• Protagonismo de PSDB e DEM ameaça unidade do governo
- Valor Econômico
A correria para a montagem do ministério ajuda a explicar o tumulto dos primeiros dias do PMDB no governo. Foi assim com Itamar Franco, depois do impeachment de Fernando Collor. Mas é pouco para justificar o vai e vem nas decisões do Palácio do Planalto, nessas pouco mais de 100 horas desde a posse do presidente interino Michel Temer, no fim da tarde da última sexta-feira.
Itamar precisou de três ministros da Fazenda antes de firmar o governo na área econômica. Mas além da "turma do pão de queijo", na copa e cozinha palaciana, demonstrou claramente o que queria ao nomear oito senadores para o ministério, a chamada "República do Senadores" - tirar Collor definitivamente. Bobagem dizer que Itamar nunca articulou a queda de Collor.
A plataforma do governo Temer é muito clara: a recuperação da credibilidade do governo e a votação das reformas que Dilma não conseguiu fazer, a fim de recuperar a confiança dos investidores e preparar a economia para a retomada do crescimento. Os primeiros movimentos, no entanto, são de um governo que parece não saber o que quer. Temer foi, voltou e depois foi de novo na proposta de redução de ministérios, por exemplo. Queria um governo de notáveis, mas teve de dobrar-se à evidência de que a oposição vai tratá-lo no Congresso como um presidente ilegítimo, sem concessões, e teve de recuar para fortalecer a base de apoio.
Houve outros episódios, menos (a indicação do ministro da Defesa) ou mais (a demora no anúncio do presidente do Banco Central) relevantes, de vai e volta. Mas o pior é o disse que disse sobre propostas fundamentais do novo governo, como a reforma da Previdência Social e a criação de novos impostos ou reedição da CPMF. O risco que corre o presidente interino é que prospere a fama de "governo vacilante" ou de "governo stop and go", definições já em curso na Câmara dos Deputados e no Senado. Entre aliados.
Talvez Temer devesse ter costurado uma agenda mínima com os 11 partidos que levou para o governo, com o compromisso de apoio; talvez falte no Palácio do Planalto alguém com mais experiência de governo para enquadrar o discurso da equipe. No Congresso, especialmente na Câmara dos Deputados, à deriva desde o afastamento de seu presidente, Eduardo Cunha, já é possível sentir o cheiro de queimado. As propostas de Temer devem ser votadas e aprovadas, até pelo motivo de que ninguém quer a volta de Dilma - a presidente explodiu as pontes que ainda tinha durante a discussão e votação da abertura do processo de impeachment no Senado. Mas há assuntos mal resolvidos.
No momento, o principal talvez seja o protagonismo que o PSDB e o DEM podem ter no novo governo.
Para bem acomodar tucanos e o Democratas, Temer sacrificou espaços reivindicado pelo "centrão", grupo com mais de 300 deputados que define as votações na Câmara. A presidente Dilma perdeu o "centrão" por conta dos privilégios ao PT - propunha a reforma da Previdência, por exemplo, e o partido se declarava contrário; Temer também pode perdê-lo se deixar que PSDB e DEM sejam como o PT da antiga base.
O Democratas tomou a frente das iniciativas para a declaração de vacância do cargo de presidente da Câmara, o que tem repercussão no "centrão", constituído por partidos que se mantêm fiéis a Eduardo Cunha. O deputado carioca vive uma situação singular - pode ser candidato a presidente da República, mas não pode presidir a Câmara. É uma espécie de "cassação branca". Já está no Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação do PP, PSC e Solidariedade que pode levar a decisão do STF a ser submetida ao crivo do plenário da Câmara.
Se Temer indicar para líder do governo um nome do PMDB, não deve ter maiores problemas. A conversa muda quando se trata da designação de Rodrigo Maia (RJ), do Democratas. A disputa pela liderança é a expressão do litígio. O DEM ficou com o Ministério da Educação, o que já era considerado muito para uma bancada de apenas 29 deputados. O MEC mais a liderança, então, seria um exagero. As críticas ao partido na educação vão além, pois o DEM imprime uma face de direita difícil de acomodar com o setor. Não é por acaso a rebelião da área da cultura, dominada pela esquerda, que em princípio seria incorporada pelo MEC.
Havia uma candidata do DEM para a Educação, a deputada Professora Dorinha Rezende (TO). Educadora e mulher. Os partidos teriam representantes do sexo feminino para indicar a Temer, se tivessem sido demandados pela articulação política do governo. Simplesmente não se pensou nisso.
O DEM tem tradição na área das Minas e Energia. Tinha até um bom candidato, o deputado José Carlos Aleluia, bem aceito na área. Ficaria melhor lá que na Educação. Mas para o cargo fuciu com o PSB, partido sem tradição com o setor. O PMDB acabou repetindo um erro que condenava em Dilma: interferiu em assuntos internos de outra sigla, cujo diretório nacional havia decidido (22 x 8) não indicar ministros nem sancionar o nome de quem aceitasse convite em caráter pessoal.
O PSDB ficou com três ministérios, sendo que um deles, Cidades, em detrimento do PSD, que almejava ficar com a pasta. Causou mal estar entre aliados de Temer no PMDB e no "centrão" a declaração do líder tucano na Câmara, Antonio Imbassahy, segundo a qual o novo governo não pode contar com PSDB, se quiser aprovar a CPMF. Soou como o PT falando mal das reformas do ex-ministro da Fazenda Joaquim Levy -se os petistas, que em tese constituiam o alicerce da base do governo, votavam contra, por que os aliados seriam a favor?
Sem uma pauta mínima consensual entre os partidos, Temer pode ficar como Dilma Rousseff, que botou a CPMF no Orçamento da União, sem ter a menor chance de aprovar a volta do "imposto do cheque". Na prática, as dificuldades para a reedição da CPMF continuam praticamente as mesmas. Para os aliados, são compreensíveis as cautelas de Temer até o processo de impeachment ser concluído. Mas fazer um governo tendo PSDB e DEM como protagonista seria corroborar a tese do golpe.
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