• Ex-presidente seria a pessoa identificada como ‘amigo’; Palocci é indiciado por corrupção
Cleide Carvalho, Thiago Herdy Dimitrius Dantas* - O Globo
-SÃO PAULO- A Polícia Federal suspeita que o codinome “amigo”, citado em planilha de propina produzida pela Odebrecht, é uma referência ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De acordo com a polícia, o “amigo” foi beneficiário de R$ 8 milhões debitados do saldo da “conta-corrente da propina” da empreiteira com o PT, entre julho de 2012 e outubro de 2013.
A defesa do ex-presidente negou a acusação, classificando-a como “frívola”. Esta é a primeira vez que Lula é vinculado diretamente a documentos que remetem a pagamentos de propina da Odebrecht. A PF também associou o codinome “italiano” ao ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, que foi indiciado ontem por corrupção passiva na Lava-Jato. Segundo as investigações, Palocci gerenciou os recursos de propina para o PT entre 2003 e 2015.
Além de Palocci, ontem foram indiciados o publicitário João Santana, sua mulher, Monica Moura, o empresário Marcelo Odebrecht, e dois assessores do ex-ministro — Branilsav Kontic e Juscelino Dourado. O casal Santana, que não constava entre os acusados do processo que levou à prisão de Palocci, foi indiciado por lavagem de dinheiro referente ao recebimento de US$ 11 milhões da Odebrecht no exterior.
O delegado da PF Felipe Pace sustenta que Palocci era o gestor da “conta-corrente de propina” mantida pelo PT com a Odebrecht, registrada em planilha. De acordo com o documento, os R$ 8 milhões pagos à pessoa identificada como “amigo” foram debitados de um saldo de R$ 23 milhões, restando ainda, em 2013, outros R$ 15 milhões disponíveis para o “amigo”.
“COERÊNCIA INVESTIGATIVA”
Em relatório, Pace escreveu que “existe respaldo de provas e coerência investigativa” em considerar que o “amigo” das planilhas seja Lula, mas ressaltou que as investigações de crimes supostamente praticados pelo ex-presidente são conduzidas por outro delegado da PF, Márcio Anselmo. Por isso, não as detalhou.
Em nota, o advogado de Lula, Cristiano Martins, acusou a Lava-Jato de “não apresentar prova que possa dar sustentação às acusações”. Para ele, são alegações “típicas do lawfare, ou seja, da manipulação das leis e dos procedimentos jurídicos para fins de perseguição política”. O advogado anotou que “na falta de provas, usa-se da ‘convicção’ e de achismos”, e ressaltou que as contas de Lula foram “analisadas pela PF e nenhum valor ilegal foi identificado”.
Os investigadores localizaram mensagens nos computadores de Marcelo Odebrecht e de executivos da empreiteira com menções a Lula como “amigo de EO”, tanto no período em que ele era presidente quanto após deixar o cargo. “EO” seria uma referência a Emílio Odebrecht, pai de Marcelo. Embora essas mensagens não insinuem pagamento de vantagens indevidas, foram usadas como pistas para a PF chegar ao entendimento que “amigo” faz referência ao petista.
Num e-mail de 2013, o diretor da Odebrecht Alexandrino Alencar escreveu que a reunião “com o amigo do seu pai” foi boa e fala que está “ok” uma viagem a Peru, Equador e Colômbia no período de 3 a 7 de junho daquele ano. Segundo a PF, a viagem de fato ocorreu. Em janeiro do ano seguinte, Alencar listou em mensagem para Marcelo Odebrecht detalhes de uma viagem a Cuba: “A programação do amigo do EO conosco é a seguinte”, escreveu.
Em 2007, Marcelo pediu, em mensagem a outro funcionário, a produção de um “sumário executivo para o amigo” sobre projetos sociais e ambientais promovidos pela empresa no Rio Madeira, local da usina hidrelétrica de Santo Antônio. “Marcelo, anexo para sua apreciação o quadro para ser entregue ao amigo de seu pai, via Alexandrino/ Seminário”, escreveu o funcionário. “Seminário” seria referência a Gilberto Carvalho, braço-direito de Lula e conhecido por ser ex-seminarista.
Em várias outras mensagens, Marcelo Odebrecht solicita o envio de informações para o pai, Emílio, para “orientá-lo no diálogo com o amigo”. Desde o início da Lava-Jato, a PF errou pelo menos uma vez a interpretação dos nomes da mesma tabela onde agora identifica Lula como o “amigo”. Os investigadores sustentavam que as menções a valores para JD seriam pagamentos para José Dirceu. Com o avanço das investigações, passaram a sustentar que se tratava de Juscelino Dourado, assessor de Palloci. (*Estagiário, sob a supervisão de Flávio Freire)
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