Serra: países bolivarianos propagam falsidades
• Com tom diferente ao de Dilma e Lula, ministro rejeita em comunicados posição de latinos sobre impeachment
Eliane Oliveira - O Globo
BRASÍLIA - Agora sob o comando do senador tucano José Serra (PSDB-SP), o Itamaraty mudou radicalmente o tratamento dado nas gestões petistas aos países chamados bolivarianos. O Ministério das Relações Exteriores reagiu ontem às manifestações de Venezuela, Cuba, Bolívia, Equador e Nicarágua, além de organizações de esquerda latino-americanas, de que o afastamento da presidente Dilma Rousseff teria sido um “golpe de Estado". Em dois comunicados divulgados quase que simultaneamente ontem, o Itamaraty rejeitou “enfaticamente” as interpretações em torno do impeachment de Dilma.
Um dos comunicados diz que esses países, assim como a Aliança Bolivariana para os Povos de Nossa América/Tratado de Cooperação dos Povos (ALBA/ TCP), permitem-se “opinar e propagar falsidades sobre o processo político interno no Brasil”, que teria se desenvolvido em quadro de absoluto respeito às instituições democráticas e à Constituição Federal.
“Como qualquer observador isento pode constatar, o processo de impedimento é previsão constitucional; o rito estabelecido na Constituição e na Lei foi seguido rigorosamente, com aval e determinação do STF; e o Vice-Presidente assumiu a Presidência por determinação da Constituição Federal, nos termos por ela fixados”, diz um dos comunicados.
Em outra nota, o Ministério das Relações Exteriores se dirige diretamente ao secretário-geral da Unasul, Ernesto Samper. No comunicado, o Itamaraty repudia recentes declarações de Lamper sobre a conjuntura política no Brasil, “que qualificam de maneira equivocada o funcionamento das instituições democráticas do Estado brasileiro”.
Na última quinta-feira, no dia da posse de Temer e seus ministros, Ernesto Samper declarou que o ocorrido “compromete a governabilidade democrática da região em um caminho perigoso”. Em referência à reeleição de Dilma em 2014, ele afirmou que “o que aconteceu no Brasil é que uma maioria política mudou o que a maioria dos cidadãos expressou, por eles mesmos, em claro favor de Rousseff ”. Chamou o impeachment de “ruptura democrática”.
Argumentos preconceituosos
O Itamaraty rebateu, dizendo que os argumentos usados por Samper são absurdos, preconceituosos, equivocados e infundados. “Os argumentos apresentados, além de errôneos, deixam transparecer juízos de valor infundados e preconceitos contra o Estado brasileiro e seus poderes constituídos e fazem interpretações falsas sobre a Constituição e as leis brasileiras. Além disso, transmitem a interpretação absurda de que as liberdades democráticas, o sistema representativo, os direitos humanos e sociais e as conquistas da sociedade brasileira se encontrariam em perigo. A realidade é oposta”, informa o comunicado.
As manifestações de líderes de esquerda latino-americanos eram frequentes meses antes da votação do impeachment de Dilma pelo Congresso. Em março, por exemplo, o presidente da Bolívia, Evo Morales, pediu ao colega Tabaré Vázquez, do Uruguai — país que exerce a presidência temporária da Unasul — que convocasse uma reunião de cúpula de emergência no Brasil, para defender Dilma e seu antecessor, Lula.
Apelo semelhante foi feito pela Venezuela ao Mercosul. Porém, não há consenso no bloco sul-americano e, por isso, a chance de o Brasil ser suspenso por causa do impeachment é zero. Um dos principais opositores é o Paraguai que, há dois anos, foi suspenso em razão do afastamento do então presidente Fernando Lugo pelo Congresso daquele país.
As manifestações contrárias ao impeachment de Dilma se intensificaram nos dois ú’ltimos dias. Na quinta-feira, o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, e membros de equipe chegaram a conclamar a população de Caracas a irem a uma manifestação em solidariedade a Dilma na Praça Bolívar. Por meio do diário oficial, Cuba expressou sua solidariedade a Dilma e Lula.
O presidente do Equador, Rafael Correa, expressou sua “profunda preocupação” pela situação política no Brasil e ressaltou seu respaldo a Dilma, “legítima depositária do mandato popular”. Já o nicaraguense Daniel Ortega chamou de o impeachment de “armação jurídica.”
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