sábado, 26 de julho de 2025

Traição e castigo - Aldo Fornazieri

Bolsonaro e seus cúmplices devem ser derrotados não só na Justiça, mas também no terreno político e no campo moral

Chantagistas e traidores. Não há melhor definição para Jair e Eduardo Bolsonaro, entre outros políticos engajados na defesa das tarifas punitivas de Donald Trump. O achaque não é apenas contra setores produtivos: é contra o Brasil, sua soberania e seu povo. O tarifaço desencadeará uma série de consequências econômicas que prejudicarão a vida dos brasileiros como um todo.

Os dicionários costumam definir “chantagem” como o ato de extorquir não só dinheiro, mas também outros benefícios por meio de ameaças, constrangimentos e pressões intimidatórias. É exatamente isso que os bolsonaristas associados a Trump estão fazendo contra o Brasil e seu povo, na tentativa de impedir que a Justiça cumpra seu papel diante das acusações de diversos crimes que pesam sobre o ex-presidente e seus comparsas.

Para escapar ao alcance da lei e praticar um golpismo continuado, os bolsonaristas apelam ao presidente do país com o maior poderio militar e econômico do mundo para punir o Brasil e atacar suas instituições, sem qualquer justificativa econômica. Já foi repetido à exaustão que os EUA ganham mais do que o Brasil no comércio bilateral.

Quando Lula foi preso injustamente pela Lava Jato, após ser condenado por Sergio Moro, não promoveu arruaça nem se insubordinou contra o Judiciário. O líder petista sempre declarou sua inocência e agiu dentro da legalidade. Já o procedimento de Bolsonaro é uma rebelião contra o sistema judicial. Ele confronta a lei e pisoteia a Constituição. Temos aqui o exemplo de um democrata injustiçado, que recorreu à ordem legal para provar sua inocência, e o de um candidato a ditador, acusado de vários crimes, que se recusa a ser julgado de forma justa pelas leis da democracia.

Bolsonaro e seus cúmplices não são apenas chantagistas, são também traidores. No passado, os discursos dessa turma abusavam de termos como “alta traição” e “lesa-pátria”. Essas expressões caí­ram em certo desuso, especialmente nos textos jurídicos. Mas o significado desses conceitos reaparece em outros termos: golpe de Estado, abolição violenta do Estado Democrático de Direito, conspiração ou associação criminosa.

O Código Penal brasileiro deveria conter tipificação e definição claras para o crime de conspiração, especialmente aquele de natureza política. A tentativa de promover um golpe de Estado é uma forma de conspiração. O que os bolsonaristas fazem contra o Judiciário ou para prejudicar o Brasil com o tarifaço também é conspiração.

Historicamente, as conspirações envolviam os crimes de traição mencionados acima, mas também ações e tentativas que visavam prejudicar os interesses do País em favor de interesses estrangeiros – ou subordinar os interesses nacionais aos de uma potência estrangeira. É exatamente isso que os Bolsonaro e seus comparsas estão fazendo: atacam a soberania e as instituições democráticas do Brasil para submetê-las aos interesses dos EUA.

Aqui, os crimes de chantagem e de traição se fundem. Ao praticá-los, o bolsonarismo explicita toda a sua decrepitude moral, sua indignidade e sua completa falta de responsabilidade. O mais espantoso é prestar esse serviço sujo invocando o nome de Deus, sem pudor nem rubor.

As ações de Bolsonaro e Trump revelam algo ainda mais grave: seus interesses são exclusivamente individuais e familiares. Eles não se importam com o interesse público, tampouco com o povo. Estatizam seus próprios objetivos e desígnios criminosos, transformando-os em razão de Estado.

Essa tipologia de conduta é inerente à extrema-direita do nosso tempo – e foi típica do nazismo e do fascismo no passado. Representa uma ameaça às democracias e deve ser cortada pela raiz. É preciso julgar e condenar, de forma justa, esses grupos pelos crimes recorrentes que praticam. Mas é preciso também derrotá-los no terreno político, na esfera da persuasão e no campo moral dos valores.

Essa extrema-direita neofascista precisa ser enfrentada com firmeza, impondo-lhe uma derrota política e um constrangimento moral. Ela não pode ser tratada como adversária – precisa ser tratada como inimiga. Esses grupos são inimigos da democracia, das liberdades e dos direitos. Estão fora do jogo democrático, e só o praticam para destruí-lo.

Trump não foi combatido, julgado e condenado pelos crimes da invasão do Capitólio e da tentativa de golpe de Estado. Voltou ainda mais tirano e destrutivo. Bolsonaro e seus comparsas estão sendo enfrentados pelo STF, mas ainda não foram política e moralmente derrotados. Suas chantagens e traições oferecem a oportunidade para que isso aconteça. 

Publicado na edição n° 1372 de CartaCapital, em 30 de julho de 2025.

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