- Folha de S. Paulo
Talvez as próxima gerações aprendam que, olhando de perto, não existem heróis
Alguns leitores criticaram minha coluna de sexta-feira (12) sobre racismo e a derrubada de estátuas, afirmando que existe uma diferença entre apagar a história e deixar de celebrar certas figuras à luz de mudanças nos valores da sociedade. A segunda atitude, ao contrário da primeira, é defensável.
Não poderia concordar mais. Quem se der ao trabalho de voltar a meu escrito verá que tomei o cuidado de não defender figuras como Edward Colston, que parece ter sido principalmente um traficante de escravos que enriqueceu e fez caridade, ou os generais confederados, mencionando só Colombo e Churchill.
Nenhum dos dois entrou para o clube dos heróis estatuáveis pelas ideias que defenderam, mas por feitos mais específicos, respectivamente a “descoberta” da América e a liderança dos britânicos durante a Segunda Guerra.
Aliás, se quisermos motivos para criticar Churchill, há faltas mais graves do que falas racistas e atitudes colonialistas. Ele é um dos principais responsáveis pelos bombardeios aliados sobre Dresden, que deixaram dezenas de milhares de mortos. A cidade alemã não tinha alvos militares ou industriais muito relevantes. O objetivo dos ataques seria abalar o moral do inimigo.
Juízos éticos à parte, a determinação de Churchill foi vital para a derrota dos nazistas, um feito histórico que decididamente merece celebração. Pelo menos em algum grau, é preciso separar as realizações das pessoas de julgamentos sobre sua biografia.
E quanto a Colston e os generais confederados? Aqui, o caso para retirá-los do panteão me parece mais persuasivo. Mesmo assim, melhor do que derrubar estátuas, o que configura destruição de patrimônio público, é reuni-las num museu ou parque dos enjeitados onde se possa contar a história de sua ascensão e queda, de modo que as próximas gerações aprendam alguma coisa —talvez até a lição de que, olhando de perto, não existem heróis.
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