- O Globo
O criminalista Alberto Toron, experiente e criativo, tirou da cartola a tese que iguala os delatores à acusação
Há anos, desde o julgamento do mensalão, advogados de defesa dos acusados de corrupção tentam manobras jurídicas para beneficiar seus clientes, o que é perfeitamente normal.
O então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, foi o coordenador das manobras que pretendiam levar para a primeira instância da Justiça os réus do mensalão que não tinham foro privilegiado.
O relator Joaquim Barbosa defendeu a tese de que os crimes eram conectados, e os réus não poderiam ser separados, pois isso prejudicaria a narrativa dos fatos criminais que os envolveram.
Sua tese foi vitoriosa, driblando uma tradição da Justiça brasileira de desmembrar os processos, e foi fundamental para a condenação da maioria dos envolvidos.
Nos julgamentos do petrolão, diversas táticas foram tentadas pelos advogados de defesa, mas nos primeiros anos, com o apoio popular da Lava-Jato no auge, não houve ambiente para que teses diversas fossem aceitas.
Só recentemente, sobretudo a partir deste ano, passaram a ser aceitas teses que abrandaram a situação dos réus. Vários processos foram enviados para a primeira instância ou para a Justiça Eleitoral, prevalecendo o argumento, defendido por vários anos, de que a maior parte do dinheiro da corrupção não passava de caixa 2, um crime eleitoral com punição mais branda.
A prisão em segunda instância, cuja aprovação foi fundamental para impedir que os processos se eternizassem com os diversos graus de recursos, começa a ser contestada teoricamente pela mesma Corte que por diversas vezes a aprovou.
No julgamento que deverá acontecer ainda este ano, tudo leva a crer que a prisão em segunda instância será derrubada, com a mudança de voto do ministro Gilmar Mendes. O voto da ministra Rosa Weber, que é contrária à prisão em segunda instância, mas a vem acatando por representar a maioria do plenário até o momento, pode confirmá-la se entender que não é hora ainda de mudar a jurisprudência, que prevaleceu durante anos no STF. O presidente Dias Toffoli já propôs que a prisão possa ser decretada depois da condenação no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Coube a um experiente e criativo advogado criminalista, Alberto Toron, a maior vitória até agora, com a aceitação, pela Segunda Turma e ontem pelo plenário do Supremo, da tese de que os delatores transformam-se em “assistentes da acusação”, e, portanto, devem ser ouvidos antes do réu delatado, que fala por último no julgamento.
Como na legislação brasileira não há nenhuma determinação quanto a isto, pois a figura da delação premiada está em prática recentemente, sem que exista uma regulamentação para sua aplicação a não ser a própria lei que a criou, o advogado Toron tirou da cartola a tese que iguala os delatores à acusação.
Não é uma tese esdrúxula, pois vai ao encontro do conceito constitucional de ampla defesa do réu. Dias Toffoli deu o sexto voto pela anulação da condenação do ex-gerente da Petrobras Márcio Ferreira, que reclamou por apresentar alegações finais no mesmo prazo de seus delatores.
O ministro, no entanto, disse que, na próxima sessão, vai propor ao plenário uma forma de modular os efeitos da decisão, para definir se condenações passadas serão anuladas. Existem várias possibilidades na mesa. A Procuradoria-Geral da República defende que a regra só seja aplicada no futuro, o que evitaria anular condenações.
O ministro Luís Roberto Barroso, que votou contra o habeas corpus, e se colocou contra a tese que acabou vencedora, aceitou a proposta do Ministério Público de que a ordem das alegações finais só valha a partir de agora, para evitar anulações generalizadas.
É bastante improvável que essa tese prevaleça, pois, como alegou o ministro Alexandre de Moraes, não é possível acatar o habeas corpus e dizer que ele não vale para o condenado cujo caso foi analisado.
A ministra Cármen Lúcia, que na Segunda Turma já havia votado a favor da tese de que delatados devem apresentar alegações finais depois do delator, votou contra a anulação da condenação de Márcio Ferreira, pois, no caso concreto do ex-gerente da Petrobras, disse que não houve prejuízo à defesa, porque ela teve prazo complementar para rebater as acusações de seus delatores.
O mais provável é que o presidente do STF, Dias Toffoli, proponha que a regra só valha para os casos em que a defesa fez o pedido expresso de falar depois dos delatores ainda na primeira instância. A partir da decisão do STF, a ordem passa a ser essa.
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