Uma ampla Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), que retrata o novo perfil de consumo do brasileiro, vai orientar o cálculo do índice oficial de inflação, o IPCA, este ano. O levantamento é do IBGE e traz algumas surpresas. Terão peso menor na inflação gastos com educação e empregados domésticos, num retrato da ascensão de uma nova classe social no país. No entanto, o brasileiro está gastando mais com cursos extras, carro novo, combustível e celular. A previsão é que o impacto seja de 0,4 a 0,5 ponto. Se as medidas já estivessem em vigor, a inflação de 2011, por exemplo, teria ficado em 6,1 % e não em 6,5%
Inflação à brasileira
Transformação social dos últimos anos no país está refletida agora nos índices de preços
Clarice Spitz
Menos gastos com educação, mais dispêndio com bens duráveis. Menos empregados domésticos, mais passagens aéreas. A transformação social que aconteceu no Brasil nos últimos anos, com ascensão para classe média de milhões de famílias, chegou ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medido pelo IBGE, que orienta o sistema de metas de inflação do governo. A nova ponderação do indicador passa a valer a partir deste mês. Luis Otávio de Souza Leal, do Banco ABC Brasil, calcula que se a nova ponderação já tivesse começado a valer em 2011, a inflação teria ficado em 6,1% e não em 6,5%. Pela pesquisa Focus, a inflação este ano deve ficar em 5,31%.
A mudança do consumo tirou do cálculo da inflação a máquina de costura, o chuchu e o chope. Também deixaram de existir para o cálculo da inflação o velho filme de máquina fotográfica e flash descartável. Em seus lugares, entram itens como o salmão e o pacote combo de TV e internet, que passaram a fazer parte da vida das famílias brasileiras nos últimos anos. Para o IBGE, os novos pesos no índice passarão a traçar um retrato mais fiel das despesas no bolso do consumidor.
- O ganho de renda das classes D e E e a ascensão social mostram que a nova ponderação é coerente com a sociedade de consumo brasileira. Essas camadas pararam apenas de subsistir para também consumir - avalia Leal, do banco ABC.
O aumento da renda e do emprego, a inflação sob controle e a ascensão para a chamada nova classe média são os motores dessas mudanças, avaliam especialistas. Enquanto produtos e serviços ligados à tecnologia vão pesar cada vez mais, os ligados ao emprego doméstico ficarão cada vez mais caros e raros. O crescimento da renda reduziu a parcela de pessoas dispostas a trabalhar como empregada doméstica, que agora conseguem postos mais qualificados.
O computador e o automóvel próprio ganharão espaço e vão pesar mais. Só os veículos passarão de 7,33% para 10,32% do índice oficial de preços. O peso da TV e do computador vai mais que triplicar.
O grupo Educação experimentará a maior queda de peso no índice. O que parece contraditório diante da alta desse grupo em 2011, de 8,09%. Agora, terá sua participação reduzida de 7,21% para 4,37% no índice de preços.
Padrão de consumo deve se consolidar
Para especialistas, a tendência é de consolidação desse padrão de consumo, mais próximo dos países desenvolvidos, em que há redução de gastos relacionados à Alimentação e aumento de despesas em Habitação e Transportes. Leal espera ainda por uma elevação do peso de itens como lazer e recreação. Nesta novo cálculo, o item passou de 3,43% para 3,06%.
Para o economista da PUC-Rio, Luiz Roberto Cunha, o desempenho dos serviços em 2012 será fundamental para o comportamento da inflação. Além da ponderação do IBGE, eles foram reagrupados pelo Banco Central nas suas análises. Passagens aéreas que, sozinhas, tiveram alta de 52,91%, e alimentação fora de casa passarão a fazer parte do grupo. Segundo simulação do BC, os serviços que respondiam por 23,43% da inflação passarão para 31,32%.
A alimentação fora de casa embora tenha perdido espaço na nova inflação ainda é um grupo importante. A refeição fora de casa, que tem o almoço como carro chefe, aumentou sua participação no orçamento. Segundo Irene Machado, técnica do IBGE, o aumento do emprego acaba levando o trabalhador a fazer as refeições fora de casa.
- Por outro lado, pequenos lanches, o cafezinho, o refrigerante perderam espaço - afirma.
Ex-representante comercial, o taxista Leonardo Cozzolino, de 42 anos, diz que evita até os restaurantes de comida a peso para não sofrer tanto na hora de pagar. Para evitar mais gastos, ele se acostumou nos últimos dois anos a trocar o jantar por um lanche:
- Almoço fora de casa todo dia e acabo tendo que optar pelos pratos feitos. Meu gasto diário é de uns R$30, somando café da manhã reforçado.
Para Alessandra Ribeiro, da Tendências, a ascensão da nova classe média pode explicar, em parte, a perda de peso do item, já que a maior parte não tem o hábito de comer fora como nas classes A e B.
O anúncio da reponderação do IPCA no ano passado provocou críticas ao IBGE, já que os itens que pesaram menos no orçamento foram os que mais subiram no ano passado. Isso aconteceu no momento que a inflação ameaçava ficar acima do teto da meta de 6,5%. O IPCA acabou fechando o ano nesse patamar. Diante do novo cálculo provisório, bancos e consultorias reduziram suas projeções em até 0,5 ponto para o IPCA de 2012. Com a divulgação dos pesos definitivos, não houve alteração nas projeções.
FONTE: O GLOBO
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