quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Inflação e decisões de política econômica :: Antonio Corrêa de Lacerda

A inflação oficial brasileira atingiu 6,5% em 2011, no limite do teto da margem de tolerância, de 2 pontos porcentuais, da meta anual. Diante das circunstâncias domésticas e do cenário externo, não deixou de ser um resultado favorável.

Ocorreu grande discussão entre os analistas econômicos no final de agosto de 2011, quando o Banco Central (BC), corretamente, começou a reduzir a taxa básica de juros. Houve até mesmo quem questionasse a autonomia do BC diante do governo e fizesse ilações de ingerência na sua decisão. No entanto, como já defendi neste espaço anteriormente, a medida estava correta.

O primeiro aspecto a ser destacado é que, embora uma inflação anual de 6,5% pareça exagerada, esse não é um problema exclusivo brasileiro. Em face do aumento dos gastos públicos e do crescimento do endividamento em vários países, aliado ao crescimento da demanda, principalmente da China e da Índia, houve substancial aumento dos preços das commodities, especialmente nos dois anos anteriores, até meados de 2011. Esse quadro fez com que a inflação mundial crescesse de modo expressivo no ano passado. Apesar da crise, ocorreu aumento dos preços nos países centrais. Nos EUA, a inflação de 12 meses chegou a 3%; na Europa, a 3,5%. A China chegou a ter, em outubro, inflação acumulada em 12 meses de 5,5%; a África do Sul, de 6%; Rússia, mais de 7%; e a Índia, de 10%. Em países como Argentina e Venezuela, a inflação supera dois dígitos.

Nos últimos meses, a crise tem derrubado alguns preços e isso tem feito com que a inflação venha se reduzindo em vários países, inclusive no Brasil. Vale, ainda, destacar que têm prevalecido, desde a crise de 2008, taxas básicas de juros reais muito baixas, mesmo negativas, nos países ricos. Isso porque os governos têm claramente privilegiado o combate aos efeitos da crise, em detrimento de uma política monetária mais rígida, o que poderia trazer resultados mais rápidos sobre os preços, mas com custos econômicos e sociais elevados.

É muito provável que este ano a inflação brasileira se aproxime do centro da meta, de 4,5%, não só em razão dos aspectos internacionais já apontados, mas também porque há um claro desaquecimento do nível de atividades, dos 7,5%, em 2010, para algo próximo de 3%, na média, de 2011 e 2012. Isso não quer dizer que não haja uma ampla agenda a ser trabalhada internamente para garantir um nível de inflação mais controlado nos próximos anos, e não apenas circunstancial. Nesse sentido, salta aos olhos a questão da indexação, por exemplo, uma clara distorção do nosso processo de formação de preços. O reajuste automático de preços e tarifas, atrelados a indicadores de inflação, faz com que haja a perpetuação de níveis inflacionários passados, dificultando o papel da taxa de juros e de outros instrumentos de política monetária.

Os preços dos serviços têm crescido acima da média dos demais itens nos últimos anos e isso tem muito que ver com as transformações em curso na economia do Brasil. O crescimento do poder de consumo das classes de menor renda tem ampliado a demanda por serviços, o que cria um ambiente favorável à alta de seus preços. Trata-se de um reordenamento dos preços relativos e o processo deve perdurar, embora possa ser amenizado com o fomento à concorrência e o aumento da produtividade.

Parte expressiva da inflação, pois, decorre de mudanças estruturais na economia. Daí a importância de adotar a estratégia correta para combatê-la, sob pena de sacrificar o crescimento econômico. O desafio é diagnosticar adequadamente as causas e consequências da inflação, considerando, além dos fatores exógenos e endógenos, a relação custo-benefício das escolhas das políticas econômicas. Não podemos ser lenientes com o crescimento dos preços, mas seria um grande equívoco sermos "mais realistas que o rei" e, em nome de uma pseudoausteridade, pôr a perder um importante processo de melhora na distribuição da renda dos brasileiros.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

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