Jamil Chade
Fernando Henrique Cardoso, Ex-presidente da República
A política externa brasileira é "improvisada" e está guiada mais pela promoção do "prestígio de alguns do que dos interesses nacionais do País". A afirmação é do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que, em entrevista ao Estado, acusou a política externa do governo Lula de ter distanciado o Brasil de uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU. Agora, cobra da presidente Dilma Rousseff que seja "consequente" com as declarações de que vai pôr os direitos humanos no centro de sua agenda. Para Fernando Henrique, o Brasil foi "ingênuo" ao lidar com o Irã.
A presidente Dilma afirmou que Brasil errou com voto sobre o Irã na ONU que tratava de lapidação, em que o governo Lula se absteve. É sinal de mudança?
Gostei da declaração da Dilma de que ela não aceita a lapidação. Ela falou algo que era verdadeiro. São direitos universais. Não pode haver concessão. O problema é que agora vamos ver se o governo vai ser mesmo consequente com isso e com essa postura.
O que é ter politica externa consequente com direitos humanos?
Apesar de ter uma posição econômica e até política de aproximação com um país, ser consequente com direitos humanos é dizer: "com isso aí eu não concordo". Não implica romper com ninguém nem fazer uma politica de bloqueio. É acreditar que direitos humanos são valores universais.
O Brasil foi consequente com a agenda de direitos humanos durante os últimos oito anos?
O Brasil retrocedeu na agenda dos direitos humanos, assim como havia retrocedido na questão do meio ambiente e de não aceitar metas de limitação de emissões. Agora, na parte ambiental, o governo recuperou uma posição mais positiva. Mas na questão dos direitos humanos retrocedeu e até agora não vi nada novo ainda.
Parte da agenda de direitos humanos com o Irã está intimamente ligada à questão nuclear. Como equilibrar esses dois pilares da agenda?
A questão nuclear é complicada. O Brasil sempre teve uma posição favorável à pesquisa. Não pode nem cogitar fazer bomba atômica. Mas estamos entrando em um momento delicado no cenário internacional. Há um aumento de usinas nucleares no mundo. Ninguém discute isso e não está resolvido. Precisamos passar para um debate mais amplo. Enquanto o Irã defender a autonomia da pesquisa, temos de estar de acordo. Pois queremos a mesma coisa. Mas se se trata de fazer uma bomba, temos de estar contra. É um crime contra a humanidade. No caso do Irã, o governo do Brasil alega que teve sinal de Obama para mediar um acordo nuclear. Os americanos dizem que não. O que não dá para entender de nenhuma forma é Lula levantar a mão de Ahmadinejad. Isso foi glorificar a pessoa que nega o Holocausto. Como não há o Holocausto?
Hillary Clinton disse que Brasil foi ingênuo com o Irã. O sr. concorda?
Acredito que fomos muito ingênuos. No mínimo achando que estávamos fazendo um papel bom e positivo. Mas o que vemos é que o resultado foi negativo. Pelo menos para o Brasil. O que vimos foi uma redução das chances do Brasil de participar de tais negociações depois do que ocorreu. Foi um passo audacioso. Mas não temos alavancagem para jogar aquele jogo. O Brasil precisa fazer um pouco mais do que a China faz. A China só se move em termos de interesse nacional restrito. Quando seu interesse está em jogo e ela tem meios de fazer valer sua palavra, então entra em campo. Nós opinamos um pouco demais. É mais uma questão da promoção do prestigio de alguns que do interesse nacional. Buscam o prestígio da diplomacia, do presidente, da ideia de um Brasil potência. No Oriente Médio, temos de falar de direitos humanos. Essa é a nossa linguagem. Não a linguagem de que eu tenho o poder de mudar as regras do jogo lá. É muito complicado mexer com essa região. Mexe com interesses imensos, com a cultura. Para o Brasil jogar, teria de estar mais preparado. Foi arriscado e mostrou improvisação. Foi um gol contra.
E quais podem ser as consequências para o governo Dilma?
O pior é que tudo isso distanciou o Brasil do objetivo declarado da diplomacia brasileira, que era ter um lugar no Conselho de Segurança. Atrapalhou um dos objetivos da diplomacia brasileira e vai levar muito tempo para recuperar a posição em que estávamos antes. Veja a Índia, que recebeu um aval dos Estados Unidos para ter um lugar no Conselho de Segurança.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
Fernando Henrique Cardoso, Ex-presidente da República
A política externa brasileira é "improvisada" e está guiada mais pela promoção do "prestígio de alguns do que dos interesses nacionais do País". A afirmação é do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que, em entrevista ao Estado, acusou a política externa do governo Lula de ter distanciado o Brasil de uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU. Agora, cobra da presidente Dilma Rousseff que seja "consequente" com as declarações de que vai pôr os direitos humanos no centro de sua agenda. Para Fernando Henrique, o Brasil foi "ingênuo" ao lidar com o Irã.
A presidente Dilma afirmou que Brasil errou com voto sobre o Irã na ONU que tratava de lapidação, em que o governo Lula se absteve. É sinal de mudança?
Gostei da declaração da Dilma de que ela não aceita a lapidação. Ela falou algo que era verdadeiro. São direitos universais. Não pode haver concessão. O problema é que agora vamos ver se o governo vai ser mesmo consequente com isso e com essa postura.
O que é ter politica externa consequente com direitos humanos?
Apesar de ter uma posição econômica e até política de aproximação com um país, ser consequente com direitos humanos é dizer: "com isso aí eu não concordo". Não implica romper com ninguém nem fazer uma politica de bloqueio. É acreditar que direitos humanos são valores universais.
O Brasil foi consequente com a agenda de direitos humanos durante os últimos oito anos?
O Brasil retrocedeu na agenda dos direitos humanos, assim como havia retrocedido na questão do meio ambiente e de não aceitar metas de limitação de emissões. Agora, na parte ambiental, o governo recuperou uma posição mais positiva. Mas na questão dos direitos humanos retrocedeu e até agora não vi nada novo ainda.
Parte da agenda de direitos humanos com o Irã está intimamente ligada à questão nuclear. Como equilibrar esses dois pilares da agenda?
A questão nuclear é complicada. O Brasil sempre teve uma posição favorável à pesquisa. Não pode nem cogitar fazer bomba atômica. Mas estamos entrando em um momento delicado no cenário internacional. Há um aumento de usinas nucleares no mundo. Ninguém discute isso e não está resolvido. Precisamos passar para um debate mais amplo. Enquanto o Irã defender a autonomia da pesquisa, temos de estar de acordo. Pois queremos a mesma coisa. Mas se se trata de fazer uma bomba, temos de estar contra. É um crime contra a humanidade. No caso do Irã, o governo do Brasil alega que teve sinal de Obama para mediar um acordo nuclear. Os americanos dizem que não. O que não dá para entender de nenhuma forma é Lula levantar a mão de Ahmadinejad. Isso foi glorificar a pessoa que nega o Holocausto. Como não há o Holocausto?
Hillary Clinton disse que Brasil foi ingênuo com o Irã. O sr. concorda?
Acredito que fomos muito ingênuos. No mínimo achando que estávamos fazendo um papel bom e positivo. Mas o que vemos é que o resultado foi negativo. Pelo menos para o Brasil. O que vimos foi uma redução das chances do Brasil de participar de tais negociações depois do que ocorreu. Foi um passo audacioso. Mas não temos alavancagem para jogar aquele jogo. O Brasil precisa fazer um pouco mais do que a China faz. A China só se move em termos de interesse nacional restrito. Quando seu interesse está em jogo e ela tem meios de fazer valer sua palavra, então entra em campo. Nós opinamos um pouco demais. É mais uma questão da promoção do prestigio de alguns que do interesse nacional. Buscam o prestígio da diplomacia, do presidente, da ideia de um Brasil potência. No Oriente Médio, temos de falar de direitos humanos. Essa é a nossa linguagem. Não a linguagem de que eu tenho o poder de mudar as regras do jogo lá. É muito complicado mexer com essa região. Mexe com interesses imensos, com a cultura. Para o Brasil jogar, teria de estar mais preparado. Foi arriscado e mostrou improvisação. Foi um gol contra.
E quais podem ser as consequências para o governo Dilma?
O pior é que tudo isso distanciou o Brasil do objetivo declarado da diplomacia brasileira, que era ter um lugar no Conselho de Segurança. Atrapalhou um dos objetivos da diplomacia brasileira e vai levar muito tempo para recuperar a posição em que estávamos antes. Veja a Índia, que recebeu um aval dos Estados Unidos para ter um lugar no Conselho de Segurança.
FONTE: O ESTADO DE S. PAULO
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