores das empresas, principalmente manufaturas, estarem em dificuldades.
O dilema do Banco Central é que ele sabe que não tem poderes para determinar o preço da moeda. Nem quer. Ontem, em sua primeira entrevista coletiva, o novo presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, repetiu a crença de que o câmbio flutuante é o melhor dos sistemas, e que ele flutua em qualquer direção. Se o BC dissesse que a medida era para tentar segurar uma cotação, ela seria menos efetiva. Por isso, ele mira na redução dos riscos aos quais o mercado está exposto e cria uma punição na língua que os bancos entendem: dinheiro. Qualquer banco pode ter mais do que US$3 bilhões ou o valor estabelecido pela norma do Patrimônio de Referência, o que for menor, de posição em moeda americana. Poder, pode, mas custa caro. A decisão anunciada ontem é que a instituição terá que recolher o equivalente a 60% dessa posição ao Banco Central e sem remuneração nem correção monetária. Ou seja, dinheiro sem remuneração banco só gosta quando a grana é dos outros, como sabemos todos nós, os clientes.
Assim o BC, com um tiro, atinge dois alvos: reduz o risco da economia e pode afetar a tendência contínua de valorização do real. Nesse segundo ponto, a regulação não tem tanto poder de fogo assim. Mas é como disse Ilan: ele está passando um recado de que fez uma medida, outra, e poderá fazer outra. O BC, primeiro, tomou medidas para enxugar o excesso de dinheiro em circulação no fim do ano passado e disse que era uma ação prudencial também. Agora, está evitando o excesso de posição vendida de dólar também por razões de prudência. Nada impede que ele estabeleça uma nova norma no futuro. Isso se chama impactar as expectativas. Fontes do BC me informam que sim, no futuro, outros anúncios podem ser feitos. Mas o recado que a autoridade monetária está passando é que prefere agir dentro de regras clássicas de proteção contra risco e de política monetária. Um Banco Central ativo, mas não intervencionista. Que tenta direcionar tendência, mas não fixar preços.
Nathan Blanche, da Tendências consultoria, acha que a medida pode encarecer o crédito ao exportador, mas admite que o Banco Central agiu dentro das regras do jogo de mercado. Ele acha que é positivo principalmente diante das alternativas, como quarentena ou outras regras mais intervencionistas. Segundo Blanche, o mercado estava tenso diante das declarações do ministro Guido Mantega, que avisou que algo seria feito, mas não disse o quê. O BC, como se sabe, convocou uma coletiva para as oito da manhã, antes de o mercado abrir, e aí deu tempo para todos entenderem. Inclusive deu tempo também para que os bancos se adaptem: eles terão três meses. É por isso que a alta de ontem do dólar foi bem pequena. O BC quer dar a direção, mas não quer movimentos bruscos.
Mas a medida adianta? Um jornalista quis saber ontem de Tombini se ele não estava enxugando gelo. Há tantas razões para os dólares virem para o Brasil e uma delas é, sem dúvida, o nível dos juros muito acima dos de outros países. Tombini lembrou que mesmo em países emergentes que estão com juros baixos as moedas locais estão subindo em relação ao dólar.
No Brasil, os outros motivos que atraem dólares também estão presentes: o país está crescendo, há boas perspectivas de crescimento futuro, as empresas parecem lucrativas, o comércio é superavitário. Por isso, é difícil imaginar que - a não ser num contexto de crise externa - o dólar suba muito.
E há fatores que ninguém controla: a fragilidade da economia americana, que emite o dólar, ou o fato de que o grande exportador do mundo, a China, segue outra política cambial em vez do flutuante. Esse é um problema mundial, e recentemente Cingapura, Tailândia e Coreia do Sul adotaram medidas para conter o excesso de entrada de dólar. O Chile aumentou o volume das compras da moeda. Todo mundo tenta conter a queda. No Brasil, o BC do novo governo fez um movimento e mostrou seu estilo: prudência e dentro das regras do câmbio flutuante.
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