Pressionados pela 26 ª fase da Lava- Jato, que revelou a existência de uma “diretoria de propina” na Odebrecht, o ex-presidente da empreiteira Marcelo Odebrecht e todos os executivos presos decidiram fazer delação premiada. A Lava- Jato, porém, diz que o acordo dependerá das informações que eles prestarem. Em nota, a empresa afirmou ter optado por uma “colaboração definitiva”. Na nova fase, foram presas 13 pessoas acusadas de envolvimento no pagamento de propina em obras como o Itaquerão e projetos imobiliários do Porto Maravilha.
Acuado pela PF, Marcelo Odebrecht decide fazer delação
• Operação prende nove executivos do grupo e revela pagamento de propinas em obras de porto e estádio
Cleide Carvalho, Renato Onofre - O Globo
- SÃO PAULO- A força-tarefa da Lava- Jato colocou em xeque o clã Odebrecht. Preso há nove meses em Curitiba, e já condenado a 19 anos e quatro meses de prisão, o empresário Marcelo Odebrecht cedeu e, agora, decidiu fazer um acordo de delação premiada no mesmo dia em que a Polícia Federal deflagrou nova operação contra a empreiteira, revelando detalhes do esquema de pagamento de propinas a políticos e agentes públicos. A empresa divulgou nota à noite informando que Marcelo e todos os demais executivos decidiram colaborar com as investigações.
“As avaliações e reflexões levadas a efeito por nossos acionistas e executivos levaram a Odebrecht a decidir por uma colaboração definitiva com as investigações da Operação Lava- Jato”, diz a nota, acrescentando que, além de negociar acordo de leniência com a Controladoria Geral da União desde dezembro, “vem mantendo contato com as autoridades com o objetivo de colaborar”.
No entanto, fontes da Polícia Federal e do Ministério Público Federal informaram ao GLOBO ontem à noite, após a divulgação da nota pela Odebrecht, que as negociações ainda não começaram. O comunicado é visto como uma “cortina de fumaça” para tentar minimizar o impacto das denúncias reveladas ontem. À noite, o MPF divulgou nota dizendo que “não fez acordo com a Odebrecht ou seus executivos e que qualquer acordo, neste momento, será restrito às pessoas que vierem antes e cuja colaboração se revelar mais importante ao interesse público”.
Pagamento a João Santana
A 26 ª fase da operação, batizada de Xepa, complicou a situação de Marcelo Odebrecht ainda mais. A secretária Maria Lúcia Tavares, funcionária de confiança da empresa e a primeira a colaborar com a Justiça — à revelia da empresa —, contou detalhes da contabilidade paralela de propinas e confirmou que Marcelo participava diretamente dos pagamentos.
Sob a sigla MBO, iniciais de Marcelo Bahia Odebrecht, foi ele, segundo Maria Lúcia, quem determinou o pagamento de R$ 2 milhões ao marqueteiro João Santana, em novembro de 2014, poucos dias depois de encerrada a campanha de reeleição da presidente Dilma Rousseff. Para a força- tarefa, Marcelo usou dinheiro de propina para pagar dívidas de campanha do PT.
As planilhas de Maria Lúcia também envolvem obras de governos estaduais, municipais e até mesmo no exterior, como Argentina e Angola. Entre as obras sob suspeita estão as do Porto Maravilha, no Rio, da Arena Corinthians, em São Paulo, e do Canal do Sertão Alagoano — esta uma obra de R$ 1,5 bilhão destinada a levar água a 42 municípios no estado.
— Sem dúvida essa é a maior operação de propina que encontramos e a mais sofisticada. Essa sistemática de implantação de um sistema exclusivo dentro da estrutura formal de uma empresa ainda não tínhamos encontrado — disse a procuradora da República Laura Tessler.
Marcelo e o clã Odebrecht não queriam fazer acordo de delação. Temiam os efeitos nos negócios do grupo dentro e fora do Brasil. Investigado também pelo Ministério Público Suíço e com suas obras na mira em pelo menos outros seis países, o Grupo Odebrecht corre riscos de condenações dentro e fora do Brasil.
“Valores morais”
Na CPI da Petrobras, em setembro passado, Marcelo chegou a dizer que “dedurar” não estava entre seus “valores morais”:
— Na infância, eu talvez brigasse mais com quem dedurou do que quem fez o fato.
Descobertas as redes de pagamento de propina no Brasil, com a planilha de pagamentos esmiuçada pela secretária, restou a Marcelo enfrentar a dura queda de braço com a Lava- Jato em torno do que pode ou não valer como delação premiada, e com isso garantir benefícios a ele, seus executivos e suas empresas. Não têm sido fácil. As conversas já duram pelo menos duas semanas. Neste período, a resposta da PF aos fatos que Marcelo admitiu delatar foi “insuficiente” e “inaceitável”.
Marcelo tem se reunido duas horas por dia com advogados para traçar os detalhes de um acordo. Já falou três vezes com uma das autoridades da Lava- Jato, mas suas informações não foram consideradas suficientes. Ele ofereceu a indicação de outras obras do governo federal, de governos estaduais e municipais. Agora, parte delas já foi encontrada sem a necessidade de colaboração, faltando apenas aos investigadores saber o nome de quem se beneficiou, o que já não é difícil, porque os intermediários já foram achados. Boa parte das 28 pessoas levadas a depor coercitivamente ontem pela PF agia como intermediária.
A PF atuou em nove estados. Em São Paulo, Rio, Recife, Porto Alegre e Salvador, fez buscas, apreensões e ouviu corretores e operadores de valores, que eram contratados pela Odebrecht para providenciar dinheiro vivo para corromper políticos e agentes públicos. Agora, os investigadores querem a abertura de todas as contas secretas da empresa no exterior mantidas pela empresa através de offshores em paraísos fiscais.
Uma estimativa informal da Lava- Jato é que um acordo da Odebrecht poderia, pela primeira vez, ultrapassar a marca de R$ 2 bilhões, podendo chegar a marca de R$ 10 bilhões a título de indenização pelas perdas impostas pela corrupção. Apenas na operação de ontem, a Xepa, nove executivos do grupo foram presos ( dois com prisão preventiva e sete com prisão temporária).
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