E, afinal, manteve-se o padrão nesta cidade onde, em sete eleições sob o
regime democrático, apenas um prefeito (Paulo Maluf) conseguiu fazer o seu
sucessor (Celso Pitta) e apenas um (Gilberto Kassab) conseguiu se reeleger. Nas
suas avaliações, o ex-presidente Lula há de ter levado em conta esse
retrospecto, quando decidiu transformar a disputa pela Prefeitura paulistana no
teste de vida ou morte para a sua obsessão de tirar do PSDB a liderança
política no Estado onde também o PT tem as suas raízes. Mas, ao impor ao
partido a candidatura do ministro da Educação Fernando Haddad, como fizera em
2010 com outra novata em eleições, Dilma Rousseff, ele decerto intuiu que não
bastaria dar uma nova chance à ex-prefeita Marta Suplicy, derrotada em duas
eleições consecutivas e ávida pela desforra, para que a tradição da alternância
se confirmasse por inércia. Esse foi o seu primeiro achado. O segundo consistiu
na escolha do "poste" da vez.
Jovem, professor universitário, de classe média, bons modos e boa estampa,
que poderia passar perfeitamente bem por um tucano de carteirinha, Haddad tinha
o perfil certo para ser aceito por uma parcela eventualmente decisiva do
eleitorado antipetista majoritário no centro expandido da capital. Lula
aprendeu com o passado que esse devia ser o público-alvo da campanha, para
trazer os votos que as zonas sul e leste fiéis não poderiam suprir por si sós.
Faltou prever que uma figura familiar nessas extensões tivesse a esperteza de
ocupar o lugar reservado para o nome do PT, de quem muito poucos tinham ouvido
falar. Mas a inesperada ascensão de Celso Russomanno se converteu em queda
livre quando, escoltado por Lula e Dilma, Haddad mostrou os seus documentos no
horário eleitoral - enquanto o adversário insistia na proposta desastrosa,
pronta para ser demolida, de fixar as tarifas de ônibus por distância
percorrida.
Restabelecida a arraigada polarização PT-PSDB, Serra "se enforcou na
própria corda", como diria, no habitual tom azedo, Marta Suplicy. Ele
carregou campanha acima o peso de ter largado a Prefeitura aos 15 meses de
mandato e a servidão da grande impopularidade do seu vice e sucessor, Kassab.
Além disso, ignorou que os eleitores não gostam em geral de candidatos
agressivos e atacou Haddad com as armas do "kit-gay" e do mensalão -
as duas negaram fogo. Deu no que deu: em proporção, o tucano perdeu nos redutos
do PT mais do que ganhou nas suas zonas de conforto. Em sete dessas, aliás, a
maioria preferiu o oponente. O mesmo se deu nas sete regiões indefinidas, ou
pendulares. Em suma, eleitores não petistas e até antipetistas ou se
abstiveram, votaram em branco e anularam o voto (cerca de 30% do total) ou
preferiram Haddad, ajudando a fazer de Lula o grande vencedor singular do ciclo
eleitoral deste ano.
Em âmbito nacional, o PSB do governador pernambucano Eduardo Campos roubou a
cena, aumentando em 42% - para 441 - o estoque de municípios conquistados.
Kassab, apesar do naufrágio em São Paulo, também fez boa figura na estreia
eleitoral do seu PSD, com 497 vitórias, quase sempre em cidades pequenas. O
segundo turno, de todo modo, manteve nos seus postos a elite do sistema
partidário. Embora a taxa de reeleição tenha despencado para 55% nas capitais e
11 siglas tenham conseguido eleger prefeitos nessas 26 praças, apenas 4
partidos governarão a partir de janeiro 60% dos 140,6 milhões de eleitores
brasileiros. São eles, pela ordem, PT, PMDB, PSDB e PSB. As mesmas quatro
legendas (com o PMDB e o PSB trocando de lugar) controlarão os 83 municípios
com mais de 200 mil eleitores, onde pode haver dois turnos.
O quadro é semelhante no conjunto dos 5.556 municípios do País. Pouco mais
da metade deles (51%) será administrada ou pelo PMDB (1.027 prefeitos), ou pelo
PSDB (702), ou pelo PT (635), ou pelo PSD (com os já citados 497). Mas o PMDB é
tipicamente o partido das cidades médias para menos. À parte o PSB, o PT foi o
partido que revelou a mais firme trajetória de alta, com um ganho de 14%. O
êxito de Haddad em São Paulo tornou a consagrar a liderança de Lula,
compensando as derrotas que sofreu em outros embates do segundo turno que fez
questão de travar ostensivamente. Ainda assim, o PT só levou 16 das 83 maiores
prefeituras do País.
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