DEU EM O GLOBO
Dilma Rousseff e José Serra subiram o tom no primeiro debate. Nele houve mais vapor do que energia, mas se a baixaria mútua das volantes dos candidatos sair da agenda, todos terão a ganhar. É pedir muito, mas vale o registro: o dólar está a R$ 1,66 e a palavra câmbio não foi pronunciada. O real valorizado corrói a competitividade dos produtos brasileiros. Mais um pouco e retorna-se ao delírio do dólar tucano, quando se comprava manteiga francesa baratinha nas boas casas do ramo, como durante a República Velha.
O dólar está a preço de banana porque a economia brasileira atrai investidores estrangeiros, muitos do quais vêm para cá buscar os juros lunares que Nosso Guia paga. José Serra é um veterano crítico dessa política e pode-se supor que Dilma Rousseff também não goste dela, mas nenhum dos dois toca no assunto porque temem sua complexidade e a antipatia da banca.
Ambos são economistas e sabem o que fazem, mas devem refletir sobre o risco que correm. No fim do mês, contados os votos, alguém poderá perguntar ao vencedor: — Você tocou na questão do câmbio? — De passagem.
— E discutiu a fundo o quê? Serra: — O aborto.
Dilma: — A privataria do Fernando Henrique.
Indo-se a outro tema, podem apresentar seus projetos de reforma política.
Tanto Dilma como Serra querem mudar o quadro partidário e o sistema eleitoral, mas, por conveniência, não tocam no assunto.
Dilma Rousseff já disse que pretende instituir o voto de lista. Ele fortalece os partidos (ou suas burocracias) e retira ao eleitor o direito de votar nominalmente num candidato a deputado. Serra nunca tocou no assunto, mas há uma forte corrente no tucanato que simpatiza com a ideia. Seu xodó é o voto distrital.
Essa modalidade de manifestação é como a feijoada, tem de tudo. Distrital simples? Com quantos candidatos? Distrital misto? Com lista aberta ou fechada? Que tal o distritão? Nele cada estado forma um grande distrito e é eleito quem tem mais votos, sem transferências. Vale o registro de que o voto distrital pode ter muitos defeitos, mas não produz Tiriricas.
Na eleição americana de 1992 o marqueteiro James Carville (“É a economia, estúpido”) proibiu Bill Clinton de pronunciar a palavra “infraestrutura”.
Serra e Dilma adoramna. Qualquer problema está relacionado com a tal de “infraestrutura” e qualquer solução, também.
No entanto, nenhum dos dois se detém no mais ambicioso e caro projeto de obra colocado na agenda nacional. Trata-se do trem-bala que ligaria o Rio de Janeiro a Campinas.
Pelo último cálculo, custaria R$ 34,6 bilhões, ervanário equivalente ao preço das hidrelétricas de Santo Antônio, Jirau e Belo Monte, mais boa parte da obra de transposição do Rio São Francisco.
Serra não gosta do projeto. Dilma, por seu lado, defende a iniciativa desde a época em que, entregue a uma estatal loteada, a Valec, o trem-bala era uma girafa com tromba de elefante. Nosso Guia quer leiloar a obra em dezembro. Seja o que Deus quiser.
Talvez nenhum desses temas caiba numa resposta de dois minutos, mas os dois candidatos dispõem de outros meios para mostrar que são capazes de discuti-los.
Elio Gaspari é jornalista.
Dilma Rousseff e José Serra subiram o tom no primeiro debate. Nele houve mais vapor do que energia, mas se a baixaria mútua das volantes dos candidatos sair da agenda, todos terão a ganhar. É pedir muito, mas vale o registro: o dólar está a R$ 1,66 e a palavra câmbio não foi pronunciada. O real valorizado corrói a competitividade dos produtos brasileiros. Mais um pouco e retorna-se ao delírio do dólar tucano, quando se comprava manteiga francesa baratinha nas boas casas do ramo, como durante a República Velha.
O dólar está a preço de banana porque a economia brasileira atrai investidores estrangeiros, muitos do quais vêm para cá buscar os juros lunares que Nosso Guia paga. José Serra é um veterano crítico dessa política e pode-se supor que Dilma Rousseff também não goste dela, mas nenhum dos dois toca no assunto porque temem sua complexidade e a antipatia da banca.
Ambos são economistas e sabem o que fazem, mas devem refletir sobre o risco que correm. No fim do mês, contados os votos, alguém poderá perguntar ao vencedor: — Você tocou na questão do câmbio? — De passagem.
— E discutiu a fundo o quê? Serra: — O aborto.
Dilma: — A privataria do Fernando Henrique.
Indo-se a outro tema, podem apresentar seus projetos de reforma política.
Tanto Dilma como Serra querem mudar o quadro partidário e o sistema eleitoral, mas, por conveniência, não tocam no assunto.
Dilma Rousseff já disse que pretende instituir o voto de lista. Ele fortalece os partidos (ou suas burocracias) e retira ao eleitor o direito de votar nominalmente num candidato a deputado. Serra nunca tocou no assunto, mas há uma forte corrente no tucanato que simpatiza com a ideia. Seu xodó é o voto distrital.
Essa modalidade de manifestação é como a feijoada, tem de tudo. Distrital simples? Com quantos candidatos? Distrital misto? Com lista aberta ou fechada? Que tal o distritão? Nele cada estado forma um grande distrito e é eleito quem tem mais votos, sem transferências. Vale o registro de que o voto distrital pode ter muitos defeitos, mas não produz Tiriricas.
Na eleição americana de 1992 o marqueteiro James Carville (“É a economia, estúpido”) proibiu Bill Clinton de pronunciar a palavra “infraestrutura”.
Serra e Dilma adoramna. Qualquer problema está relacionado com a tal de “infraestrutura” e qualquer solução, também.
No entanto, nenhum dos dois se detém no mais ambicioso e caro projeto de obra colocado na agenda nacional. Trata-se do trem-bala que ligaria o Rio de Janeiro a Campinas.
Pelo último cálculo, custaria R$ 34,6 bilhões, ervanário equivalente ao preço das hidrelétricas de Santo Antônio, Jirau e Belo Monte, mais boa parte da obra de transposição do Rio São Francisco.
Serra não gosta do projeto. Dilma, por seu lado, defende a iniciativa desde a época em que, entregue a uma estatal loteada, a Valec, o trem-bala era uma girafa com tromba de elefante. Nosso Guia quer leiloar a obra em dezembro. Seja o que Deus quiser.
Talvez nenhum desses temas caiba numa resposta de dois minutos, mas os dois candidatos dispõem de outros meios para mostrar que são capazes de discuti-los.
Elio Gaspari é jornalista.
Nenhum comentário:
Postar um comentário