quinta-feira, 18 de setembro de 2025

Que fazia a Jovem Pan no verão de 2023? Por Conrado Hübner Mendes

Folha de S. Paulo

Emissora foi voz estridente e contínua de apoio à insurreição

plano de golpe executado em 2023 não reuniu só Jair Bolsonaro e parceiros das Forças Armadas. Condenados criminalmente os oito operadores da cúpula do golpe e as centenas de militantes que depredaram a praça dos Três Poderes em 8 de janeiro, resta voltar os olhos para os agentes de mediação entre o alto e o baixo escalões.

Há quatro núcleos: o político, de lideranças partidárias e parlamentares que usaram do mandato para incentivar a quebra; o jurídico, para bloquear medidas de contenção e responsabilização, sobretudo a Procuradoria Geral da República; o financeiro, para pagar as contas; e o comunicativo, para incendiar a esfera pública e legitimar a insurreição.

O núcleo comunicativo costurou o subterrâneo do gabinete do ódio e dos algoritmos das redes, cujo negócio privilegia medo e ódio (motores de engajamento e lucro), a empresas com fachada jornalística. Entre elas, uma emissora se fez centro nervoso e sonoro: a Jovem Pan.

"Então, esses comandantes do Exército têm que decidir: eles servem ao povo brasileiro? O criminoso é quem prende, não é quem vai preso. Esses caras são foras da lei e estão nos impondo coisas na base da violência. O que o STF decide é irrelevante. Porque o STF é autor do crime. Um tigre de papel, não tem poder! O plano do STF vai por água abaixo quando militares decidirem que vão cumprir a Constituição."

"Se o Presidente der a ordem e alguém não cumprir, essa pessoa vai sofrer as consequências. O que vai fazer? Vai colocar força para lutar contra força? O que estou propondo aqui é isso. Um protesto constitucionalista, sem revolução, sem junta militar, sem golpe."

"Essa história de que ‘ah, vai ter derramamento de sangue’, não vai ter derramamento nenhum! Eu sei quais são os comandantes. Eu duvido que os frouxos, que não foram corajosos para fazer, vão ser corajosos para enfrentar. As minhas fontes militares falam que vão reagir o PCC, o Movimento dos Sem Terra, as FARC. Eu falo ‘pô, que reajam!’ As Forças Armadas existem para mandar esses...daqui para um lugar pior. Se vocês vão defender a pátria, e vai haver reação de vagabundo, ué, passa o cerol!"

Nessa emissora, em programas ao vivo, essa era a mensagem de apresentadores e debatedores, sem contraponto fático ou opinativo.

Você, ao modo Fux, pode ler como crítica exaltada, como destempero. Um exercício da liberdade de expressão de comentaristas, não posição editorial da empresa.

Ou pode observar que as mesmas frases, carregadas de mistificações conspiratórias, ameaças, incitações, por semanas, significam mais. Não só opinião de comentarista, mas estratégia editorial-empresarial de concessionária de serviço público. Não só ocasional, mas massiva, estridente e diária. Pode perceber não só o que era comunicado, mas o como. E sua exata sincronia com Brasília.

Em 2023, o Ministério Público Federal ajuizou ação e pede três sanções: cancelamento de outorga de radiodifusão por violação grave da lei de radiodifusão; indenização por danos morais coletivos; veiculação de direito de resposta da sociedade.

Dias atrás, o MPF apresentou alegações finais. Resta à 6ª Vara Cível de São Paulo reconhecer que, se houve crime, como provou o STF, o crime pode ter tido um braço televisivo. Um braço que, aparentemente, delinquiu, lucrou e não pagou. Não foi só golpismo recreativo.

 

 

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