Folha de S. Paulo
Medidas violam o princípio republicano de que
ninguém está acima da lei
Constituição não permite a criação de uma
casta de semideuses
O centrão e bolsonaristas querem praticar
crimes, como golpe de Estado e corrupção,
sem serem presos, condenados ou investigados.
É o que a PEC da Blindagem e o PL da anistia fazem. As medidas são inconstitucionais, porque, entre outras razões, restringem a função primordial de outro Poder —o Judiciário— de decidir sobre ilicitudes graves e violam o princípio republicano de que ninguém está acima da lei.
A Câmara aprovou na terça (16) a PEC da
Blindagem, que prevê que o Parlamento decida em votação secreta sobre a prisão
em flagrante de deputados e senadores por maioria absoluta. Ou seja, mesmo que
o parlamentar seja pego no pulo cometendo um crime, ou imediatamente após
cometê-lo, ou ainda esteja com a mão na arma já disparada, o Parlamento deve
ser consultado primeiro. Parlamentares a favor da medida devem pensar duas
vezes antes de irem às eleições de 2026 com o carimbo de impunidade.
Centrão e bolsonaristas querem manter o voto
secreto também nos casos em que o Congresso barre processos criminais no STF contra
parlamentares. O tema foi reinserido nesta quarta (17) no texto por uma manobra
do centrão e de Hugo Motta.
A medida parece ter menos adesão no Senado, mais atento à reação popular à
proposta. É como se o juiz devesse primeiro perguntar aos amigos do acusado se
pode continuar com o processo contra ele.
O PL da Anistia para golpistas, no mesmo
sentido, trata a Constituição como se esta fosse um pacto suicida, que
permitiria que a Carta matasse a si mesma e com ela levasse junto a democracia.
Qualquer leitura sistemática da Constituição
não o permite, tampouco os precedentes no STF, em especial a impossibilidade de
indulto para crimes contra o Estado democrático de Direito (caso Daniel
Silveira) e precedentes internacionais que determinam há muito tempo a
impossibilidade de perdão por crimes graves em direitos humanos.
A Constituição não permite a criação de uma
casta de semideuses fora de seu alcance. Se políticos fossem anjos, Judiciário
independente não seria necessário; fato é que não o são.
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